Ainda sob efeitos da enchente, Estado sofre impactos do calor excessivo e estiagem

O Rio Grande do Sul ainda se recupera da catástrofe climática de maio de 2024, quando milhares de famílias foram atingidas pela enchente, e já enfrenta outro desafio extremo: a estiagem. O calor intenso das últimas semanas, aliado à ausência de chuvas, impactam não apenas a agricultura, mas também o nível dos rios. No estado, 94 municípios já decretaram situação de emergência devido à seca, conforme aponta o monitoramento do governo do Rio Grande do Sul.

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Rio dos Sinos sofre com falta de chuva e onda de calor | abc+



Rio dos Sinos sofre com falta de chuva e onda de calor

Foto: Isaías Rheinheimer/GES-Especial

Diversos municípios ainda trabalham em estratégias para solucionar os transtornos da enchente, já que as ações, mesmo que oito meses depois da tragédia, seguem sendo pauta das prefeituras. Em Novo Hamburgo, por exemplo, um serviço de desobstrução e limpeza da rede pluvial foi iniciado pela administração municipal nas áreas mais afetadas pela enchente, com objetivo de amenizar os problemas de alagamento na cidade.

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Já em Canoas, mais de 400 pessoas ainda vivem em Centros Humanitários de Acolhimento. Ou seja, a população e os municípios seguem lidando com os efeitos da catástrofe que assolou o Estado há oito meses atrás.

Se em maio do ano passado o problema era o excesso de chuva, agora, a falta dela também preocupa as autoridades. Na região, um dos impactos sentidos por conta da estiagem foi a suspensão por uma semana da captação de água para irrigação na bacia do Rio dos Sinos.

A escassez hídrica enfrentada na bacia do rio fez com que os níveis baixassem excessivamente. Na terça-feira (11), por exemplo, o nível do Rio na bomba de captação de água bruta da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), em Campo Bom, era de 1,07 metro (0,13 centímetros a menos do que os critérios estabelecidos para operação dos sistemas de bombeamento de água para irrigação na safra 2024/25).

Desde dezembro, mês em que a estiagem passou a afetar o Rio Grande do Sul, o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (Comitesinos) vem monitorando diariamente a situação. Depois de uma semana da suspensão da captação de água, o sistema só voltou a ser liberado nesta quinta-feira (13), após o nível do Rio dos Sinos atingir 1,50 metros com a ajuda da chuva.

De acordo com a presidente do Comitesinos, Viviane Feijó, a região vive uma situação crítica, que precisa de atenção da população e autoridades. “Tivemos a chuva que deu um respiro e até aumentou um pouco o nível do Rio. Isso vai ajudar. Mas, com a previsão de calor para os próximos dias, pode ser que ainda tenhamos níveis muito baixos e possa haver suspensão de novo [da captação de água para irrigação]”, afirma.

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Viviane ressalta que antes mesmo do final do ano já se discutia a escassez de água com a chegada do verão. “Já são quatro verões de extrema situação de escassez. Além das questões relacionadas à agricultura, tem municípios com dificuldade de abastecimento”, declara a presidente.

Por conta das altas temperaturas, o consumo de água da população também aumentou, o que impacta diretamente nos reservatórios de água e no abastecimento. Em Novo Hamburgo, a Comusa orientou os moradores sobre o consumo consciente nesta época, além de alertar que alguns bairros poderão sentir baixa pressão ou falta d’água durante o verão.

Para que a situação volte à normalidade, a presidente do Comitesinos ressalta que é preciso que chova com mais frequência. “Quanto mais tiver chuva, maior acúmulo conseguimos ter para chegar na parte baixa dos rios. Precisamos ter toda semana algum tipo de recarga do lençol freático”, afirma Viviane.

Seca atinge fronteira e campanha do Estado

Entre as consequências da estiagem, a perda de safra dos municípios dedicados à produção de soja e milho é um das que mais preocupa a Emater do Rio Grande do Sul. Conforme o diretor técnico Claudinei Baldissera, devido a distribuição irregular de chuva, principalmente no lado oeste, na parte central e sul do Estado, onde se posicionam os municípios com falta de chuva há mais tempo, os danos dessas culturas podem ser irreversíveis.

