Conheça Sávio Pinheiro e seu fascinante museu histórico de porcelanas

“Eu jamais pensei em abrir um museu na minha vida”. Essas foram algumas palavras do antiquário Sávio Pinheiro à colunista Claudia Meireles, em meio a uma fascinante e riquíssima visita ao seu museu de porcelanas localizado no Jardim Botânico, em Brasília. Cearense, o engenheiro de telecomunicações mudou-se para a capital federal em 1977, onde fundou o que é tido, hoje, como a maior coleção de porcelanas coloniais e imperiais do Brasil.

Todas as obras ali presentes têm um significado marcante. Em seu aclamado espaço, Sávio é capaz de contar a história do país por meio dos objetos.

Museu histórico

Tudo começou com um hábito peculiar de sua esposa, Edda Pinheiro, de comprar xícaras e porcelanas. “Ela gostava muito disso”, relatou o antiquário, acrescentando que, como um bom admirador da história do Brasil — e influenciado pela companheira —, ele passou a adquirir, ao longo de mais de 15 anos, peças que pertenceram a figuras importantes do passado do país.

“Essa porcelana muda era do segundo barão do Amparo, Joaquim Gomes Leite de Carvalho, avô do primeiro marido de Lily Marinho [Horácio Gomes Leite de Carvalho Filho]. Eu a comprei dela em um leilão”, mostrou Sávio à colunista Claudia Meireles.

Pratos de porcelana

“95% das porcelanas do império brasileiro eram francesas”

Sávio Pinheiro, antiquário

O anfitrião também apresentou peças do rei Luís Filipe da França. Com o monograma “LP”, de Louis-Philippe, a obra, provavelmente, chegou ao Brasil junto às pessoas que vieram se casar com a família imperial, segundo Sávio. “Luís Filipe era Orleans e casou-se com uma Bragança”, explicou.

Pratos que pertenceram ao rei Luís Filipe da França
Monograma “LP”, de Louis-Philippe

De acordo com o engenheiro de telecomunicações, com o tempo, seu acervo tomou uma proporção inimaginável, chegando a uma coleção de milhares de unidades. “Eu ainda não consegui contar”, afirmou.

“Eram tantos objetos e tantas coisas interessantes para contar história, que quando nós tivemos a oportunidade de adquirir esses quatro lotes aqui [no Jardim Botânico], onde ficam também a capela e a escola — que fomos construindo aos pouquinhos —, eu resolvi colocá-los aqui. Muitas pessoas me perguntam: ‘onde estava tudo isso antes?’. Estava na minha casa e no meu escritório”, compartilhou.

Dentre a variedade de artefatos, destacam-se, ainda, as artes sacras, como as imagens de Nossa Senhora de épocas como o século 18.

A primeira imagem de Nossa Senhora de Aparecida do Brasil
Estante com peças sacras

“Eu aprendi a fazer esse colecionismo com grandes antiquários do Brasil, com Carlos Eduardo de Castro Leal, o maior conhecedor de porcelana no Brasil, que, inclusive, escreveu um livro sobre isso. A descrição que ele faz das peças, não só das porcelanas, mas também do mobiliário, é algo extraordinário”, pontuou Sávio.

O colecionador também mencionou nomes como Renato, da Dargent Antiguidades, e Paulo, da Onze Dinheiros.

Assista ao vídeo e explore o emblemático museu de porcelanas em Brasília:

Ao longo do trajeto pelas obras, uma, em específico, também chama atenção: o prato brasonado que pertencia ao conde de São Clemente. Sávio Pinheiro contou que a antiga família construiu, entre 1858 e 1867, o palácio mais suntuoso do Rio de Janeiro durante o império, o Palácio Nova Friburgo. “Ele foi vendido para a República e se tornou o atual Palácio do Catete.

Prato brasonados pertencentes ao conde de São Clemente

Já o aparador francês, adquirido em Paris, no ano de 1862, pela família do barão de Nova Friburgo, pai do conde de São Clemente, ficava na sala de banquetes do palácio, à época.

Sávio Pinheiro fala sobre o aparador da sala de banquetes do Palácio Nova Friburgo, hoje conhecido como Palácio do Catete

Para o proprietário do acervo, o móvel mais importante de seu museu é a escrivaninha de madeira nogueira da imperatriz Maria Leopoldina. “Essa escrivaninha chegou ao Brasil quando ela veio se casar com Dom Pedro I, em 1817. Ou seja, tem mais de 200 anos”, detalhou.

