Apoio de Lula ao fim do 6×1 cria embaraço com indústria e comércio

O apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao fim da escala 6×1 tem o potencial alto de criar um embaraço para o governo na relação com o setor produtivo. Empresários de diversos segmentos já apresentam resistência ao presidente da República e esse tema é mais um dos que devem dificultar a relação.

Em pronunciamento alusivo ao Dia do Trabalhador, o presidente Lula declarou que o governo vai discutir a proposta de emenda à Constituição (PEC) de iniciativa da deputada Erika Hilton (PSol-SP) que pretende reduzir a jornada de trabalho.

“Nós vamos aprofundar o debate sobre a redução da jornada de trabalho vigente no país, em que o trabalhador e a trabalhadora passam seis dias no serviço e têm apenas um dia de descanso. A chamada jornada 6 por 1.Está na hora do Brasil dar esse passo, ouvindo todos os setores da sociedade, para permitir um equilíbrio entre a vida profissional e o bem-estar de trabalhadores e trabalhadoras”, disse o petista.

Indústria e comércio têm reagido de maneira firme contra mudanças na atual jornada de trabalho, apesar de não terem se posicionado especificamente a respeito da declaração do presidente da República. Uma das possibilidades é que o assunto seja discutido no âmbito do chamado Conselhão (Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável), composto por empresários, sindicalistas, pesquisadores, artistas e outros representantes da sociedade civil.


Entenda a PEC do fim da escala 6×1

  • A deputada federal Erika Hilton (PSol-SP) apresentou, em fevereiro de 2025, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que visa modificar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para eliminar a escala de trabalho 6×1, em que trabalhadores dão expediente durante seis dias e folgam um (uma jornada de 44 horas semanais).
  • O texto precisa ser enviado primeiro para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, o que ainda não ocorreu.
  • A redação original do texto prevê mudar a jornada de trabalho para quatro dias por semana no Brasil (carga horária semanal de 36 horas), mas é admitida a possibilidade de alterar para cinco dias de trabalho e dois de descanso para melhorar a aceitação da proposta entre as diferentes bancadas da Câmara.

Em abril, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) divulgou estudo que aponta que a redução da jornada de trabalho pode causar perda de até 18 milhões de empregos e impacto de até 16% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, com uma queda de até R$ 2,9 trilhões no faturamento dos setores produtivos.

A análise parte do princípio de que a diminuição das horas de trabalho impacta diretamente a produção e, consequentemente, o número de postos de trabalho disponíveis.

“É hora de consultar todos os setores, todos os envolvidos. Existe uma romantização a respeito do tema, na nossa percepção, de que toda redução do horário de trabalho é positiva”, disse ao Metrópoles o presidente da Fiemg, Flávio Roscoe. Ele condicionou o benefício, porém, à melhora da produtividade.

Roscoe frisou que o teto do horário de trabalho do Brasil (44 horas) é menor que o da Alemanha (48 horas) e que, com as horas efetivamente trabalhadas, a carga efetiva é menor que a média mundial. “Quando a gente limita toda a carga horária do Brasil, você evita as exceções. Tem setores que precisam de determinadas jornadas”, sustentou. “Então, na minha leitura a gente não deve engessar ainda mais a carga horária legal brasileira e deixar para livre negociação entre as partes”.

Por sua vez, a Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) avaliou que este não é o momento para a redução da jornada de trabalho.

“Devemos debater meios de aprimorar a educação e a formação profissional, além de melhorar a infraestrutura e o acesso à tecnologia, entre outros fatores que contribuem para o aumento da produtividade e do ambiente empreendedor”, disse a entidade.

“É hora de o Brasil discutir a reforma da folha de pagamentos para incentivar a contratação e retenção de talentos. Pular essas etapas apenas contribuirá para reduzir a competitividade das empresas brasileiras e, consequentemente, afetará negativamente o mercado de trabalho e a economia nacional”, completou.

Movimentos no Congresso

O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), disse à coluna no Metrópoles de Igor Gadelha que vai acionar o presidente da Comissão de Justiça, Paulo Azi (União-BA), para pedir a instalação de uma comissão especial sobre o tema.

No Congresso, onde há muitos lobbies empresariais, uma das mais vocais resistências vem da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), grupo organizado de deputados que representa o setor empresarial.

Em almoço com o então candidato à presidência da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), em novembro de 2024, o presidente da FPE, Joaquim Passarinho (PL-PA), referiu-se à PEC como uma “bomba”. “Vamos fazer uma discussão mais ampla, então se desonerar a folha de trabalho total, então dá mais um dia de descanso. Vamos aproveitar o debate sobre como dar mais dias de descanso sem dar mais custo para o empregador”, complementou.

Hoje presidente da Casa, Motta defende um debate amplo sobre o fim da escala 6×1 e diz que quem emprega também deve ser ouvido. Não foi estipulado prazo para a proposta começar a andar.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.