Como o Master foi da ascensão a queda (ou não?)

David Graeber é um antropólogo conhecido por ideias conceitualmente polêmicas. Dentre elas, uma abordagem teórica sobre o “mito do escambo”. Na prática, em seu mais conceituado livro (Dívida: os primeiros 5000 anos), Graeber argumenta que a ideia de que pessoas poderiam trocar leite por trigo como uma forma de economia rudimentar é nada mais do que um mito.

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Para Graeber, a economia nasceu por meio do “crédito”. Você dá algo, eu te devo algo em troca. Este crédito poderia ser pago de inúmeras formas, seja pelo trabalho de uma parcela da população em uma tribo pré-histórica, que retribuem a carne que recebem dos caçadores com o trabalho, ou pelo reconhecimento em posições hierárquicas.

Preferência temporal é importante

Essa ideia pode parecer confusa, mas significa dizer algo que boa parte dos seres humanos já possuem internalizado: preferência temporal. Consumir hoje é mais prazeroso do que consumir amanhã.

E para equilibrar isso, os seres humanos evoluíram suas práticas e conceitos até a criação de um mecanismo que busque compensar aqueles que abrem mão de consumir hoje. Na prática, este valor no tempo é o que conhecemos como juros. Adicione um meio de troca, e reserva de valor, na equação e você possui o dinheiro.

Juros são o nome que se dá ao único produto cujo preço não é exposto em cifrões, ou dinheiro, e sim em percentuais.

E o mercado onde este produto é vendido é popularmente conhecido como banco (ou esquina se você estiver comprando de um agiota, que é o banqueiro que não paga imposto sobre suas operações financeiras.

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Por que os bancos são úteis?

Bancos são como o garçom que leva a culpa quando você exagera na bebida, mas também uma parte fundamental de uma economia. Na prática, um banco é responsável por intermediar a sua vontade de comprar um iPhone PRO Max hoje, e a do seu Joel de receber uma grana todo mês quando se aposentar.

Bancos são uma instituição que lida com o dinheiro no tempo, vendendo este produto, o dinheiro, por um preço, os juros.

Ou ao menos eram, até 15 de agosto de 1971. Neste dia, um domingo, o presidente americano Richard Nixon, reunido em Camp David, a residência do presidente americano, anunciou que o dólar não mais seria lastreado em ouro.

Isso significa dizer que governos, e bancos, poderiam criar dinheiro a partir dos depósitos que possuem. Resumidamente, um Real depositado em um banco pode se tornar 8 Reais criados do nada.

O valor exato do quanto pode ser criado, passou a ser determinado pelo nível de capital dos bancos. Este nível é definido pelos acordos do BIS, o “banco central dos bancos centrais”, sediado em Basel, na Suíça. Os acordos por sua vez são conhecidos como “Basileia”.

Com este estratagema, bancos chegaram a lucrar 3% do PIB brasileiro apenas criando dinheiro que não existia em meio à hiperinflação.

Com o fim da hiperinflação, os bancos que sobreviviam com essa estratégia acabaram quebrando, levando a uma concentração no setor.

Era uma farra generalizada, que acabou como você bem sabe: o governo correu para resgatar todo mundo, via PROER.

Bancos sobreviventes, se aproveitaram do momento e tomaram conta do mercado.

O nascimento do FGC

Ciente da situação desastrosa em que se encontravam os bancos, o governo brasileiro anunciou em 1995 um acordo para criar uma entidade privada que tivesse por responsabilidade garantir a segurança do sistema.

O Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Este fundo é gerido de forma autônoma, recebendo recursos de cada operação de crédito no país.

Estes recursos por sua vez, são mantidos na conta do FGC, que investe apenas em títulos públicos. Em junho de 2024, o FGC possuía R$123 bilhões em caixa.

Este valor é uma garantia de que, em caso de default, ou falência bancária, o fundo poderia cobrir os valores na ordem de até R$250 mil por CPF.

Ao todo 99,67% dos depósitos no país se enquadram nesta categoria de “cobertos”, com 561 milhões das 563 milhões de contas existentes no país estando “100% garantidas”.

