Escritora de Novo Hamburgo conquista espaço no cenário da literatura independente: ” Entendi que a escrita era minha forma de viver”

Silvia Kercher cresceu cercada por histórias e livros. Neta de Alceu Feijó, um dos nomes mais importantes do jornalismo de Novo Hamburgo, ela foi se descobrindo escritora com o passar dos anos. Seu primeiro livro, Carola, lançado em 2011 pela editora Novitas, não representou para si mesma a certeza de ser uma escritora.

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Escritora hamburguense conquista espaço no cenário da literatura independente | abc+



Escritora hamburguense conquista espaço no cenário da literatura independente

Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

“Me tornei escritora quando entendi que a escrita era minha forma de viver”, conta Silvia. Essa certeza só veio com os lançamentos seguintes, que hoje somam já 25 livros entre obras físicas e em formato digital.

Passados 10 anos do primeiro lançamento, Silvia chegou em 2021 com sua segunda obra, o livro Farrapo. Professora por formação, foi a partir desta obra que ela decidiu deixar a sala de aula. “Decidi que a escrita seria o meu foco, minha única atividade. Não que eu tenha largado tudo o que fiz, porque a escrita também tem a ver com outras coisas que você vive, mas eu sabia que a minha única atividade seria escrever.”

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Ambientado no período da Revolução Farroupilha, a obra chave na carreira de Silvia acabou virando uma trilogia, cujo último livro da série foi lançado recentemente pela editora Cinco Gatas. “Com Farrapo, acho que eu consegui entender o que era a minha escrita, a minha voz. Antes, eu experimentava estilos, vozes. Agora sei quem sou como autora”, avalia.

Inspiração e incentivo em casa

Professora por formação, Silvia conviveu com as letras desde muito cedo, já que o hábito da leitura sempre foi bastante presente na família. “Íamos para a praia e todos liam o mesmo livro juntos”, lembra. O desejo de também colocar no papel suas impressões surgiu na adolescência, impulsionada pela perda da bisavó, uma das figuras fortemente presente em sua formação pessoal e como escritora.

“Senti que a minha forma de estar com ela e de homenagear ela seria escrever alguma história sobre ela. Quis homenageá-la, mas ainda me faltava bagagem”, relata.

Mesmo em um processo inicial e, como a própria descreve, ainda imaturo, a experiência serviu para que ela compreendesse melhor de onde vinha. “Primeiro eu escrevi uma história que foi totalmente fictícia, né? Depois eu comecei a entrevistar as pessoas da minha família que conheciam, que tiveram conhecimento da história dela”, relata, lembrando como a relação com o romance histórico se fortalecia a partir dali.

O desejo seguiu em uma gaveta durante as décadas seguintes, até a chegada do livro Carola, lançado em 2011 pela editora Novitas. Durante quase uma década ela seguiu se dividindo entre a vida de professora, mãe e escritora nas horas vagas. Mais uma vez a perda de um familiar, desta vez o avô Alceu Feijó, esteve por trás do impulso decisivo para fazer da escrita sua única profissão.

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Em 2021, Farrapo chegou às livrarias, e Silvia decidiu abandonar a sala de aula e se dedicar exclusivamente à produção literária. O romance histórico carregava lembranças das conversas com o avô, falecido um ano antes. A partir do livro, que ela mesma classifica como divisor de águas, a escritora passou a adotar uma rotina de escrita diária e já contabiliza 26 obras publicadas entre livros físicos e digitais.

Neste percurso como escritora independente, Silvia escolheu os romances históricos como seu estilo. Os livros tratam de histórias de amor ambientadas em períodos marcados na memória dos brasileiros. E uma das escolhas que marcam sua escrita está no estilo de escrita.

“Gosto de colocar a nossa forma de falar (nos livros), às vezes as pessoas até não entendem: ‘Ah, tá cheio de erro na história’ (dizem). Mas é porque a gente fala assim, e assim eu escrevo”, explica. “Não sigo a receitinha de ter um final feliz. Vai ter final feliz se ele for coerente com a história.”

