Compra de lousas digitais teve itens com problemas e ‘desgastes às unidades escolares’; prefeito de Sorocaba virou réu na Justiça


Ao menos 28 unidades escolares de Sorocaba (SP) foram afetadas até 2023. Justiça aceitou a denúncia contra Rodrigo Manga e ex-secretário por suspeita de superfaturamento de 11 milhões, na segunda-feira (12). Rodrigo Manga (Republicanos), prefeito de Sorocaba (SP)
Mike Adas/TV TEM
As lousas digitais compradas pela Prefeitura de Sorocaba (SP) no caso que tornou o prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), e o ex-secretário de Educação Márcio Carrara réus por improbidade administrativa apresentaram diversos problemas e transtornos para a rede municipal de educação.
A Prefeitura de Sorocaba não comentou a questão, enquanto a empresa contratada disse que seguiu integralmente o contrato.
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A compra das lousas digitais foi feita em 2021, primeiro ano da gestão de Rodrigo Manga, com a empresa Educateca Serviços Educacionais. Na ação, o MP cita que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) fez análises no contrato e comprovou que, de cada R$ 4 gastos, R$ 1 foi superfaturado.
O contrato é de R$ 46 milhões, dos quais R$ 44 milhões já foram pagos. Tanto a Prefeitura de Sorocaba quanto a Educateca negam qualquer irregularidade no processo de compra.
De acordo com documentos da Secretaria de Educação de Sorocaba, que compõem a ação judicial, à qual o g1 teve acesso na íntegra, os relatos vão desde instalação irregular até problemas na fixação dos produtos, com risco de queda. Até junho de 2023, os problemas já haviam afetado 28 unidades escolares da cidade.
As reclamações surgiram ainda em 2022 e se intensificaram em 2023. Em um pedido de esclarecimento à empresa, é citado que os problemas estariam gerando reclamações nas unidades escolares e que o modelo de suporte oferecido pela empresa estava dificultando o acompanhamento dos prazos para os reparos, gerando desgastes às unidades escolares.
Em 22 de março de 2023, o fiscal do contrato chegou a acionar o Setor de Licitações da prefeitura para tratar do caso. Ele constatou que não havia qualquer forma de acionamento da garantia, mas apenas de um suporte técnico oferecido pelo fabricante das lousas em site.
Ele relatou que os equipamentos estavam apresentando defeitos de fábrica ou de instalação identificáveis apenas durante o uso. O fiscal também disse que as unidades escolares estavam relatando problemas no atendimento. Ele listou os seguintes pontos:
Tempo de espera de atendimento superior a sete dias ou sequer devolutiva;
Tempo de espera de reparo de equipamentos indefinido;
Ausência de lista de chamados;
Solicitações de testes que exigem conhecimento técnico específico das equipes das unidades escolares, como por exemplo desparafusar compartimentos, desconectar cabos de som e vídeo em locais de difícil acesso ao usuário.
O fiscal faz uma série de questionamentos e chega a lembrar do Código de Defesa do Consumidor em situações em que não há clareza ou menção no contrato.
Documento da Secretaria de Educação de Sorocaba (SP) mostra os problemas na execução de contrato de lousas digitais
Reprodução
Com aval da Secretaria Jurídica da prefeitura, houve, então, a solicitação para que a empresa resolvesse os problemas. A lista de itens com defeito de fábrica ou falha de instalação traz os seguintes pontos:
Trilhos mal encaixados, impossibilitando o fechamento da porta corrediça;
Falha na placa de vídeo;
Projetores queimados;
Computadores queimados;
Falhas no touch;
Falha de instalação com tela touch mal posicionada;
Instalação de suportes de projetor sem utilização de buchas específicas com risco de queda;
Não instalação de adaptadores Wi-Fi em alguns computadores;
Teclados e mouses sem fio com baixo alcance e falha de conectividade.
Em resposta à Secretaria de Educação, a empresa alegou que fazia atendimento por WhatsApp e que havia atendido boa parte da demanda. Em outros casos, apontou o mau uso como gerador dos problemas.
O que diz a prefeitura
Sobre os problemas relatados em documentos oficiais e que estão na ação judicial, o g1 questionou a Prefeitura de Sorocaba se a empresa recebeu algum tipo de punição ou notificação durante o contrato, como os problemas foram resolvidos, que medida a prefeitura tomou para evitar os problemas em outros contratos, como estão as lousas e os demais equipamentos atualmente e se há lousas em estoque.