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O FGC e o Banco Master

Criado em 1974 como uma corretora de valores, o na época Banco Máxima, era um banco discreto com foco no setor imobiliário.

Foi em 2017 que Daniel Vorcaro, empreendedor mineiro cuja família havia feito fortuna no setor imobiliário, comprou o Banco.

Na época, o Máxima possuía um capital de R$30 milhões, tendo uma receita de R$190 milhões.

Vorcaro então reorganizou o banco, dando novas diretrizes, além de realizar um aporte de capital da ordem de R$400 milhões.

A estratégia mais genial, porém, não estava em simplesmente capitalizar o banco.

Cobrado pela concentração bancária, o Banco Central passou a incentivar novos entrantes no mercado. E com isso o FGC passou a ganhar a tarefa de permitir que bancos menores pudessem ganhar espaço.

Master e CDB´s

Na prática, um banco pode captar recursos de diversas formas. As mais comuns, porém, são através de depósitos, algo que bancos grandes possuem de forma abundante e barata, ou os CDB’s.

Os Certificados de Depósito Bancário, são um instrumento que permite aos indivíduos ou empresas emprestarem recursos para os bancos, sendo remunerados por isso em função do CDI.

O Certificado de Depósito Interbancário, por sua vez, é o indicador que mede o empréstimo entre bancos. Este CDI é onde o banco central atua por meio da taxa Selic.

Selic, ou Sistema Especial de Liquidação e Custódia, é o sistema onde o banco central e os bancos atuam para emprestar uns aos outros.

Quando o Banco Central anuncia uma alta de juros, ele faz aumentando ou reduzindo a oferta de crédito neste sistema, o que por sua vez torna o dinheiro mais caro (juros maiores), ou mais barato (juros menores).

O Master e as plataformas

A grande sacada do Master, entretanto, foi em perceber um aumento expressivo de brasileiros que buscavam investir seus próprios recursos.

De 2017 a 2021, o número de investidores na bolsa saltou de 600 mil para 4 milhões.

Este aumento por sua vez, ocorreu em meio a uma revolução no “UX”, ou experiência do usuário.

Em outras palavras, se no começo da década passada você precisava enviar uma carta para abrir uma conta em uma corretora de um banco, agora precisava apenas baixar um app.

A popularização das plataformas, como BTG e XP (as mais populares), fez proliferar junto a função de Assessores de Investimentos.

Dados os incentivos de mercado, porém, o Master encontrou um caminho.

Ofertando taxas generosas em relação ao CDI, e remunerando as plataformas em até 4% dos valores captados, o Banco se tornou uma máquina de captar dinheiro.

A estratégia funcionou bem, com até R$48 bilhões captados, em um banco que há 8 anos, quando trocou de mãos, faturava R$190 milhões.

Os negócios do Master

Com o dinheiro entrando, o Master se tornou um outsider no mercado. Passou a realizar negócios que outros bancos viam menos valor, como “ativos stressados”, ou “turnarounds”.

Este tipo de negócio não é uma novidade. Ele se baseia em comprar barato ativos que estão mal das pernas, injetar recursos e melhorar a gestão, revendendo-os por valores mais altos.

Nos últimos anos não foram poucos os negócios que o Master comprou, como a Veste (ex-Restoque), Metalfrio e dezenas de outros.

O Master também passou a operar fortemente em Tesouraria, onde se utiliza de recursos do banco para realizar operações, como a compra de precatórios.

Dada a demora do governo em pagar certas dívidas, alguns investidores oferecem aos detentores dos títulos de precatórios, um % do que eles planejam receber. E então, aguardam o pagamento.

A escolha de quais precatórios comprar, entretanto, é a parte mais difícil da operação. Afinal, se o banco comprar por 40% do valor de face um precatório que só irá pagar em 2030, ele perde dinheiro.

Mas não foram nestes setores que o Master deu sua grande tacada.

A jogada de mestre

Privatizada em 2015, a Cesta do Povo era uma rede de supermercados estatal da Bahia.

Ao ser adquirida, a rede de pouco mais de uma dezena de lojas, era considerada um negócio pequeno, até que olhando para dentro, notou-se uma área dentro do negócio, até então inexplorada.

