“É desesperador”: mais famílias são notificadas a deixarem suas casas em Novo Hamburgo

Cerca de 10 famílias que vivem na Rua La Paz, no bairro Santo Afonso, foram surpreendidas com uma notificação da Prefeitura de Novo Hamburgo na última semana, às vésperas do Dia das Mães. O documento, entregue por fiscais do Município, determina que os moradores deixem o local no prazo de 30 dias. A área fica ao lado de um campo de futebol e é considerada pública pelo Município.

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morador reside há mais de 30 anos neste local | abc+



morador reside há mais de 30 anos neste local

Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

O caso foi levado ao plenário da Câmara nesta semana pela vereadora Professora Luciana Martins (PT). “Fui chamada por um grupo de famílias que, infelizmente, foram notificadas para que deixem suas casas. São famílias que vivem há mais de 30 anos no local. Ocupam uma área pública? Sim. Há 30 anos? Sim. Mas a municipalidade está construindo um universo de famílias que correm o risco de perder suas casas. São mulheres, mães solos, idosas”, relatou a parlamentar durante a sessão.

A área é alvo do Decreto Municipal nº 10.636/2023, assinado ainda durante a gestão da ex-prefeita Fátima Daudt (MDB). O decreto declara a área como de interesse público, mas não detalha quais ações seriam desenvolvidas no local. A justificativa utilizada no documento menciona a necessidade de proteger o interesse coletivo, o que pode incluir medidas urbanísticas ou ambientais, por exemplo.

Moradores não sabem para onde ir

Entre os atingidos está Celeste Keller, 49 anos, que vive na comunidade há duas décadas. “Criei minhas filhas aqui, uma ainda mora comigo. Eles deixaram um papel na quarta-feira pedindo para comparecer na Secretaria de Desenvolvimento, e na sexta já trouxeram a notificação dizendo que temos 30 dias para sair. Ninguém explicou nada. No sábado entregaram para outros vizinhos. É assustador. Tu investe a vida toda, todo o teu dinheiro, e de repente chega uma notificação dizendo que tem que sair. É desesperador. Tu vai pra onde?”, questiona.

Celeste conta que sua casa foi atingida por um temporal anos atrás e perdeu documentos, mas outros moradores ainda possuem registros de autorização da própria Prefeitura. “A gente não invadiu. Esperamos que a Prefeitura nos dê uma solução. Que legalize ou nos indenize para irmos a outro lugar”, conclui.

Filha de Celeste, Ariele Keller Velasques, de 23 anos, foi quem recebeu a notificação. “O fiscal escreveu a notificação, me entregou e virou as costas. Perguntei o que era, ele disse que é exatamente o que estava escrito no papel. Pedi mais informações, mas ele respondeu que só na Prefeitura.”

Local seria desapropriado para dar lugar à uma praça | abc+



Local seria desapropriado para dar lugar à uma praça

Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

Previsão é de que praça de lazer ocupe o local

Segundo a Prefeitura, no local será construída uma praça, cujos detalhes do projeto devem ser divulgados nos próximos dias. A Secretaria de Desenvolvimento Social e Habitação (SDSH) informou que esteve no endereço nos dias 5 e 8 de maio e que seis das nove famílias foram encontradas nos imóveis. Conforme a nota enviada à reportagem, todas foram orientadas a procurar os programas habitacionais do Município.

Legal ou ilegal?

O casal Antonio Carlos Bertoldi, 57 anos, e Claudia Mara Keller Bertoldi, 53, também vive há mais de 30 anos na área e possui documentos que demonstram reconhecimento oficial da ocupação. Um deles, de 1998, é uma “autorização para ocupação de lote (área da Prefeitura de Novo Hamburgo)”, em que consta o cadastro na Diretoria de Habitação. Ainda assim, em 2009, a família recebeu uma primeira notificação para desocupar o imóvel, o que não ocorreu.

“Quem vai decidir é o juiz. A gente fica preocupados, mas não acredito que irão nos tirar à força”, comenta Bertoldi. Ele afirma que os moradores foram informados de que o local poderá dar lugar a uma nova praça de lazer. “Mas aqui já temos duas praças bem próximas. Não há necessidade de mais uma, principalmente se for para expulsar moradores de suas casas”, avalia.

Ainda na segunda, moradores se reuniram com advogados para saber o que poderiam fazer. Nesta terça-feira (13), um novo encontro está agendado.

Saídas já começaram

A desocupação de áreas públicas em Santo Afonso não começou agora. Em fevereiro, a Prefeitura já havia confirmado a necessidade de remoção de famílias que vivem às margens do dique, comprometido durante a enchente de maio de 2024. Na ocasião, o Executivo informou que 58 famílias estavam em áreas de risco e precisariam sair para que as obras de reconstrução pudessem avançar.

Apesar da confirmação, a administração destacou que o cronograma de remoção dependeria da liberação de aluguel social e da conclusão de novas unidades habitacionais pelos governos estadual e federal. “É importante ressaltar que a segurança da população é prioridade e que, infelizmente, essas remoções são necessárias”, declarou, na época, o secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, Anderson Berttoti.

O Município também prometeu analisar os casos individualmente. Desde então, ao menos quatro famílias já saíram e ingressaram no programa de aluguel social. Questionada sobre o número total de notificações e desapropriações já consumadas, a Administração informou que encaminhará o panorama geral até o final da semana.

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