Por que o batom virou símbolo do ato bolsonarista pela anistia em SP

São Paulo — Lideranças bolsonaristas estão usando um batom como símbolo da manifestação convocada para a tarde deste domingo (6/4), na Avenida Paulista, em São Paulo, pela anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos realizados no dia 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes, em Brasília, foram alvos de vandalismo.

O batom foi usado por Michelle Bolsonaro (PL) em um vídeo de convocação para o ato deste domingo, no qual a ex-primeira-dama, junto com outras lideranças femininas do campo da direita, usa o objeto para escrever a frase “Anistia Já” em uma camiseta branca.

O símbolo faz alusão ao caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, de 39 anos, que usou um batom para escrever a frase “Perdeu, mané” na escultura “A Justiça”, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), durante os atos de 8 de Janeiro.

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A cabelereira Débora foi condenada a 14 anos de prisão por pichar a estátua da Justiça com os dizeres "perdeu, mané"

Débora Rodrigues dos Santos
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A cabelereira Débora foi condenada a 14 anos de prisão por pichar a estátua da Justiça com os dizeres “perdeu, mané”

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Débora foi presa preventivamente em março de 2023, durante a oitava fase da Operação Lesa Pátria, e só deixou a cadeia no fim de março deste ano, para cumprir prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica. Mães de dois filhos, ela pediu perdão por ter pichado o monumento e que “não fazia ideia do bem simbólico daquela estátua”.

Os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino já votaram pela condenação de Débora a 14 anos de prisão. O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Luiz Fux. Ela é ré pelos mesmos cinco crimes pelos quais o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) responde no STF na denúncia por tentativa de golpe de estado.

A partir da publicação de Michelle, o batom povoou as redes bolsonaristas como forma de convocação para o ato. Ele foi usado em um vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) de sexta-feira (4/4), no qual ele compara a história de Débora a de Rosa Parks – mulher negra que se recusou a ceder o lugar em um ônibus para um homem branco durante o regime de segregação racial nos Estados Unidos.

No vídeo, com mais de 54 milhões de visualizações, Nikolas diz: “Lá, foi um ônibus, aqui, um batom”. Nesse sábado (5/4), o deputado federal Guilherme Boulos (PSol-SP) divulgou um vídeo rebatendo o parlamentar bolsonarista. O psolista afirma que a anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro “não é para salvar a mulher do batom, é para salvar Bolsonaro da prisão”.


Entenda o caso Débora Rodrigues

  • A frase escrita por Débora na estátua em frente ao Supremo era uma referência ao ministro Luís Roberto Barroso, que, após as eleições de 2022, quando era seguido nas ruas de Nova York por manifestantes, virou-se e disse: “Perdeu, mané, não amola”.
  • Pelo ato de vandalismo e por participar do 8 de Janeiro, Débora foi presa preventivamente e denunciada por cinco crimes: deterioração de patrimônio tombado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado com violência e associação criminosa armada.
  • Para os bolsonaristas, a denúncia contra Débora seria um símbolo das injustiças e exageros sofridos pelos presos do 8 de Janeiro a mando do relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes.
  • Por enquanto, somente Moraes e Flávio Dino votaram a favor da condenação da mulher, a 14 anos de prisão. O julgamento foi suspenso após pedido de vista de Luiz Fux. Na ocasião, Fux disse que precisava avaliar a “dosimetria” da condenação, e que, “em determinadas ocasiões”, deparava-se “com uma pena exacerbada”.
  • A fala foi contraposta por Moraes, que afirmou no dia do julgamento que Débora não estava sendo julgada por uma simples pichação, mas porque “estava no quartel pedindo intervenção militar”.

Apelo às mulheres

Usar o batom como símbolo pode ser lido como uma estratégia do bolsonarismo para atrair o público feminino, que costuma ter menos engajamento que os homens nas pautas ideológicas.

Em conversa com o Metrópoles, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Pablo Ortellado explicou que as manifestações bolsonaristas costumam ter uma distribuição demográfica relativamente equilibrada, com pequena predominância superior masculina. Nas eleições presidenciais de 2022, contudo, o voto feminino foi considerado um dos fatores para a derrota de Bolsonaro.

Espera-se que, no ato deste domingo, as mulheres irão ter mais protagonismo que na versão do mesmo ato que aconteceu em Copacabana no mês passado. Dessa vez, Michelle Bolsonaro está na lista dos que vão discursar no evento — ela não compareceu no ato do Rio.

Além da ex-primeira-dama, também estão previstas as falas da deputada federal Caroline de Toni (PL-SC) e da vice-prefeita de Dourados (MS), Gianni Nogueira, e uma oração feita pela ex-deputada Priscila Costa (PL-CE), que é vice-presidente do PL Mulher.

Ao Metrópoles, o pastor Silas Malafaia, principal organizador do ato e que também tem explorado o símbolo do batom nas redes, disse que o caso da Débora virou o maior exemplo da “perseguição” do Supremo a bolsonaristas e dos “exageros” de Alexandre de Moraes. “Com a Débora, o batom, só macho falando fica chato”, disse Malafaia. “Tive de botar mais uma mulher para falar”, completou.

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