Apesar da calamidade financeira em Novo Hamburgo, Câmara encaminha compra de 140 cadeiras por R$ 117 mil

Enquanto o Executivo de Novo Hamburgo lida com uma calamidade financeira oficialmente decretada, com dívidas na ordem de R$ 200 milhões e sucessivos cortes em áreas sensíveis, a Câmara de Vereadores fez avançar uma licitação que prevê a compra de até 140 cadeiras giratórias de alto padrão por pouco mais de R$ 117 mil. Embora sejam poderes independentes, a fonte de recursos do Executivo e do Legislativo é a mesma, tanto que quando a Câmara não utiliza todo o orçamento, o excedente é devolvido à Prefeitura.

Cadeiras da Câmara de Vereadores de Novo Hamburgo | abc+



Cadeiras da Câmara de Vereadores de Novo Hamburgo

Foto: Joceline Silveira/GES-Especial

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O contrato foi homologado no fim de abril, após um processo de tomada de preço que começou no último dia de março. Em menos de 30 dias, a Câmara já tinha a empresa vencedora do certame, a Roal Indústria Metalúrgica. A empresa de Caxias do Sul se comprometeu a fornecer as cadeiras ao valor unitário de R$ 842,85. Embora o modelo de licitação não obrigue a compra imediata das 140 unidades, o número indica a disposição do Legislativo em investir nesse montante ao longo dos próximos 12 meses.

A tramitação da licitação chama atenção não apenas pelos números envolvidos, mas pelo contexto. O encaminhamento da compra iniciou cerca de duas semanas depois que o Executivo anunciou publicamente o colapso nas contas da Prefeitura. O decreto de calamidade financeira foi publicado em 19 de março e, apenas 12 dias depois, a Câmara deu início ao processo para aquisição das cadeiras. No mesmo período em que a licitação das cadeiras avançava, a Câmara discutia a criação do Dia do Patriota, em alusão ao aniversário do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Cadeira de alto padrão

As exigências técnicas descritas no edital reforçam a natureza sofisticada do produto: as cadeiras devem ser do tipo presidente, com apoio de cabeça, encosto em tela respirável, assento revestido em couro ecológico, braço 3D com regulagens de altura e profundidade, apoio lombar ajustável, base giratória com rodízios anti-risco e regulagem de altura acionada por pistão a gás. O mecanismo precisa permitir ajustes de inclinação, altura e profundidade, com suporte para até 110 quilos e garantia mínima de 12 meses.

No pregão eletrônico realizado em 15 de abril, 15 empresas participaram. Uma das propostas chegou a oferecer as cadeiras por um valor de R$ 795 mil – cada cadeira custaria mais de R$ 5 mil. A empresa vencedora, que inicialmente apresentou proposta de R$ 490 mil (R$ 3,5 mil cada cadeira), foi reduzindo seu lance até chegar aos R$ 117.999, valor final homologado no dia 24 de abril. O contrato foi assinado em 30 de abril pelo presidente da Câmara, Cristiano Coller (PP), autorizando formalmente o fornecimento das cadeiras.

Ao assumir a presidência do Legislativo, Coller chegou a anunciar como prioridade investimentos estruturais no prédio da Câmara, como a troca da rede elétrica e a substituição do telhado, devido a goteiras e infiltrações. A compra das cadeiras não havia sido mencionada como parte dessas medidas prioritárias.

Cristiano Coller é colega de partido do prefeito Gustavo Finck (PP), que está administrando cerca de R$ 200 milhões em dívidas e semanas atrás enfrentou até corte no abastecimento da frota da Prefeitura por atraso no pagamento. Recentemente Coller entregou ao prefeito um cheque simbólico de R$ 1 milhão. O valor é referente à devolução de recurso do orçamento da Casa que não foi utilizado neste início de ano.

“Medida de necessidade operacional e não de luxo”

A Câmara de Vereadores justificou a abertura da licitação alegando desgaste extremo do mobiliário atual, que está em uso desde 1983. Segundo a Mesa Diretora, mesmo com manutenções frequentes, muitas cadeiras tornaram-se irrecuperáveis, o que compromete a ergonomia e segurança dos cerca de 150 servidores.

Diz ainda que a compra está prevista no Plano Plurianual 2022-2025 e será feita por etapas, conforme a real necessidade de cada setor, com rigor técnico e financeiro. O processo licitatório não prevê necessariamente a aquisição de todas as 140 unidades, mas estipula esse número como teto para garantir menor preço unitário. Até o momento, apenas uma amostra foi recebida da empresa vencedora.

As cadeiras serão distribuídas de forma equilibrada entre gabinetes, setores administrativos, plenário, comissões e Escola do Legislativo. Não haverá substituição integral do mobiliário nem ampliação estrutural, com exceção da sala de reuniões da Presidência, que sofre com a falta de cadeiras. O destino das cadeiras substituídas será a realocação interna, se ainda utilizáveis, ou devolução à Prefeitura como bens inservíveis.

Por fim, a Câmara destacou que, apesar do momento delicado enfrentado pelo Município, trata-se de um poder com orçamento próprio. “A compra está sendo conduzida com cautela, legalidade e transparência. Trata-se, portanto, de uma medida de necessidade operacional, e não de luxo ou ampliação desnecessária”, diz a nota.

A resposta da Mesa Diretora afirma, por fim, que a Câmara Municipal compreende e compartilha das preocupações da sociedade quanto ao momento delicado enfrentado pelo Município. “Tanto é que, recentemente, devolveu R$ 1 milhão ao Executivo, reforçando seu compromisso com o uso racional dos recursos públicos”, conclui o comunicado. Na semana passada os vereadores aprovaram a mudança de horário das sessões, da noite para a tarde, alegando que reduziria despesas da Casa.

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