Não houve resposta. A Secretaria de Educação apenas reiterou que as contratações seguem rigorosamente os trâmites legais.
Já a Educateca disse que cumpriu as obrigações previstas no edital. “Durante a vigência do contrato e do período de garantia, todos os chamados técnicos foram atendidos, incluindo troca de peças e equipamentos. Assim, todas as obrigações previstas no edital e no contrato foram integralmente cumpridas pela Educateca.”
Sobre a ação
MP denuncia superfaturamento de R$ 11 milhões na compra de lousas digitais
Na ação, que é de sexta-feira (9), a promotora Cristina Palma e o promotor Eduardo Francisco Jr., que assinam o procedimento, pedem o bloqueio de bens de Manga e do ex-secretário de Educação, além da empresa fornecedora das lousas.
Contra o ex-secretário também havia o pedido de afastamento do cargo que ele ocupa atualmente na prefeitura. A prefeitura e a Educateca negam qualquer irregularidade (leia o posicionamento completo abaixo).
A Justiça aceitou a ação contra o prefeito Rodrigo Manga, o ex-secretário e a empresa réus na ação, mas indeferiu os pedidos com relação ao bloqueio de bens dos citados e ao afastamento de Carrara do cargo.
O juiz do caso, Alexandre de Mello Guerra, disse que pode rever a decisão em caso de fato novo.
Um dos pontos que mais chama a atenção na denúncia é o fato de que a Prefeitura de Indaiatuba (SP), na região de Campinas (SP), também em 2021, comprou as mesmas lousas, mas com preço bem inferior.
Enquanto que em Sorocaba cada lousa custou R$ 26 mil, Indaiatuba pagou R$ 16,7 mil. Isto é, Sorocaba pagou 56% mais caro, mesmo que, conforme a descrição, trata-se do mesmo produto comprado nas duas cidades. A fornecedora também é a mesma: a empresa Educateca.
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TCE
Na ação, há um trecho sobre o posicionamento técnico do Tribunal de Contas a respeito do caso. O parecer afirma que a compra de Sorocaba tem “potencial incompatibilidade do preço praticado com o mercado”. Em outro trecho, o TCE cita dano ao erário, que significa qualquer prejuízo financeiro causado às finanças públicas.
“Assim, a aquisição integral dos itens registrados geraria um dano ao erário estimado em R$ 11.234.400. Tendo em vista que foram efetivamente adquiridas 1.188 unidades da lousa digital integrada, o prejuízo à municipalidade – diferença entre o valor pago e o pesquisado pela Fiscalização – atingiu o montante de R$ 11.122.056”, cita sobre a comparação com a compra de Indaiatuba.
Tribunal de Contas do Estado em Sorocaba (SP)
Reprodução/Google Street View
Editais idênticos
Em agosto de 2024, ao tratar do inquérito do MP, o g1 mostrou, com exclusividade, várias situações que levantam questionamentos sobre a compra das lousas digitais. Um deles é que, em 2013, a Prefeitura de Sorocaba já teve problemas em uma licitação para a compra também de lousas digitais com a mesma empresa. As exigências do edital eram exatamente as mesmas das lousas oferecidas pela Educateca.
Texto apresentado no memorial descritivo com as exigências para a licitação de Sorocaba (SP) é o mesmo da proposta oferecida pela empresa
Reprodução
O que dizem os citados
A Prefeitura de Sorocaba informou que o município não foi intimado pelo Ministério Público sobre a referida ação e reiterou que “todas as contratações seguem rigorosamente os trâmites legais”.
Além disso, afirmou que o “Juizado da Vara da Fazenda Pública de Sorocaba, por falta de provas, negou pedido de liminar do Ministério Público do Estado de São Paulo, contra o prefeito Rodrigo Manga, o ex-secretário da Educação de Sorocaba Márcio Carrara e a empresa Educateca”.
No questionamento à prefeitura, Manga e Carrara também foram procurados para se manifestar sobre as acusações do MP. Não houve retorno.
A Educateca afirmou que não tem conhecimento de qualquer ação a respeito do contrato firmado com o município de Sorocaba. “De qualquer forma, a empresa garante que todos os atos foram praticados em conformidade com a lei.”
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