Colecionador mostra móvel histórico que foi usado como pagamento do dote de Leopoldina
Sávio Pinheiro e Claudia Meireles

Sávio ainda exibiu a sopeira do pai do aviador brasileiro Santos Dumont, Henrique Dumont, um homem riquíssimo e considerado “um dos reis do café”. “Ele distribuiu a herança antecipada para o filho, então Santos Dumont foi para Paris e fez o que fez”, pronunciou.

“Santos Dumont comprou essa louça e deu para a irmã mais nova, Francisca Santos Dumond, e ao marido dela, Ricardo Severo. É uma porcelana Limoges”, apontou.

Sopeira do pai de Santos Dumont, Henrique Dumont
Itens pertencentes à família de Santos Dumont
Detalhes das obras

Veja, na galeria a seguir, mais imagens dos itens que pertenciam a Santos Dumont:

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Nécessaire de Santos Dumont demonstrada por Sávio Pinheiro

Itens de Santos Dumont
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Sávio Pinheiro apresenta peças históricas

Gustavo Lucena/Metrópoles

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Nécessaire de Santos Dumont demonstrada por Sávio Pinheiro

Gustavo Lucena/Metrópoles

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Itens de Santos Dumont

Gustavo Lucena/Metrópoles

A história de amor de Eufrásia Teixeira Leite contada por meio de pratos de porcelana

De acordo com o engenheiro de telecomunicações, a mulher mais rica do império brasileiro se tratava de Eufrásia Teixeira Leite. “Ela herdou uma fortuna altíssima das pessoas de sua família. Mas, na época, para manter os bens familiares, costumava-se casar com os próprios primos. Porém, ela não quis e resolveu ir embora para a Europa, onde morou por 50 anos em uma mansão de 3 ou 4 andares, em Paris”, disse Sávio.

“Quando ela entrou no navio para ir embora, conheceu o homem mais charmoso, bonito e inteligente do Brasil, que era Joaquim Nabuco. Eles desembarcaram noivos, mas não chegaram a se casar. O que me chamou atenção nessa história é que, quando ela voltou para o país, em 1930, pediu para ser enterrada com as cartas dele”, continuou o colecionador, complementando que apossou-se de pratos de Eufrásia Teixeira Leite.

Museu de histórias

Símbolos do país

Sávio Pinheiro também apresentou a caneta de ouro com a qual Antônio Cândido da Cruz Machado, 19° presidente do Senado Imperial do Brasil, assinou a Lei Áurea.

Caneta usada para assinar a Lei Áurea em 13 de maio de 1888
Claudia Meireles mostra peça rara

“Já essa aqui é uma faixa que a Confederação Abolicionista Brasileira deu ao senhor Cruz Machado, presidente do Senado, em 1888”, observou o anfitrião.

Faixa de Antônio Cândido da Cruz Machado entregue pela Confederação Abolicionista Brasileira

Encontra-se, ainda, no museu, um pergaminho assinado por Dom Pedro II nomeando Antônio Cândido da Cruz Machado a governador da Bahia, como também a pena de ouro com a qual o Visconde de Mauá, Irineu Evangelista de Sousa, assinou a criação da primeira estrada de ferro do país, em 1848, saindo do Rio de Janeiro em direção a Petrópolis.

“Veja que há alguns brilhantes em forma de estrela na pena. O nome da estrada era Estrada de Ferro da Estrela. Mauá se tornou barão por conta dessa estrada”, descreveu o estudioso.

Pena de ouro com a qual o Visconde de Mauá assinou a criação da primeira estrada de ferro do país, em 1848

Confira, na galeria a seguir, mais fotos da riquíssima coleção encontrada no museu de Sávio Pinheiro:

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Copo de Domitila de Castro Canto e Melo, marquesa de Santos

Claudia Meireles bebe água no copo da marquesa de Santos
Peças de talheres de Dom Pedro II
Bonheur du jour
Serviço pertencente a Ignácio Ferreira de Camargo
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Peça de Paulo de Frontin, prefeito do Rio de Janeiro no início do século 20 e patrono dos engenheiros no Brasil

Gustavo Lucena/Metrópoles

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Copo de Domitila de Castro Canto e Melo, marquesa de Santos

Gustavo Lucena/Metrópoles

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Claudia Meireles bebe água no copo da marquesa de Santos

Gustavo Lucena/Metrópoles

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Peças de talheres de Dom Pedro II

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Bonheur du jour

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Serviço pertencente a Ignácio Ferreira de Camargo

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Sávio Pinheiro demonstra exemplar de encadernação artística feita em ouro

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Exemplar de encadernação artística feita em ouro

