Muita calma nessa hora (Por Hubert Alquéres)

Em momentos de tensão nas relações comerciais internacionais, convém seguir o conselho de Paulinho da Viola: “faça como o velho marinheiro que durante o nevoeiro leva o barco devagar.”

O alerta é fundamental diante da decisão dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 25% sobre as importações de aço, medida que impacta muitos países e vários de seus grandes aliados. O Brasil, como fornecedor de semiacabados de aço para o mercado americano, sofre um impacto significativo, mas está longe de ser a única vítima. O que está em curso é um novo capítulo da longa história de guerras comerciais, e sua escalada pode ter consequências severas para a economia global.

A China, como maior produtora e exportadora global de aço, também será afetada por essa escalada protecionista dos Estados Unidos, o que pode levar Pequim a adotar represálias e aprofundar ainda mais as tensões comerciais globais. Uma guerra comercial prolongada entre essas potências pode redesenhar cadeias produtivas e afetar a economia mundial de maneira imprevisível, tornando ainda mais urgente uma resposta coordenada de países afetados, incluindo o Brasil.

A pior resposta seria agir impulsivamente, adotando retaliações unilaterais sem um cálculo estratégico mais amplo. O Brasil, sozinho, não tem força para enfrentar essa disputa.

No entanto, em um movimento pragmático, o governo brasileiro e o setor do aço chegaram a um acordo para não retaliar os Estados Unidos neste momento. Essa decisão reflete uma abordagem mais cautelosa e alinhada à necessidade de preservar canais de negociação abertos.

A China é atualmente a maior produtora e exportadora de aço do mundo. Em 2023, o país foi responsável por 54% da produção global de aço, produzindo mais de 1 bilhão de toneladas. Além disso, as exportações chinesas de aço têm aumentado significativamente, e isso tem gerado preocupações globais, levando vários países a adotarem medidas para proteger suas indústrias siderúrgicas domésticas.

Vale lembrar que o próprio Brasil elevou tarifas recentemente, aumentando para 25% as taxas de importação em setores estratégicos. Os produtos afetados incluem fios de aço inoxidável, barras de ferro ou aço e outros produtos similares. Trata-se de uma contradição que enfraquece o argumento brasileiro contra as medidas americanas.

Além disso, há divisões dentro do próprio governo sobre como responder. Enquanto o Itamaraty defende a prudência e a busca de uma solução negociada, figuras influentes como Celso Amorim e setores do PT defendem uma postura mais combativa, incluindo retaliações imediatas. Esse tipo de disputa interna pode enfraquecer a posição brasileira e tornar nossa resposta mais errática.

Este não é um fenômeno novo. Tarifas protecionistas foram uma peça-chave na escalada de tensões antes da Segunda Guerra Mundial. O exemplo mais notório foi o Smoot-Hawley Tariff Act de 1930, nos Estados Unidos, que elevou as tarifas sobre centenas de produtos estrangeiros. A resposta internacional foi uma enxurrada de retaliações que ajudaram a aprofundar a Grande Depressão e a minar a cooperação global, contribuindo para o ambiente de instabilidade que culminou no conflito.

Mais recentemente, no governo de Donald Trump, tarifas sobre o aço e alumínio foram impostas em 2018, mas, diante da pressão de setores industriais americanos que dependem dessas importações -como as indústrias automobilística, de construção civil e de exploração de petróleo- o próprio governo acabou recuando parcialmente. Esse episódio demonstra que o protecionismo, quando levado ao extremo, pode prejudicar até mesmo quem o adota.

O Brasil precisa agir com inteligência. Em vez de buscar enfrentamentos isolados, deve se unir a outros países impactados e pressionar os Estados Unidos, inclusive por meio de mecanismos multilaterais. O que está em jogo não é apenas a siderurgia brasileira, mas a estabilidade do comércio global.

Nesse cenário, declarações improvisadas e posições infladas pelo ideologismo só atrapalham. O Brasil já demonstrou em diversas ocasiões sua capacidade diplomática para enfrentar crises internacionais. Manter esse histórico é o melhor caminho para minimizar os danos dessa nova guerra comercial.

 

Hubert Alquéres é presidente da Academia Paulista de Educação.

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