“Não ajuda em nada”, diz vice-prefeito Mello Araújo sobre Padre Júlio

São Paulo — O vice-prefeito de São Paulo, coronel Mello Araújo (PL), afirmou nesta quarta-feira (19/3) que o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo, “não ajuda em nada” e que a “única que coisa que faz é dar comida” para moradores em situação de rua, sem incentivar que eles façam tratamento para dependência.

“O padre, com o que ele está fazendo, não ajuda em nada, porque ele fica só alimentando, ele não incentiva as pessoas a se tratarem. Pelo contrário, ele incentiva que as pessoas fiquem lá. O que ele quer é ter essas pessoas ao lado dele para poder ter a imagem. Ele vive disso”, afirmou Mello Araújo ao Metrópoles.

As declarações ocorrem um dia após viralizar um vídeo postado pelo religioso em que os dois aparecem batendo boca no Núcleo de Convivência São Martinho Lima, na zona leste.

Mello Araújo estava no local para, segundo ele, “convencer” dependentes químicos a procurarem tratamento, quando foi abordado pelo padre. Na semana anterior, o vice-prefeito havia respondido a um usuário nas redes sociais afirmando que o padre Júlio realiza um “desserviço”.

Desde o início do mandato, o Mello Araújo, indicado à chapa de Ricardo Nunes (MDB) pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tem postado vídeos em que aparece abordando dependentes químicos na rua para que aceitem serem internados para tratamento, geralmente na região da Cracolândia, no centro da capital.

“O que a gente precisa é dar acolhimento para essas pessoas, tratamento e depois, quando tiver condições, colocar de volta na rua. Arrumar emprego para essas pessoas. E a atitude dele [padre Júlio], vai totalmente contra. Ele quer que a pessoa fique ali na dependência dele, com a comida dele”, afirmou o coronel.

Segundo ainda o vice, 23 pessoas que estavam no bairro de Belém, na zona leste, onde foi filmada a discussão com o padre, foram encaminhadas para tratamento. Ele afirma que, na região central, a abordagem costuma gerar, em média, de 30 a 40 encaminhamentos. Ainda de acordo com o coronel, elas são encaminhadas para equipamentos com o CAPS e o HUB de Cuidados, do governo do estado.

Mello Araújo disse que quer “lançar um desafio ao religioso”. “Quantas pessoas chegaram à cura através dessa iniciativa dele de simplesmente dar comida? Eu faço o desafio”, diz.

Padre Júlio responde

Ao Metrópoles, o padre Júlio Lancellotti respondeu o vice-prefeito afirmando que o coronel “passa o trator” em cima das equipes de assistência social, de psicólogos, agentes de saúde e médicos. “Não é papel de um vice-prefeito fazer internações”. O padre também disse que “não se faz desafios para a vida humana”.

“A coisa é muito complexa, não pode ser tratada nessa simplicidade, nessa singeleza, como se as pessoas fossem uma caixinha. Eu entrego alimentos, roupas, ofereço cursos, eu não vendo droga para elas”, afirmou o padre, que classifica as ações de Mello Araújo como teatro. “Para onde foram essas pessoas convencidas foram encaminhadas?’, questiona.

“É preciso o vice-prefeito sair atropelando a estrutura técnica da própria prefeitura? Eles [a prefeitura] têm assistentes sociais, psicólogos, agentes de saúde, médicos, psiquiatras, tudo, mas quem tem o poder de fazê-los ficar na rua sou eu? Eu tenho superpoderes?”, disse o padre Júlio.

O religioso também rebateu a crítica de que o fato de oferecer comida aos dependentes os incentivaria a não procurar tratamento. “Então vamos deixá-los morrer de fome. Quer dizer, é uma lógica punitiva, é uma lógica de criminalização. Não é uma lógica humana”, diz.

Padre Júlio ainda afirma que está disposto a conversar com a prefeitura sobre políticas para a população em situação de rua e para dependentes químicos e defendeu o trabalho feito pela Pastoral do Povo da Rua.

“Ele [o vice-prefeito] poderia vir conhecer os cursos profissionalizantes e o trabalho social que temos. Eu o convidei para que ele conheça a escola Santa Marina, Santa Paulina, conheça os cursos que nós temos com o Senac, os programas de moradia e todo o trabalho que fazemos com a população de rua, tratando as pessoas humanamente e não como objetos que tem que ser retirados para ‘higienizar’ a cidade”, disse o padre.

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