A Credcesta era, na prática, um cartão de crédito consignado, destinado aos funcionários públicos da Bahia.

Com risco quase 0, o crédito consignado é uma área bastante explorada por uma série de bancos e financeiras.

Nos leilões que realiza, o INSS já chegou a vender suas folhas de pagamentos por até R$20 bilhões, para que bancos como Agibank, ou a Crefisa, possam realizar o pagamento de aposentadorias e oferecer crédito e outros serviços.

No caso da Credcesta, o negócio era ainda mais interessante, dado o nível de renda do funcionalismo. Enquanto no setor privado a renda média do brasileiro está em R$2600, no setor público atinge R$6 mil em boa parte dos estados.

O Master, através do seu sócio Augusto Lima, focou em expandir o Credcesta, que segundo relatos, possuía uma margem de lucro de 15%.

Em 2022, a Credcesta passou a operar em 21 Estados. E segundo Augusto Lima, em entrevista ao portal Brazil Journal, respondia por 80% da carteira de crédito do banco.

Para efeito de comparação, em 2023, o Master lucrou cerca de R$520 milhões.

A alta da SELIC

Tendo captado recursos com um duration médio de 3,5 anos (segundo entrevista em 2023), o Master viu a Selic sair de 2% em Janeiro de 2021 para 13,75% em agosto de 2022.

Desde então, a Selic continua a rondar acima dos 10% ao ano.

Em reportagem sobre a venda recente para o BRB, estimou-se um custo médio de 120% de funding do Master.

Com a Selic em 14,25%, isto implica que o banco paga hoje, em média, 17% do ano de juros sobre os depósitos.

A alta na Selic não apenas força o banco a pagar mais juros, como reduz os múltiplos em negócios de economia real, onde o banco possui investimentos.

Em meio ao cenário desafiador já em 2024, o Banco seguiu apostando alto.

Em julho de 2024, o Master fechou o aluguel de um escritório de 2500M² em Miami, estimado no mercado em 2045 dólares por m², ou R$29 milhões mensais.

O Master também possui o aluguel mais caro da Europa, em Londres.

Com custo de captação elevado, além de despesas administrativas também em alta, o Banco passou por uma reestruturação.

Em setembro de 2024, Maurício Quadrado deixou o Master, levando consigo o Letsbank, subsidiária do antigo Indusval, comprado pelo Master.

Quadrado agora foca em outro banco, também de Investimentos.

Vorcaro, comprador na ocasião, por sua vez, busca um novo sócio.

BRB compra Master

No acordo recente, o Banco Regional de Brasília, se comprometeu a comprar até 58% do capital do Banco Master.

A operação teve uma avaliação em R$3,5 bilhões, com a fatia comprada pelo BRB, estando avaliada em R$2 bilhões.

A teoria indica que o BRB possui um custo de captação baixo, em torno de 89% do CDI, com inúmeros depósitos em poupança. Mas possui um ROE (retorno sobre o capital), baixo.

O Master por sua vez, possui um custo elevado de captação, mas um retorno elevado sobre o seu capital.

A união seria considerada “perfeita”. Mas não é exatamente o que pensam outros banqueiros.

O BTG, de André Esteves, teria feito uma oferta pelo Master, propondo pagar até R$1, segundo noticias dos últimos dias.

A razão para isso seria um suposto rombo nas contas do banco.

A acusação grave, levou os banqueiros envolvidos na operação, a discutir a questão junto a Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central.

Fato é que como descreve a reportagem de Piauí, Vorcaro sempre foi visto como um estrangeiro na Faria Lima. Outros bancos consideravam seu estilo agressivo, que o acusam de assumir riscos demais.

Outros bancos, porém, ajudaram o Master a captar recursos, garantindo aos clientes que os ganhos acima da média estariam cobertos pelo FGC

Outro fato crucial na questão, porém, é o de que Vorcaro assumia riscos com custo de captação elevados. O que esperar de uma atuação do Master com custos menores?

Este é o dilema enfrentado pelo Bacen, em meio a ameaças de processo por parte dos envolvidos na negociação.

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