Rei do Gás: quem é o empresário por trás de termelétrica em Brasília

O projeto para a instalação de uma usina termelétrica a apenas 35 quilômetros da Praça dos Três Poderes pegou muita gente de surpresa. E os motivos são muitos. A energia gerada à base de gás metano é cara e poluente. Além disso, Brasília não produz matéria prima para o funcionamento do empreendimento, tornando necessária a construção de um gasoduto para tornar a usina viável. Isso sem falar do impacto ambiental e social.

Mas o nome por trás do projeto é bem conhecido: Carlos Seabra Suarez, apelidado como Rei do Gás. O empresário baiano fundou, em 1976, a construtora OAS. Seu sobrenome é representado pelo “S” do nome da empresa, que se envolveu em diversas polêmicas, como denúncias de trabalho escravo e corrupção, sendo alvo de investigações da Lava Jato.

Influente na política, Suarez deixou a construtora e começou a expandir seus negócios para o setor de gás natural. Isso não impediu, no entanto, que ele fosse investigado na mesma operação que atingiu sua antiga empreiteira. Suarez chegou a ter a conta suíça de uma de suas empresas, a Termogás Internacional, bloqueada por suspeita de usá-la para lavagem de dinheiro em propinas recebidas por ex-funcionários da Petrobras. O empresário acabou absolvido.

No Brasil, Suarez tem participação em oito distribuidoras estaduais de gás e autorização para operar ao menos cinco gasodutos. Todo esse volume de negócios pode parecer suficiente para justificar o título que ostenta, mas o Rei do Gás tem apenas uma distribuidora com operação relevante no mercado doméstico: a Cigás, no Amazonas.

Já a Gás do Pará “encontra-se em fase pré-operacional e, portanto, não opera com receita até o momento”, de acordo com o site oficial da empresa. Situação semelhante ocorre no Amapá (GASAP), Piauí (Gaspisa) e Rondônia (Rongás).

No Maranhão, a Gasmar se limita à operação e manutenção da rede do Complexo Parnaíba, da Eneva. Em Goiás, a GOIASGÁS opera volumes modestos de gás natural veicular (GNV) e, no Distrito Federal, a CEBGAS suspendeu a operação de GNV no ano passado, que era a única da empresa.

Quando o assunto são os gasodutos de Suarez, a situação fica ainda mais surpreendente. Nenhum dos seus empreendimentos conseguiu ir além da autorização para construção. Falta de interesse comercial, questões ambientais e logísticas estão entre as razões apontadas.

Exemplo disso ocorre no estado do Pará, onde um gasoduto de 948 km de extensão recebeu autorização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em 2006, mas nunca conseguiu se viabilizar. O estado conta, atualmente, com modestos 1,1 km localizado em Barcarena.

Lobby, festas e jabutis

A trajetória de Carlos Suarez não se limita à administração de empresas e concessões. O empresário também se destaca por sua influência nos círculos políticos e pelo uso estratégico de articulações nos bastidores para viabilizar interesses comerciais. Desde a inclusão de jabutis legislativos até o financiamento de campanhas e festas exclusivas com figuras do alto escalão do poder público, Suarez consolidou uma rede de contatos privilegiada.

Uma de suas principais estratégias envolve a tentativa de inserir emendas de seu interesse em medidas provisórias e projetos de lei. Em novembro de 2023, um jabuti incluído na medida provisória do marco regulatório das energias renováveis favorecia Suarez ao obrigar a contratação compulsória de usinas térmicas a gás. Após a repercussão negativa, a emenda foi retirada da MP e inserida no projeto de lei das eólicas offshore, que terminou sendo aprovado no Congresso.

Além das manobras legislativas, Suarez tem forte presença nos bastidores da política brasileira, especialmente na Bahia. Sua proximidade com o deputado Elmar Nascimento, líder do União Brasil, é vista como um ativo político valioso. Essa relação ficou evidente em festas privadas organizadas pelo parlamentar, como um luxuoso réveillon em uma ilha na Baía de Todos os Santos, de propriedade do próprio Suarez. O evento, realizado entre dezembro de 2023 e janeiro de 2024, contou com a presença de ministros de Estado, governadores, juízes e outras autoridades.

A própria Petrobras foi afetada pelo poder de articulação do empresário baiano. A Cigás foi um dos motivos pelo qual a estatal se desfez de seus negócios no Amazonas, alegando vantagens exageradas para a distribuidora de gás do estado.

A termelétrica de Brasília

A viabilidade de uma usina na capital do país é decorrente, justamente, de jabutis colocados na lei que privatizou a Eletrobras, que determinou no artigo nº 20 às capitais das unidades federativas do Centro-Oeste que não possuam pontos de suprimento de gás natural passam a gerar 2,5 megawatts (em toda a região) pelo modelo. Acontece que apenas Brasília e Goiânia não são abastecidas pelo modelo. Desta forma, a lei aprovada na gestão Bolsonaro garantiu a existência de termelétricas em locais que não contavam com esse tipo de abastecimento.

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Mapa de área influenciada pela construção

Para funcionar termelétrica, será necessário construir gasoduto de São Paulo para o DF
Localização da termelétrica
Termelétrica de Samambaia prevê gerar 1,4 mil megawatts de energia
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Projeto de termelétrica de Samambaia

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Mapa de área influenciada pela construção

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Para funcionar termelétrica, será necessário construir gasoduto de São Paulo para o DF

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Localização da termelétrica

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Termelétrica de Samambaia prevê gerar 1,4 mil megawatts de energia

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A usina de Samambaia prevê gerar sozinha 1.470 megawatts – 29 vezes superior ao valor que é outorgado hoje pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) no DF, conforme consta em dados abertos da agência reguladora. Essa energia entraria para o Sistema Interligado Nacional (SIN) para abastecer o país, e significaria a mudança da matriz energética do Distrito Federal que tem, atualmente, como sua principal fonte de energia o abastecimento por hidrelétricas – Furnas e Itaipu, consideradas energias renováveis.

A UTE terá três turbinas a gás, três caldeiras de recuperação e uma turbina a vapor. A energia gerada ligará a usina à subestação de Samambaia por uma linha de transmissão de 6,29 quilômetros.

Uma adutora ligada à usina pretende captar um volume de 110m³/h de água no rio Melchior. A UTE estará a apenas 500 metros do rio. Após usar a água, a usina pretende devolver 104 m³/h ao rio.

Como o DF não tem gás natural para a geração de energia, ainda será necessário construir um gasoduto. O projeto da empresa cita um que também está em fase de licenciamento o sistema que vai trazer de São Carlos (SP) para o DF. Esse modelo seria implantado e ficaria sob responsabilidade da Transportadora de Gás Brasil Central (TGBC).

Por coincidência, a Termo Norte e a TGBC têm o mesmo sócio: Carlos Seabra Suarez. O empresário está na lista dos 100 maiores doadores de dinheiro para campanhas nas eleições de 2024, conforme o Metrópoles publicou em outubro do ano passado.

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