Dicionário Português-Hunsrik marca mais um passo na manutenção da língua nativa dos imigrantes

Em Santa Maria do Herval, é comum que crianças cheguem nos primeiros anos de ensino falando uma língua que difere bastante do português. Trazida pelos primeiros imigrantes alemães a chegarem na região, o hunsrik é um idioma que segue vivo nas tradições orais passadas por gerações não apenas no Rio Grande do Sul, mas também em outros Estados do país e em todos os continentes do planeta.

Solange Hamester Johann é a autora da obra | abc+



Solange Hamester Johann é a autora da obra

Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

Mas mesmo com essa continuidade passada por gerações, a oralidade começou a mostrar seus limites para manter viva a língua ancestral. Foi pensando nisso que em 2004 foi criado o Projeto Hunsrik Plat Taytx, que em mais de uma década tem se dedicado à produção de livros e obras audiovisuais buscando manter viva a tradição. E nesta segunda-feira (12) foi a vez de lançar o Dicionário Bilíngue Português-Hunsrik, a 16ª obra escrita pelo projeto.

O dicionário, produzido com apoio da Lei Aldir Blanc, foi lançado durante a Kartoffelfest, a Festa da Batata realizada em Santa Maria do Herval. O trabalho é resultado de um longo período de estudos de linguistas internacionais que buscam trazer para o papel o idioma que tem sobrevivido muito mais pela tradição oral ao longo dos anos.

Trabalho em sala

Para pessoas como a professora Márcia Fenner, que ministra aulas para estudantes dos primeiros anos, a chegada do dicionário é uma importante ferramenta no trabalho diário. “Ele vai contribuir para o trabalho, porque sempre que tivermos uma dúvida e até para as crianças, por vezes não sabem o que significa (a palavra em português), com o dicionário vamos poder ampliar o trabalho”, conta a professora.

Márcia já tem experiência em trabalhar com o hunsrik na sala de aula, uma exigência que veio da experiência que os próprios alunos trazem de casa. “Muitas crianças chegam falando hunsrik, e para não cortar este vínculo passei a contar histórias em português e hunsrik e eles participavam e interagiam mais.”

Cultura viva

Coordenadora do Projeto Hunsrik Plat Taytx e autora do dicionário, Solange Hamester Johann destaca como o hunsrik é ainda um idioma relevante para segmentos da população brasileira e está presente em todo o mundo. “Somos a segunda língua mais falada no País com mais de 3 milhões de falantes e muitas famílias no interior falam. É a língua oficial de Luxemburgo falada em quatro Estados da Alemanha, dois Estados da França, inclusive nos Estados Unidos com falantes em 39 Estados e no Canadá.”

É em razão dessa forte conexão que Solange aponta para a importância de medidas que possam manter viva a tradição. “É muito importante manter isso preservado porque é nossa identidade, cultura e patrimônio porque nos liga a todos os outros continentes do planeta.”

Uma das entusiastas do trabalho, a professora Márcia reforça o entendimento de Solange. “É a nossa língua-mãe que falávamos tanto e cada vez estamos falando menos. Se a gente não cultivar logo ali adiante ninguém mais vai falar e vai ficar só na lembrança.”

Jeito próprio

Durante a elaboração do dicionário, Solange se viu diante de um desafio grande para conseguir aproximar a escrita do idioma da realidade dos falantes brasileiros. Isso porque, segundo ela, foi possível ver uma resistência dos mesmos para que o hunsrik falado no Brasil esteja mais próximo do português.

“O desafio é fazer com que as pessoas aceitem essa sugestão de escrita, pois na Europa (o hunsrik) é aproximado do alemão padrão, mas aqui as famílias não querem aprender o alemão padrão”, relata. As diferenças de fonemas de letras, que no português podem ter uma letra representando até quatro fonemas. Superada essa barreira, o dicionário foi finalizado e agora é mais uma ferramenta de manutenção do hunsrik.

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