Presença de ansiolíticos na água está alterando a migração dos salmões, diz pesquisa

Pesquisadores alertam que a presença de ansiolíticos em rios pode estar modificando o comportamento migratório de salmões jovens, com impactos ainda desconhecidos para a sobrevivência da espécie.

Um novo estudo publicado na revista Science em 10 de abril mostra que o medicamento clobazam — comumente usado no tratamento da ansiedade e epilepsia — altera o tempo e a forma como esses peixes chegam ao oceano.

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A substância, um benzodiazepínico frequentemente detectado em águas residuais ao redor do mundo, parece acelerar a jornada migratória dos salmões, fazendo com que cheguem mais rapidamente ao mar e atravessem represas com mais agilidade. Embora o efeito possa parecer benéfico à primeira vista, os cientistas advertem que esse tipo de interferência psicoativa em animais silvestres pode ter consequências graves e imprevisíveis.

“Peixes e humanos compartilham parte significativa da mesma arquitetura biológica. Não é surpresa que drogas desenvolvidas para o sistema nervoso humano também impactem os peixes”, afirmou à CNN o professor Christopher Caudill, da Universidade de Idaho, que não participou do estudo.

Salmões “sem medo”

O estudo foi liderado pelo biólogo Marcus Michelangeli, da Universidade Griffith (Austrália), e acompanhou a migração de mais de 700 salmões jovens no rio Dal, na Suécia, entre 2020 e 2021. O experimento utilizou implantes com liberação controlada de clobazam e tramadol, um analgésico opioide. Os pesquisadores compararam os peixes medicados com um grupo de controle.

Salmões expostos ao clobazam chegaram ao Mar Báltico em maior número e mais rapidamente. No entanto, os cientistas identificaram alterações no comportamento coletivo desses peixes, que passaram a nadar mais afastados uns dos outros, mesmo diante de predadores — um sinal de que a droga reduz as respostas naturais ao medo. Além disso, eles cruzaram represas em velocidade até oito vezes maior, o que pode aumentar o risco de morte nas turbinas hidrelétricas. “A travessia do rio para o oceano é um dos momentos mais perigosos da vida de um salmão. Se as drogas reduzem a cautela desses animais, eles podem ser presas mais fáceis no ambiente marinho”, explicou Caudill.

Sinais de alerta

Essa é uma das primeiras pesquisas em campo a avaliar o impacto real de contaminantes farmacêuticos no comportamento animal em larga escala. Estudos anteriores já haviam demonstrado que benzodiazepínicos influenciam a atividade de peixes, mas eram realizados em laboratórios e com doses acima das normalmente encontradas na natureza. Michelangeli alerta que os resultados mostram a urgência de investigar como a poluição invisível — como remédios presentes em esgotos — pode afetar ecossistemas inteiros. “Mesmo alterações sutis de comportamento podem, a longo prazo, reduzir a taxa de sobrevivência e prejudicar a reprodução. Precisamos entender melhor como essas mudanças se traduzem em impactos populacionais”, afirmou. O pesquisador pretende expandir os estudos para outras espécies e regiões.

Desafio global

A preocupação maior é com o efeito acumulado: muitas substâncias, mesmo em doses baixas, podem interagir entre si e causar alterações imprevisíveis no comportamento de animais silvestres. A poluição farmacêutica é um desafio global. A presença de remédios como ansiolíticos, anticoncepcionais e analgésicos em águas doces já é uma preocupação ambiental crescente. Estudos apontam que esses contaminantes afetam desde peixes até insetos aquáticos e anfíbios. A União Europeia e os Estados Unidos têm intensificado discussões sobre regulação, mas os sistemas de esgoto ainda não conseguem remover completamente essas substâncias.

Para os pesquisadores, o caso dos salmões serve como um alerta de que é preciso rever o impacto da atividade humana sobre os rios e oceanos. “A ideia de que mais salmões chegam ao mar não significa que a população esteja melhor. Eles podem estar menos preparados para sobreviver”, concluiu Michelangeli.

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