Microvestígios: entenda como a PF revela rastros invisíveis de crimes

Elementos químicos, pólen, microfibras e fragmentos de tecidos. Ainda que criminosos atuem para apagar completamente seus rastros em cenas de crime, os microvestígios dão base à célebre frase dita por Sherlock Holmes — personagem de ficção da literatura britânica : “Não existe crime perfeito”. Rastros invisíveis, os microvestígios são pilares fundamentais na identificação de autorias e na revelação da dinâmica de atentados, homicídios e estupros.

Na capital do país, a Polícia Federal (PF) conta com um aparato sofistificado para viabilizar a identificação dos microvestígios. O laboratório, localizado no Instituto Nacional de Criminalística (INC), é o primeiro dedicado a vestígios microscópicos e micrométricos no Brasil. Um dos laboratórios mais bem aparelhados para análises de microvestígios no mundo, é considerado referência na América Latina.

A reportagem da coluna esteve na sala onde os trabalhos acontecem e entrevistou Luciana Schmidt, atual perita criminal à frente do laboratório. A especialista falou sobre a evolução no setor com o advento das ferramentas inovadoras que possibilitam a resolução de crimes registrados em todo o país.

A perita explicou que os microvestígios são vestígios que, em geral, não podem ser vistos sem o uso de alguma ferramenta ou tecnologia. Os rastros minúsculos estão presentes em quase todos os locais de crime e fornecem informações relevantes para o entendimento da dinâmica dos fatos.

Segundo Luciana, ainda que os vestígios macroscópicos — aqueles que podem ser vistos a olho nu — tenham sido removidos, os microvestígios tendem a permanecer no local.

A inauguração do laboratório em maio de 2022, possibilitou aos peritos a análise dos microvestígios com o auxílio das ferramentas mais avançadas tecnologicamente, por meio de técnicas específicas baseadas em microscopia, espectroscopia e análises elementares.

“O trabalho do perito é provar o que aconteceu na cena do crime, ou seja, a sua materialidade, além de como os fatos aconteceram, o que se trata da dinâmica dos fatos. É nesses pilares que os microvestígios entram para auxiliar o perito local a decifrar o que aconteceu. O laboratório de microvestígios ajuda o perito a responder essas importantes perguntas”, explicou Schmidt.

Na prática

A especialista destacou que as informações obtidas com as análises das evidências invisíveis a olho nu levantam inúmeras possibilidades forenses.

Em exames de resíduos de disparo de arma de fogo, por exemplo, os microvestígios, quando encontrados, ligam uma pessoa a um local onde houve um disparo ou confirmam seu contato com uma arma que efetuou um disparo.

“Uma pessoa que morreu ao ser atingida por um projétil de arma de fogo possivelmente apresenta algum microvestígio nas vestes que pode ser usado para, de fato, afirmar que um projétil passou ali. Nesse caso, o laboratório de microvestígios atua para dizer se há presença de chumbo – elemento encontrado em projéteis.”

Uma análise curiosa que também pode ser usada para desvendar a autoria de um crime é a do pólen. A perita apontou que o elemento presente em plantas tem a capacidade de aliar uma pessoa a uma localidade, caso haja impregnação de pólen em suas vestes, por exemplo.

Isso porque o pólen é uma estrutura microscópica que tem uma morfologia específica para cada planta. Ou seja, se a cena do crime ocorre em uma região específica onde só existem polens com a estrutura encontrada em espécies nativas dali, é possível relacionar o suspeito àquele local.

“Certa vez, a análise permitiu que auxiliássemos o Ministério do Meio Ambiente a decifrar um crime de comércio ilegal de polens. O produto, que apresentava estrutura referente ao padrão de outro país, era comercializado como sendo brasileiro. A análise permitiu provar que o produto estava entrando no país de maneira irregular”, lembrou.

Outros exemplos de microvestígios que podem confirmar a conexão entre pessoas, locais e objetos, ou esclarecer a dinâmica dos fatos, são microalgas, resíduos de solo, fibras, vidros, madeira, ossos, entre outros, que podem aderir a superfícies sem serem vistas em escala macroscópica.

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Equipamentos de ponta

O aparato que possibilita a análise exemplar dos microvestígios conta com máquinas avaliadas em milhões pela moeda brasileira.

O laboratório conta com um sistema multifuncional que fornece uma variedade de tarefas analíticas para extrair a quantidade máxima de evidências forenses no menor tempo possível. A máquina é chamada de Estação de Traço/Sistema Modular para Exame de Evidência de Traços.

Um segundo equipamento, chamado de Microfluorescência de raios X (Micro-XRF). A máquina permite a caracterização de composição da amostra usando microfluorescência de raios X e varreduras de área 2D para mapeamento de elementos de qualquer tipo de amostra.

Um terceiro equipamento é o Microscópio Digital de Alta Resolução. A máquina permite obter imagens de alta resolução, com grandes ampliações e multifocais, além de realizar composição de imagens.

Já o Microscópio Eletrônico de Varredura com Detector de Dispersão de Energias de Raio-X (MEV/EDS) viabiliza a obtenção de imagens de alta resolução, além de um detector integrado de difração de raios X (EDS) por dispersão de energia para análise elementar.

Além de ser ferramenta utilizada pela PF na resolução de crimes, o laboratório também é usado como objeto de estudo por alunos da Universidade de Brasília (UnB), além de ajudar o Governo Federal na resolução de investigações como contrabando de ouro, diamantes, falsificação de produtos, entre outros.

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Sistema Modular para Exame de Evidência de Traços

Microscópio Digital de Alta Resolução
Microfluorescência de raios X (Micro-XRF)
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Microscópio Eletrônico de Varredura com Detector de Dispersão de Energias de Raio-X (MEV/EDS)

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