Casas Bahia sobe 300%, mas devolve boa parte dos ganhos: especulação ou virada real?

As ações da Casas Bahia (BHIA3) viveram semanas de forte volatilidade no mercado. Entre o início e o fim de março, os papéis chegaram a registrar alta de quase 300%, movimento atribuído a operações de grandes investidores. A partir de 28 de março, no entanto, a tendência se inverteu e os ativos passaram a recuar, devolvendo cerca de 26% da valorização acumulada. Apesar da correção, o papel ainda exibe forte alta de 145% no acumulado do ano. Na última sexta-feira (11), as ações da varejista registraram alta de 2,89%, a R$ 7,10.

Segundo Matheus Lima, analista de investimentos e sócio da casa de análise Top Gain, o movimento recente não foi motivado por fundamentos sólidos, mas, sim, por uma tentativa de manipulação de preço com o objetivo de provocar um short squeeze — movimento técnico que força investidores vendidos a recomprar ações a qualquer preço, impulsionando ainda mais a alta.

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“O caso da Casas Bahia é complexo há muitos anos. O varejo brasileiro já enfrenta grandes desafios, e a companhia passou por inúmeras situações delicadas”, diz. “Essa disparada para cima não teve nenhum fator fundamental que justificasse o movimento. Foi claramente uma tentativa de gerar um desequilíbrio entre oferta e demanda, forçando a recompra de posições vendidas”.

O analista explica ainda que, como é comum nesses casos, o movimento de alta tende a ser revertido com intensidade semelhante. “Assim como todo short squeeze, tem uma disparada forte para cima, mas a volta costuma ser ainda mais forte. Quem comprou no topo, acreditando em uma nova fase da empresa, pode acabar saindo no prejuízo”, avisa.

Barulho

Em contrapartida, Rafael Ragazi, sócio e analista da Nord Investimentos, explica que parte dessa disparada inicial é fruto do barulho causado pela entrada de dois investidores relevantes. Um deles, Rafael Ferri, montou uma posição equivalente a 5% da companhia. Já Michael Klein, filho do fundador da varejista, ampliou sua participação para mais de 10% do capital da empresa. “Como se trata de um papel com baixa liquidez e valor de mercado reduzido, movimentos de compra mais expressivos acabam impactando fortemente a cotação”, diz.

Ragazi lembra que 25% das ações em circulação da varejista estavam alugadas para operações vendidas. Quando Ferri começou a montar sua posição, houve uma corrida de vendedores tentando encerrar suas posições diante da rápida valorização, o que intensificou a alta.

Foi justamente essa combinação — de baixa liquidez, forte concentração de posições vendidas e compras expressivas de investidores relevantes — que gerou o short squeeze, criando um desequilíbrio artificial entre oferta e demanda e levando a ação a disparar sem que houvesse fundamento consistente por trás, conforme pontuado também por Lima. No entanto, a correção veio na sequência. Com o fim do fluxo comprador desses dois investidores, o papel perdeu força.

Desempenho operacional e financeiro não convencem

Quando se analisa o desempenho operacional da companhia, especialistas não negam que há avanços, mas são unânimes em dizer que não há nada que justifique uma valorização tão acentuada. No último balanço trimestral, por exemplo, a Casas Bahia apresentou ganhos em eficiência operacional e aumento da receita consolidada.

Ainda assim, segundo o documento divulgado ao mercado pela própria empresa, alguns segmentos performaram abaixo do esperado: as vendas do e-commerce próprio (1P) caíram 10%. Por outro lado, tanto as lojas físicas quanto o marketplace (3P) apresentaram crescimento, alavancando a receita total.

O destaque foi a expansão da margem do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda), que subiu quase seis pontos percentuais, alcançando 8%. Esse avanço, conforme balanço financeiro, se deve a uma melhor gestão de estoques, maior penetração de serviços financeiros e controle de despesas.

Com isso, o Ebitda quadruplicou, caracterizando um processo de alavancagem operacional — quando a receita cresce e os resultados operacionais avançam em proporção ainda maior.

Apesar de avanços na gestão de capital, com geração de caixa superior a R$ 1 bilhão no último trimestre, analistas afirmam que a Casas Bahia ainda enfrenta seu principal inimigo: o elevado nível de endividamento. Só no quarto trimestre de 2024 (4T24), a varejista reportou um prejuízo de R$ 452 milhões — número pior que o esperado pelo mercado, ainda que represente uma queda de 55% em relação ao prejuízo do trimestre anterior.

“A melhora nos números operacionais não foi suficiente para compensar os efeitos de um cenário de juros elevados, que limita a capacidade da companhia de se desalavancar e, ao mesmo tempo, pressiona o consumo, afetando diretamente o desempenho das operações”, explica Ragazi.

O que os investidores devem esperar

Diante das incertezas que ainda cercam a reestruturação da Casas Bahia, a recomendação predominante entre analistas é de cautela. Ainda que haja mudanças em curso, restam dúvidas sobre a real capacidade da companhia de entregar resultados consistentes com o plano de reestruturação.

Uma nova movimentação especulativa, segundo os analistas, dependerá da disposição de nomes como Rafael Ferri e Michael Klein em ampliar suas posições, ou da entrada de novos investidores com força semelhante. A empresa propôs uma cláusula poison pill — que determina que investidores possam adquirir um limite máximo de ações da empresa — , para ser votada na próxima assembleia: caso um acionista ultrapasse 20% do capital, será obrigado a realizar uma Oferta Pública de Aquisição (OPA). A proposta quer proteger os minoritários, mas os analistas dizem que não há clareza sobre as intenções dos principais investidores nem sobre a adesão de outros ao movimento.

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Por se tratar de uma ação com baixa liquidez e sensível a operações concentradas, variações abruptas não estão descartadas pelos especialistas. Para quem prioriza fundamentos, a recomendação é manter distância até que surjam sinais mais concretos de recuperação.

Matheus Lima, analista de investimentos e sócio da casa de análise Top Gain, não descarta totalmente a possibilidade de uma nova fase para o papel no longo prazo, mas alerta que sustentar o preço acima de R$ 10, nos níveis atuais, será difícil. “Não estou dizendo que a ação da Casas Bahia está condenada a voltar para R$ 1, mas dificilmente se sustenta nesse patamar apenas com base em especulação”, diz.

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