Empresa ligada à facção do Vale do Sinos tinha contratos milionários com o governo do RS

Uma fornecedora de alimentos era usada para lavar dinheiro da maior facção gaúcha, sediada no Vale do Sinos, e tinha contratos milionários com o governo estadual por meio da Polícia Penal. A empresa abastecia cantinas de presídios. Quem afirma é a Polícia Civil, que na manhã desta terça-feira deflagrou operação contra o tráfico de drogas em 18 cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso.

Quase R$ 100 mil foram apreendidos em Novo Hamburgo | abc+



Quase R$ 100 mil foram apreendidos em Novo Hamburgo

Foto: Polícia Civil

Uma advogada de Novo Hamburgo e um suposto comparsa estão entre os mais de 30 presos. Eles são sócios da fornecedora. Foram detidos em uma das sedes, no bairro Liberdade. No prédio, os agentes apreenderam quase R$ 100 mil em dinheiro.

A investigação apurou que, em menos de dez meses, as transações feitas pela fornecedora ultrapassaram R$ 32 milhões. A firma tem sede registrada também em Charqueadas, onde fica o principal complexo penitenciário do RS, e representações em outros estados.

“Infiltrada”

“O uso da empresa para disfarçar as transações financeiras ilícitas revelou a complexidade e a sofisticação da rede criminosa. Além de controlar o tráfico de entorpecentes, a organização se infiltrava em contratos legais, como o fornecimento de produtos alimentícios às penitenciárias, para ocultar os lucros provenientes de atividades ilícitas”, diz a Polícia Civil, que menciona a fornecedora como “grande empresa do setor alimentício”.

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E salienta: “Esse esquema, ao envolver uma entidade legalmente contratada, proporcionava à organização criminosa uma fachada de legalidade, permitindo que os recursos financeiros fossem integrados ao sistema financeiro de maneira difícil de ser detectada pelas autoridades”.
Transações atípicas foram detectadas em relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). “A empresa em questão foi identificada em dois Relatórios de Inteligência Financeira devido a movimentações financeiras atípicas e suspeitas realizadas em suas contas bancárias.”

Em nota, Polícia Penal diz que licitações vêm de sete anos

Por meio de nota, a instituição responsável pelo sistema carcerário gaúcho diz que os primeiros contratos foram firmados com a empresa suspeita há seis anos. “A Polícia Penal informa que a empresa em questão está presente em dez unidades prisionais e sua contratação foi oriunda de procedimentos de licitação públicos realizados entre 2018 e 2022 nos termos da Lei Federal nº 8.666/1993 e da Lei 7.810/1984.”

À época, conforme o comunicado, “apresentou todas as comprovações e cumpriu todas as exigências contidas nos editais. No contrato estabelecido com a empresa vencedora há um Termo de Referência, documento que regula o funcionamento e autoriza uma lista de produtos supérfluos que o Estado não fornece, permitindo a sua comercialização com base estrita no edital”.

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A nota menciona ainda que as denúncias estão sob investigação. “A administração, tanto da Polícia Penal quanto da Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo, tomando conhecimento de qualquer fato que caracterize descumprimento ou irregularidade contratual, utiliza do poder-dever de agir e, consequentemente, instaura procedimentos para apuração, observando o devido processo legal. Todas as denúncias e apurações são conduzidas pela Corregedoria-Geral do Serviço Penitenciário e as suas informações não são publicizadas durante o processo investigatório, preservando o devido processo legal.”

Agiotagem é outro crime apurado

Segundo a Polícia, são apurados os crimes de tráfico de entorpecentes, associação para o tráfico, organização criminosa, agiotagem, adulteração de sinal identificador de veículo automotor. O objetivo seria desarticular os financiadores e operadores do crime organizado, atingindo a estrutura financeira.

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A Operação Porta Fechada foi deflagrada pelo Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc). No RS, além de Novo Hamburgo, foram cumpridos mandados de busca e prisão em São Leopoldo, Canoas, Sapucaia do Sul, Esteio, Porto Alegre, Viamão, Guaíba, Charqueadas, Lajeado, Cruzeiro do Sul, Capão da Canoa e Erechim.

Em Santa Catarina, os agentes executaram as ordens judiciais em Passo de Torres e Palhoça. No Paraná, em Maringá e Sarandi, e no Mato Grosso, na capital Cuiabá. Mais de 200 policiais civis participaram da operação. Foram, apreendidos 26 quilos de maconha, um quilo de cocaína, carros e munições.

Investigação começou com apreensão de 400 quilos de maconha

De acordo com a delegada Ana Flávia Leite, as investigações tiveram início em julho de 2024, como desdobramento da apreensão de mais de 400 quilos de maconha em Sapucaia do Sul. A droga foi encontrada em um veículo que estava prestes a entrar em um pavilhão destinado a ser um depósito da facção.

Além da substância, a operação resultou na apreensão de dois equipamentos de pesagem de grande capacidade (balanças de precisão), um veículo tipo furgão com placas clonadas utilizado para o transporte da droga e um aparelho celular, que foi essencial para a continuidade da investigação.

Conforme a Polícia, a investigação demonstrou que a organização transporta quantidade “robusta” de drogas. No ano passado, a Polícia Rodoviária Federal apreendeu mais de R$ 10 milhões em drogas do grupo, em cidade não informada. O transporte era de cinco toneladas de maconha.

Além do tráfico, foi identificado um esquema bem estruturado para controlar e coordenar suas operações, mesmo com parte dos principais líderes presos. Do interior dos presídios, davam ordens a colaboradores externos que gerenciavam o tráfico nas ruas e o controle das distribuições, mantendo o funcionamento em diversas regiões.

Automóveis também foram recolhidos na manhã desta terça-feira | abc+



Automóveis também foram recolhidos na manhã desta terça-feira

Foto: Polícia Civil

A investigação revelou ainda que, por meio de aparelhos celulares utilizados por detentos, a organização cometia fraudes financeiras e golpes, que tinha como um dos beneficiários uma grande empresa do setor alimentício. É a fornecedora de produtos para as cantinas de várias penitenciárias.

Os valores obtidos com golpes eram, muitas vezes, direcionados para contas bancárias associadas à empresa, disfarçadamente, com o objetivo de pagar por itens adquiridos para as cantinas das unidades prisionais. O esquema sugeria uma prática de lavagem de dinheiro em que os lucros eram camuflados e circulados por meios legais, dificultando a rastreabilidade das origens criminosas.

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Um relatório revelou uma transação imobiliária suspeita que envolveu a compra de um imóvel no valor de R$ 200 mil e sua venda no mesmo dia por R$ 890 mil, o que gerou um lucro de mais de 300%.
“Esse tipo de operação imobiliária, com lucro tão elevado e tão rápido, é um grande indicativo de práticas irregulares, uma vez que transações dessa magnitude, sem uma explicação financeira clara, são frequentemente utilizadas para disfarçar a origem ilícita de recursos”, destacou a delegada Ana Flávia.

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