Capitalismo sem rivais (por Antônio Carlos de Medeiros)

Na geopolítica do império Ocidental e do império Oriental – Estados Unidos e China – a resultante em processo de formação é a imbricação (dialética) do capitalismo liberal do Ocidente (Estados Unidos) com o capitalismo político do Oriente (China).

Por um lado, o avanço da plutocracia no capitalismo liberal na direção do capitalismo iliberal, com o avanço do trumpismo econômico. O efeito da liderança iliberal de Donald Trump cria uma agenda de impulso ao capitalismo político.

Por outro lado, a consolidação da plutocracia no capitalismo político chinês. O poder da nomenclatura partidária no aparato de Estado, combinado com a descentralização da lógica do capitalismo de mercado pelo país. Com a sustentação de taxas de crescimento do PIB relativamente altas. E uma eficiente burocracia/tecnocracia estatal.

A plutocracia está vencendo. Os modelos de capitalismo ganham perfis semelhantes.

Este registro factual e analítico vem do trabalho seminal de Branko Milanovié em seu recente livro “Capitalismo sem Rivais”, do qual tomei emprestado o título e o “lead” deste artigo.

Branko conclui que o domínio do capitalismo como a única maneira de organizar a produção e a distribuição parece absoluto. “Não há nenhum rival à vista”.

Depois de uma brilhante análise da evolução e metamorfose do capitalismo, ele aponta para a possibilidade da hipótese da convergência dos capitalismos liberal e político.

Segundo ele, uma evolução do capitalismo liberal, num movimento em direção a um capitalismo plutocrático e, por fim, político, é possível. “Quanto mais fortes ficarem as características plutocráticas do capitalismo liberal de hoje, maior a probabilidade desta evolução”.

Pois bem. Estas características ganharam força e tração com a ascensão do trumpismo e da democracia iliberal nos Estados Unidos. O trumpismo costura alianças explícitas com as Big Techs e com os mercados financeiro e imobiliário. O que Milanovié chama de “estreitar laços entre riqueza e poder”.  Para ele a preservação da elite “pressupõe seu controle sobre o campo político”.

Desde a análise de Max Weber em “A ética protestante e o espírito capitalista”, sabe-se que a busca de riqueza é uma das características sociológicas fundamentais do capitalismo.

Pois o chamado espírito capitalista penetrou profundamente na vida individual das pessoas, diz Milanovié. Os avanços da “gig economy” e do empreendedorismo são dois dos sintomas mais recentes. Também com o crescimento da força religiosa dos evangélicos. O espírito competitivo e aquisitivo inerente ao capitalismo.

Para Milanovié, o ponto final dos dois sistemas, o capitalismo liberal e o capitalismo político, se torna semelhante: “a unificação e a persistência das elites”, com laços mais estreitos entre o poder econômico e o político.

Outra sociedade. Outro mundo.

Vem daí três breves reflexões para a nossa realidade brasileira.

Aqui, o capitalismo sem rivais assiste a três movimentos que mostram o início do fim do ciclo político de 1988.

O primeiro é a partidocracia das Emendas. A partidocracia traz a lógica capitalista de mercado para a organização e evolução das máquinas partidárias e alimenta o avanço da plutocracia no processo político.

O segundo, como corolário, é o avanço da plutocracia na Política. O mercado financeiro e as lideranças no mercado produtivo.

O terceiro é aqui também a possibilidade da convergência do capitalismo liberal de mercado com o capitalismo político.

Partidocracia e plutocracia. O nosso capitalismo sem rivais.

 

*Pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science.

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