Sem anistia: Motta quer ter Lula soltando condenados pelo 8 de janeiro

Não presto atenção ao que diz homem que usa gel no cabelo. É porque as ideias também têm gel, e basta dar uma enxaguada e o lustro vai embora. Mas, contrariando a minha resolução existencial, prestei atenção ao que disse o deputado Hugo Motta, presidente da Câmara, sobre o abacaxi dos condenados pelo 8 de janeiro.

Pressionado pelos bolsonaristas a colocar o projeto de anistia em votação e obsequioso com o STF, tudo ao mesmo tempo agora, o gajo disse aos jornalistas Luciana Lima e Eumano Silva que negocia uma solução para o imbróglio com Lula, em nome da pacificação do país (quando ouço falar em pacificação, penso sempre nas 50 mil vítimas de assassinato a cada ano).

A ideia é chegar a um entendimento entre os três poderes para que as penas pesadíssimas impostas aos participantes do 8 de janeiro sejam aliviadas. “O que tenho defendido é a capacidade de a gente se entender. Eu tenho conversado com muita gente. Também o Executivo tem um papel importante a cumprir nisso”, disse Hugo Motta.

Depois de ler a frase, perguntei aos meus botões (eu estava de camisa social) se não foi “muita gente” que deu esta ideia a ele: substituir o projeto de anistia com outro que prevê o abrandamento de condenações, de tal modo que tiraria a maioria dos depredadores da cadeia e daria aos brasileiros, eternamente em busca de uma ilusão, o sentimento de que a Justiça finalmente voltou ao seu leito.

Segundo os autores da reportagem, alguns petistas gostam da ideia, porque esvaziaria o discurso bolsonarista (como eles poderiam ser contra aliviar sentenças condenatórias?) e concentraria as punições em quem eles apontam como os cabeças do 8 de janeiro: Jair Bolsonaro e o seu entorno, que não teriam mais como misturar-se à geleia geral de uma anistia que beneficiaria tubarões e bagrinhos.

Bom para todos os interessados: Hugo Motta se livraria do abacaxi da anistia. Lula transmitiria a imagem de misericordioso com chance de ganhar pontos de popularidade nas proximidades de um público que o detesta. O STF deixaria de ser o antipático antagonista de uma anistia humanitária e passaria a ser o simpático protagonista de uma, vamos lá outra vez, pacificação nacional que não fere a sua autoridade.

Será que a ideia é mesmo de Hugo Motta? De qualquer modo, preciso começar a prestar atenção ao que dizem homens que usam gel no cabelo.

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