Proteger o presente para salvar o futuro

Os resultados do Levantamento Nacional sobre as Ações e Políticas Públicas para a Prevenção e Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes deixam claro que a população compreendida pela faixa etária que vai do nascimento aos 18 anos de idade ainda não é prioridade absoluta no Brasil, apesar da legislação e dos compromissos internacionais assumidos.

O estudo, conduzido pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) em parceria com 20 Tribunais de Contas, examinou a efetividade das ações e políticas públicas voltadas à proteção de crianças e adolescentes em todo o país e acendeu um alerta.

No universo de estados analisados pelo levantamento, nove não possuem um plano estadual específico para a prevenção e o enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes. Dos 11 estados que possuem planos, mais da metade não instituiu ciclos periódicos de avaliação e monitoramento, o que impede a correção de rumos e a otimização das políticas.

Em mais de 50% dos estados participantes da pesquisa não há dotação orçamentária específica para as casas de acolhimento, fato que coloca em risco a qualidade dos serviços oferecidos. E cerca de 15% dos municípios brasileiros ainda não instituíram seus Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (FMDCA) com o devido registro na Receita Federal, medida de suma importância para tornar o respectivo Fundo apto a receber recursos de doações feitas durante a Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda.

No quesito infraestrutura, os resultados caminham no mesmo sentido. Durante o levantamento, auditores realizaram visitas aos Conselhos Tutelares e aos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) e se depararam com a falta de equipamentos essenciais e materiais de expediente, bem como prédios em condições precárias, com infiltrações, mofo e problemas estruturais. As imagens, documentadas no relatório, ilustram o descaso com a proteção da infância e dão conta da precariedade generalizada que afeta estes órgãos.

Ouvidoria integrada

Dos 20 estados objetos do levantamento nacional, apenas nove contam com Centros de Atendimento Integrado (CAI), sete ainda não contam com uma ouvidoria integrada à rede de proteção no âmbito estadual e três sequer dispõem de estrutura especializada na violação dos direitos da criança e do adolescente nas defensorias públicas.

Os números reforçam a necessidade de investimento em infraestrutura, recursos humanos e capacitação profissional para garantir o funcionamento adequado da rede de proteção. Revela-se igualmente fundamental a implementação de sistemas integrados de informação, fortalecimento da comunicação entre os órgãos e a ampla aplicação da escuta especializada.

Os problemas verificados pelo levantamento, somados à subnotificação de casos de violência, representam sérios obstáculos. A violência contra este grupo vulnerável persiste, demandando ações urgentes e eficazes e nos despertando para a necessidade de um compromisso nacional com o objetivo de reverter esse quadro.

A realização deste estudo reforça o compromisso da Atricon e dos Tribunais de Contas em fortalecer o controle externo e promover a efetividade das políticas de proteção à infância e adolescência, sempre buscando garantir a correta aplicação dos recursos públicos e o desenvolvimento de ações mais eficazes.

Outros exemplos deste comprometimento são as parcerias firmadas com órgãos e instituições que atuam em prol da criança e do adolescente, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), autor do Pacto Nacional pela Primeira Infância, iniciativa que busca reduzir a vulnerabilidade social e garantir os direitos das crianças de zero a seis anos.

No âmbito desta parceria com o CNJ foram desempenhadas diversas ações. Entre elas vale destacar a Campanha Se Renda à Infância, que contou com o apoio da Atricon e dos Tribunais de Contas ao incentivar a destinação de parte do Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Na busca por melhores condições para esta parcela da população, também se faz igualmente importante a sugestão de medidas que possam trazer resultados positivos, como a criação e implementação de planos eficazes de enfrentamento à violência em todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal), com recursos orçamentários específicos, metas claras e mecanismos de monitoramento e avaliação periódicos.

Investimento em capacitação continuada para os profissionais da rede de proteção, ampliação da oferta de serviços de assistência psicossocial e jurídica para crianças e adolescentes vítimas de violência e suas famílias e implementação de sistemas de monitoramento e avaliação eficazes, com a integração de dados e o fortalecimento da governança intersetorial e intergovernamental, são algumas das possibilidades a serem exploradas a fim de que tenhamos melhores condições de enfrentar este grande desafio.

A violência contra crianças e adolescentes é uma grave violação de direitos e exige a atenção de toda a sociedade. É preciso garantir que esta população seja prioridade absoluta nas políticas públicas, com a alocação de recursos adequada e a implementação de ações eficazes. A proteção à criança e ao adolescente é pauta urgente se quisermos semear um futuro próspero.

  • Edilson Silva é conselheiro do TCE-RO e presidente da Atricon
Adicionar aos favoritos o Link permanente.