BRICS: uma arquitetura emergente para a multipolaridade

A ascensão do BRICS como um dos principais arranjos de governança global representa não apenas uma reconfiguração das estruturas internacionais, mas também uma oportunidade estratégica para países em desenvolvimento reavaliarem seu papel no mundo. Para o Brasil, essa reavaliação é urgente. Tradicionalmente comprometido com a defesa do multilateralismo, o país precisa compreender que a ordem internacional vigente, frequentemente idealizada como um sistema de normas universais e de cooperação mútua, tem se mostrado seletiva e profundamente orientada pelos interesses das potências dominantes. Washington, em particular, tem reiterado que as instituições globais só são consideradas legítimas enquanto servem aos seus próprios objetivos estratégicos. Esse padrão de comportamento não é exceção — é a regra.

Diante disso, é hora de o Brasil abandonar a fantasia diplomática que norteou boa parte de sua atuação internacional nas últimas décadas. A crença de que potências desenvolvidas considerarão os interesses brasileiros de forma espontânea e justa não encontra respaldo na realidade. A geopolítica é regida por interesses, e não por afinidades ideológicas ou boas intenções. A inserção do Brasil no BRICS deve, portanto, deixar de ser vista como um gesto simbólico e passar a ser assumida como uma escolha estratégica e pragmática, voltada à ampliação de sua influência regional e global.

O BRICS, ao contrário de fóruns como o G7 e o G20, oferece ao Brasil uma rara oportunidade de atuar com voz própria e protagonismo real. Enquanto os mecanismos tradicionais de governança global continuam a refletir os interesses históricos das potências centrais, o BRICS constitui um espaço de articulação política e econômica mais equitativo entre países em desenvolvimento. Neste arranjo, o Brasil não é apenas um participante decorativo, mas um ator com potencial de influência, capaz de pautar debates, propor iniciativas e construir pontes entre continentes. No entanto, isso exige clareza estratégica e desprendimento de ilusões diplomáticas que, por décadas, nortearam a política externa brasileira com base numa crença equivocada de reciprocidade e boa-fé universal.

A conjuntura internacional evidencia, com intensidade cada vez mais cristalina, que a ordem global está submetida à lógica do interesse nacional das grandes potências. Diante disso, o Brasil precisa abandonar de forma definitiva o manto da ingenuidade diplomática e assumir uma postura madura, estratégica e consciente de seus próprios interesses. Isso implica reconhecer que alianças como o BRICS não devem ser vistas como instrumento partidário ou ideológico, mas como uma plataforma indispensável para projetar o Brasil na nova ordem multipolar que se consolida. Cabe ao país entender esse momento como uma janela de oportunidade histórica — talvez irrepetível — para redefinir seu lugar no mundo.

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Rússia e à China insere-se dentro dessa lógica de reposicionamento. Ao visitar dois pilares fundamentais do BRICS, o presidente deveria consolidar os laços diplomáticos e também retomar o protagonismo do Brasil dentro do grupo. Essa retomada é estratégica, sobretudo diante da ausência da Argentina, cujo atual presidente, Javier Milei, optou por esnobar e ignorar o convite ao bloco, abrindo espaço para que o Brasil reforce seu papel de ponte entre a América Latina e os demais membros do BRICS. Inclusive, seria oportuno que o Brasil se articulasse para trazer novos membros latino-americanos ao grupo, o que fortaleceria o seu peso interno e a sua capacidade de representação regional.

Por fim, é essencial compreender que o BRICS não deve ser instrumentalizado por disputas internas ou por orientações ideológicas de governos de ocasião. O bloco representa uma das poucas alternativas reais ao modelo ocidental de governança, e sua força reside justamente na diversidade de seus membros e na busca por um mundo mais equilibrado, onde o poder seja compartilhado de maneira mais justa. Se o Brasil souber aproveitar essa conjuntura, poderá não apenas defender seus interesses com maior assertividade, mas também contribuir para a construção de uma ordem internacional mais inclusiva, democrática e multipolar.

Ao final, talvez a maior contribuição do BRICS seja esta: provar que é possível pensar diferente — e juntos.

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