Nas próximas semanas, conforme Baldissera, a Emater avança na identificação e nos percentuais de danos comparados às estimativas anunciadas para a safra de verão. “Ainda não se quantifica quanto são as perdas, mas sabemos que são danos expressivos, inclusive de lavouras que inviabilizaram a colheita”, afirma o diretor técnico da Emater.

Além da das áreas cultivadas de grãos, a estiagem também avança para outros danos, como a pecuária, de corte, leite e ovinos. As pastagens nativas e cultivadas, por exemplo, também são afetadas pelo estresse hídrico.

Baldissera explica ainda que a região do Vale do Sinos, se comparada a outras, está em melhores condições, com danos menores. As produções mais afetadas pela estiagem são as de hortaliças e de milho. “Os dias quentes e o excesso de radiação solar afetam muito. São culturas muito sensíveis aos dias que passamos”, afirma o diretor técnico da Emater.

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Onda de calor recente fez com que Schmitt perdesse boa parte das hortaliças | abc+



Onda de calor recente fez com que Schmitt perdesse boa parte das hortaliças

Foto: Bruna de Bem/GES-Especial

Produtor de Lomba Grande já sente prejuízos na plantação de hortaliças

Além da falta de chuva, o calor é um dos fatores que impactam diretamente a produção na região. Em Lomba Grande, o produtor rural Glademir Antônio Schmitt, 62 anos, relata que mesmo com a proteção na horta da propriedade, as temperaturas elevadas das últimas semanas fizeram com que ele perdesse parte da produtividade. “A minha horta praticamente terminou. As hortaliças queimaram. Alface, rúcula, tudo estragou. Porque, com o sol,  acabou cozinhando”, afirma.

Ele estima que as perdas tenham sido de 70% da produção. Apesar de ter colhido alguns frutos, a qualidade foi afetada pelo excesso de calor. “Para mim, a água não foi o maior problema, porque com o reservatório que tenho consigo irrigar as plantas. Mas o calor foi tanto, que não adiantou molhar, estragou igual”, relata Schmitt.

Impacto da estiagem na economia do RS

O economista e professor da Universidade Feevale José Antônio Ribeiro de Moura adianta que o Rio Grande do Sul sofrerá impactos em toda a cadeia produtiva por conta da estiagem. A produção leiteira, conforme divulgou a Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando), enfrenta desafios com o calor extremo e a falta de chuvas. A estimativa é de redução de 10% na produção diária de leite, o que deve impactar os custos dos produtores.

“Na economia, o impacto é em toda a cadeia produtiva. A questão do milho, um ingrediente importante para alimentação de animais, é algo que vai além do campo. Vai bater no bolso dos consumidores e famílias. São efeitos que vão se multiplicar e que podem gerar mais inflação econômica”, destaca Moura.

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Outro impacto citado pelo economista é em relação a arrecadação de impostos, que servem como combustível para investimentos no Rio Grande do Sul. “Toda a perda de produção vai diminuir o fôlego do Estado em investir nesses agricultores que tiveram prejuízos. E, para a população em geral, a inflação dos alimentos”, garante Moura.

Quando a chuva deve amenizar as consequências da estiagem?

Conforme a Sala de Situação da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), a tendência é de que a estiagem amenize nos próximos dias, por conta de uma frente fria que deve atingir o Estado, trazendo chuvas mais significativas em todas as regiões, especialmente em áreas que estão sendo afetadas pela seca, como regiões de fronteira e campanha.

“A queda das temperaturas (diminuição do forte calor) também é uma condição mais favorável. Para o futuro próximo, a tendência é de que a La Niña, que embora muito fraca, ainda possa ajudar a manter o quadro de chuvas irregulares para na última dezena do mês de fevereiro e março. Porém, neste momento, não se prevê um agravamento da estiagem”, informa a assessoria de imprensa da Sema. No entanto, a pasta ressalta que o Rio Grande do Sul ainda está longe de retornar à normalidade, o que deve ocorrer ao longo do outono.

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