Fuga do óbvio

Outra característica que ela busca impregnar em seus livros é a criação de histórias que saem dos tradicionais finais felizes. “Minhas leitoras me chamam de malvada favorita, porque não sigo aquele padrão que todo mundo espera. Às vezes, escrevo histórias em que o final não é feliz, mas ele é coerente com o que acontece na trama.”

A busca por essa coerência narrativa já fez com que Silvia matasse o casal protagonista em uma de suas histórias. Em outras, o casal pelo qual o leitor é convidado a torcer durante todo livro acaba se separando por outros motivos. Segundo a autora, isso acontece também pela complexidade dos personagens e mesmo por uma relação de verossimilhança com a vida real, afinal, o “the end” das histórias de princesa acaba sempre deixando no ar se o “felizes para sempre” foi real.

Só que a escolha por algo mais cru e realista por vezes acaba se chocando com as expectativas e desejos das leitoras. “Tem pessoas que idealizam o mundo em que o homem não trai, a mulher é perfeita, que as coisas acontecem de formas redondinhas. E quando tu apresenta um personagem que não tá se encaixando naquilo ali, a crítica vem e vem pesada”, relata.

Relação com público

Trabalhar de forma independente é um desafio que Silvia demonstra ter conseguido superar quando o assunto é criar uma comunidade de leitoras, mesmo com as críticas quando ela escolhe dar um destino indesejado à trama. “Meu público é basicamente, 80% ou mais até, feminino, entre 25 e 50 e poucos anos, que gosta de ler romances. Eu gosto muito dessa troca com elas, porque a gente costuma fazer leitura coletiva”, conta Silvia.

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Escritora hamburguense conquista espaço no cenário da literatura independente

Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

Nestas conversas Silvia consegue se aproximar do seu público, além de manter suas leitoras cativas, um processo fundamental na vida de uma escritora independente. Silvia diz ter dificuldade em precisar quanto tempo de seu dia é dedicado à criação literária. O fato é que em sua casa, localizada na zona Norte de Porto Alegre, criou um “cantinho” onde diariamente senta em frente ao computador, acompanhada tão somente por uma xícara de café, e ali trabalha em suas obras.

Próximo dela, a filha mais nova, de 8 anos, também se sentiu inspirada pela mãe e montou um espaço de escrita.

Como autora independente, Silvia precisa estar atenta a todo o processo, o que faz a relação direta com os leitores uma parte fundamental do trabalho. “O maior desafio de qualquer escritor hoje é a divulgação, principalmente do autor independente, porque é por conta da gente, tu escreves, precisa cobrir os custos de todo o processo criativo, todo o processo editorial do livro, até a impressão.”

Atenta com as mudanças do tempo, Silvia se fez valer dos e-books como uma importante ferramenta de efetivação do trabalho intelectual. “Hoje em dia a maior renda vem do e-book, não vem do livro físico, esses livros mais comerciais, eles vendem muito mais no formato e-book, como é o caso do Farrapo”, relata.

Relação familiar

Carregando as memórias e histórias familiares, Silvia mostra como a relação com seus familiares foi pedra fundamental para sua escrita. Se a partida da bisavó foi ponto de partida de tudo, a despedida de Alceu Feijó serviu como uma catapulta para se assumir escritora.

“Uns dois dias depois que ele morreu tive um sonho muito intenso que envolvia até outras pessoas da minha família. Quando eu acordei eu senti que estava sufocando com aquela história, foi uma sensação muito forte, e aí eu disse ‘vou ter que escrever essa história’. Já tinha uns cinco anos que eu não publicava”, lembra ela sobre a construção do livro Farrapo.

As histórias do avô Alceu foram para Silvia uma fonte de inspiração, mas também a concretização de uma espécie de compromisso com a escrita que vinha sendo escanteada ao longo dos anos.

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