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Joias que Dom Pedro deu à esposa

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Estribos femininos

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Estribos femininos, adultos e infantis

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Peças de Dom Pedro II

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Porcelanas do museu histórico

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Peças do Doutor Motta Maia

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Itens antigos

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Pratos do acervo

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Louças de Domitila de Castro Canto e Melo, marquesa de Santos

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Claudia Meireles posa com xícara usada no filme The Princess Diaries

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Pratos expostos

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Peças de porcelana

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Talheres de Dom Pedro II

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Objeto histórico

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Ícones da literatura nacional

Não apenas de esculturas, móveis raros e emblemáticas peças de porcelanas vive o museu fundado pelo antiquário radicado em Brasília. Sávio Pinheiro é um grande admirador da literatura nacional, e fez questão de dedicar parte do espaço a uma coleção de livros inspiradores. As obras, é claro, vêm com muitas histórias interessantes por trás de suas páginas.

Sávio Pinheiro demonstra acervo de livros com dedicatórias especiais
Anfitrião mostra exemplares para a colunista Claudia Meireles

Uma delas, conforme o próprio anfitrião compartilhou com a colunista Claudia Meireles, envolve Tom Jobim:

“Ele estava em um bar de Ipanema, quando entram duas moças. Uma delas chega para ele e diz: ‘Eu sou professora da sua filha’. Então, Tom Jobim falou: ‘Poxa, é a primeira vez que uma paquera se torna uma reunião de pais e mestres”.

Segundo Sávio, tempos depois, o compositor brasileiro foi procurar a bela moça que havia conhecido. Ao ligar para Fernando Sabino, um grande escritor e amigo, solicitando o telefone dela, Tom Jobim não sabia que, na verdade, ela era esposa dele. Sabino, portanto, passou o contato de outro amigo e pediu para que ele fosse enganando o artista musical, para que ele não conseguisse falar com a tal mulher.

“É por isso que na canção Ligia há aquele verso: ‘E quando eu lhe telefonei, desliguei, foi engano. O seu nome, não sei”, manifestou o colecionador.

“Este aqui é o livro de Nélida Pinon com dedicatória para Lygia e Fernando Sabino”, demonstrou o engenheiro de telecomunicações, referindo-se à obra República dos Sonhos.

Livro de Nélida Pinon com dedicatória para Lygia e Fernando Sabino
A República dos Sonhos

Outro ícone do museu consiste no livro Poesias Completas, de Machado de Assis, em que o próprio autor fez uma correção à mão de um erro de impressão da gráfica.

Correção manual feita por Machado de Assis em livro
Exemplar faz parte o acervo de Sávio Pinheiro

Museu, escola e capela: um diálogo entre educação e espiritualidade

Uma área de quatro lotes no Jardim Botânico III, arrematada em leilão pela família de Sávio Pinheiro, hospeda, hoje, três projetos representativos na vida do antiquário: o museu, a escola São Francisco de Sales e a capela Nossa Senhora das Dores. “Meu filho, Daniel Pinheiro, foi ordenado padre, mas não havia igreja aqui disponível para ele. Na verdade, havia fila de espera. Então, Dom Sérgio, cardeal arcebispo de Brasília, muito bondoso, disse que o acolheria, e que nós poderíamos procurar um lugar”, relatou o colecionador.

“Encontramos alguns lotes em um leilão da Terracap que, com a graça de Deus, conseguimos arrematar. Assentada a primeira pedra da Capela Nossa Senhora das Dores, em 10 meses pôde ser rezada a primeira missa”, acrescentou.

O padre Daniel Pinheiro, filho de Sávio, também fundou a escola São Francisco de Sales, ao lado do museu. “É muito complementar, para as crianças, a vida espiritual com a vida intelectual”, declarou o engenheiro de telecomunicações.

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Escola São Francisco de Sales

Capela Nossa Senhora Das Dores
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Museu de porcelanas e, ao lado, a Escola São Francisco de Sales

Reprodução/Google Maps

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Escola São Francisco de Sales

Reprodução/Google Maps

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Capela Nossa Senhora Das Dores

Reprodução/Google Maps

No interior da escola, há um belíssimo altar, decorado com azulejos e rico em detalhes. “Esse altar foi encomendado para cá. Foi feito em madeira por um artista de São João del Rei (MG). Aqui, as crianças ouvem missa duas vezes por semana. E os azulejos contam histórias, como a de São Francisco de Sales”, ressalta.

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Espaço da escola

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Altar na escola São Francisco de Sales

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Espaço da escola

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