E se a China decidir vender os títulos da dívida dos EUA?

O cenário financeiro global está sob intensa pressão nesta segunda-feira (7), com os mercados enfrentando uma das piores crises desde 2008, desencadeada por tarifas impostas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, e retaliações de parceiros comerciais como a China. Nesse contexto, uma questão que há anos preocupa economistas e analistas volta à tona: o que aconteceria se a China, um dos maiores detentores de títulos da dívida americana, decidisse vender sua posição em Treasuries dos EUA?

Ou seja, a China financia há anos a dívida dos EUA ao comprar títulos de sua dívida, e receber rendimentos ao longo do tempo. A China vender esses papéis significaria que ela estaria basicamente pedindo o dinheiro que emprestou aos EUA de volta.

Com base em dados atuais e no clima econômico volátil, essa possibilidade, embora improvável, poderia ter impactos significativos. Mas não tão catastróficos quanto se temia no passado.

A posição atual da China

De acordo com dados recentes, a China é o segundo maior detentor estrangeiro de títulos do Tesouro dos EUA, com cerca de US$ 759 bilhões em março de 2025, conforme reportado pelo Visual Capitalist. Perde somente para o Japão, com US$ 1 trilhão.

A China emprestou uma quantidade relevante de dinheiro porque, durante muitos anos, ela vendeu muitos produtos para os EUA, como roupas, eletrônicos e brinquedos. Com o dinheiro que ganhou, a China comprou esses Treasuries para guardar uma parte dos seus lucros de forma segura, já que esses papéis são considerados muito confiáveis.

Isso representa uma redução significativa em relação aos picos de 2011 e 2013, quando a China detinha mais de US$ 1,3 trilhão.

A diminuição reflete um processo de “desacoplamento financeiro” entre os dois países. A redução teve início com as guerras comerciais da década de 2010 e foram intensificadas por tensões geopolíticas, como as relacionadas a Taiwan e às sanções impostas à Rússia, que levaram nações a buscar alternativas ao dólar.

Apesar da redução, os US$ 759 bilhões ainda representam uma fatia considerável dos US$ 7,7 trilhões em Treasuries detidos por investidores estrangeiros, conforme dados do Departamento do Tesouro dos EUA de dezembro de 2021, ajustados para 2025.

A dívida total dos EUA, que ultrapassou US$ 34 trilhões em março de 2025, segundo o Visual Capitalist, é um ponto de vulnerabilidade. Especialmente em um momento em que o Congressional Budget Office (CBO) projeta que a dívida pública federal pode alcançar 116% do PIB até 2034.

O cenário de uma venda massiva

Se a China decidisse vender todos os seus US$ 759 bilhões em Treasuries, o impacto imediato seria sentido nos mercados de títulos.

Os Treasuries são considerados um dos ativos mais seguros do mundo. Uma venda massiva poderia aumentar os rendimentos (yields) desses títulos, já que o preço dos bonds e seus rendimentos têm uma relação inversa.

No contexto atual, com os mercados já abalados pelas tarifas de Trump, uma venda massiva poderia exacerbar a volatilidade.

Os yields dos Treasuries de 10 anos, que já subiram 100 pontos-base desde setembro de 2024, conforme o CEPR, poderiam disparar ainda mais. Assim, elevando os custos de empréstimos para o governo americano e impactando setores sensíveis a juros, como o imobiliário e o automotivo.

Além disso, o dólar, que já está sob pressão, poderia sofrer uma desvalorização adicional. Desse modo, afetando o poder de compra dos EUA no mercado global.

Impactos na China e no sistema global

No entanto, a China não sairia ilesa. Uma venda massiva poderia prejudicar os EUA no curto prazo, é verdade. Mas também causaria instabilidade econômica crítica na China e na economia global.

A desvalorização dos Treasuries reduziria o valor das reservas internacionais da China, que ainda dependem fortemente do dólar, e poderia desencadear uma fuga de capitais de mercados emergentes.

Incluindo o próprio mercado chinês, que já enfrenta desafios com a desaceleração econômica. Vale lembrar que o crescimento do PIB chinês foi revisado para 4,4% em 2025.

Basicamente, a China também teria problemas se fizesse isso. É como se, ao pedir o dinheiro de volta, ela mesma perdesse dinheiro no processo.

Esses papéis que ela tem valem muito agora, mas, se ela vender tudo de uma vez, o preço deles vai cair, e ela vai receber menos do que esperava. Seria como vender um carro que vale R$ 50 mil por apenas R$ 30 mil porque você está com pressa.

Além disso, a China enfrentaria dificuldades para realocar seus recursos. Um relatório do CEPR de janeiro de 2025 sugere que países como a China estão se voltando para o ouro como reserva alternativa, menos vulnerável a sanções.

No entanto, quais ativos a China poderia comprar para compor suas reservas, seja líquido e que não dependa dos EUA? O mercado de ouro não tem a liquidez necessária para absorver uma venda de US$ 759 bilhões.

Além disso, outras moedas, como o euro ou o iene, também estão sob pressão, com o Reino Unido, Canadá e Japão enfrentando quedas em seus mercados de bonds, conforme o mesmo relatório. Especialistas alertam para Bitcoin neste cenário, que já está no centro das atenções há meses no que diz respeito à reserva nacional de valor.

Porque a China provavelmente não venderá os titulos de dívidas dos EUA

Apesar das tensões comerciais, a probabilidade de a China vender seus Treasuries é baixa. Primeiro, porque isso seria um “tiro no próprio pé”. A venda de Treasuries desvalorizaria os ativos remanescentes da China e poderia levar outros países a comprá-los a preços mais baixos.

Além disso, a China já está reduzindo gradualmente sua exposição aos Treasuries, como parte de uma estratégia de “desrisco” (derisking). Basicamente, ela já está há anos tentando se livrar das dívidas dos EUA, e vendendo aos poucos para justamente não assustar o mercado.

O derisking justamente evita o que muitos temem que aconteça. Uma série de choques abruptos no mercado por uma venda imediata de todos os títulos. Além disso, permite que a China diversifique suas reservas sem causar pânico global.

O conteúdo E se a China decidir vender os títulos da dívida dos EUA? aparece primeiro em BlockTrends – Blockchain Notícias | Investimentos | Economia.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.