Conclave: lista de papáveis é como a aposta máxima na Mega-Sena

Conclave é sempre a mesma coisa na imprensa: convertidos subitamente em vaticanistas, jornalistas fornecem uma extensa lista de papáveis, a maioria deles com chances risíveis.

Isso porque o critério é a falta de critério: publicar o maior número de nomes possível, de preferência cobrindo todos os continentes, como quem faz a aposta máxima na Mega-Sena.

Também é preciso repetir o clichê que, em um conclave, quem entra papável sai cardeal, porque, assim, salvam-se todos no caso de ser eleito um nome que não está na lista. Nem sempre o clichê traduz a verdade: em 2005, por exemplo, Joseph Ratzinger era o grande papável e saiu do conclave como papa Bento XVI.

Já incorri em todos esses pecados e, por isso, não vou dizer quem acho papável, com o perdão da conotação muito pouco religiosa dessa expressão em português.

Limito-me a constatar que, dado o grande número de cardeais que não se conhecem, os italianos nutrem, mais do que nunca, a esperança de ver um compatriota voltar ao Trono de Pedro, depois de 47 anos de estrangeiros no comando do Vaticano. Eles acham que, se não surgir uma revelação durante as reuniões preparatórias, o colégio cardinalício acabará escolhendo um nome de segurança, sem salto no desconhecido.

Mas sabe como é: em um conclave, quem entra papável sai cardeal.

Joseph Ratzinger: eu estava em Roma em 2005, destacado pela revista Veja para cobrir o conclave que elegeria o sucessor de João Paulo II. Em uma das conversas com o italiano Giancarlo Zizola, na época vaticanista do jornal Il Sole 24 Ore, ele me convidou para participar de um “conclave jornalístico” na casa do então correspondente da revista Time na capital italiana.

Além de Giancarlo Zizola e do anfitrião americano, estávamos eu, um jornalista alemão, uma jornalista francesa e outra argentina, todos de grandes publicações. Sob a batuta do vaticanista italiano, trocamos informações sobre os cardeais dos nossos respectivos países e algumas apurações que havíamos feito em Roma.

Ao final, cravamos que Joseph Ratzinger bateria Jorge Mario Bergoglio ou qualquer concorrente. Era o mais óbvio, mas a imprensa resistia a aceitar que o próximo papa fosse outro conservador — e ainda menos que fosse o inquisidor, e inquisidor imbatível nas discussões doutrinárias, do qual João Paulo II lançou mão para conter o clero vermelho da América Latina e domar a ordem dos jesuítas, que havia séculos se comportava como uma Igreja dentro da Igreja, a ponto de o seu chefe ser conhecido como “Papa Negro”.

Deixei de acompanhar os assuntos da Igreja após a eleição de Francisco. Perdeu a graça, porque Jorge Mario Bergoglio era, para mim, uma espécie de Itamar Franco. Mas continua a ser um prazer reler Giancarlo Zizola, que  morreria em 2011, dois anos antes da renúncia de Bento XVI. A sua cultura era fabulosa e os seus livros, magníficos.

Em um deles, Il Sucessore (O Sucessor), sobre o fim do reinado do polonês Karol Wojtyla, Giancarlo Zizola explica que, um conclave, a questão que se coloca aos cardeais não é apenas a de “qual papa para qual Igreja?”, mas também a “qual papa para qual mundo?”. Nem sempre, porém, o nome eleito está à altura da resposta certa. Aliás, na maioria das vezes, dificilmente está, em que pesem os esforços do Espírito Santo.

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