‘Inseminação caseira’: após negativa de cartório, Defensoria Pública do DF consegue que criança seja registrada com nome de duas mães


Cartório alegou ausência de documentos que comprovassem origem da gestação. Na inseminação caseira, sêmen de doador é introduzido na mulher que deseja engravidar com auxílio de seringa. Dayane e Tamiris conseguem autorização da Justiça para registrar a filha com o nome das duas mães, em caso de inseminação caseira, no DF..
Arquivo pessoal
A Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF) garantiu na justiça que uma criança tenha o registro civil corrigido, com o nome das duas mães na certidão de nascimento, após ser gerada por inseminação artificial caseira.
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O cartório havia se recusado a fazer o documento, alegando a ausência de documentos que comprovassem origem da gestação. Na inseminação caseira, o sêmen do doador é introduzido no útero da mulher que pretende engravidar com o auxílio de uma seringa, sem que haja sexo e acompanhamento de profissionais de saúde (saiba mais abaixo).
“Sempre tivemos o sonho de sermos mães e assim construir uma família, mas por um bom tempo achávamos que seria muito difícil devido ao alto custo de uma inseminação artificial. Foi quando pesquisando mais sobre o assunto descobrimos a inseminação caseira”, conta Dayane Oliveira.
Entenda o caso
As mães da criança estão em união estável desde julho de 2021 e conceberam a filha por meio de inseminação artificial caseira, em fevereiro de 2025. No entanto, ao buscarem registrar a criança, o cartório recusou-se a incluir ambas como mães.
Durante a gestação o casal havia entrado com processo judicial para a inclusão do nome das duas mães na certidão, mas o pedido foi recusado. O casal recorreu à Defensoria Pública do Distrito Federal, que ajuizou ação pleiteando a inclusão da mãe não biológica como segunda genitora no registro civil da criança.
“O nosso desejo era que assim que nascesse pudéssemos registrar o bebê como todo casal faz e não foi possível. O bebê teve que ser registrado apenas com o nome da que gestou, para depois a família ser incluída”, diz Dayane.
Na sentença, a juíza responsável reconheceu a existência da união estável no período da concepção e aplicou entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que admite a presunção de filiação nas uniões homoafetivas com uso de técnicas de inseminação artificial, mesmo que realizadas de forma caseira.
Com o pedido aprovado integralmente, foi autorizada a alteração do nome da criança para incluir o sobrenome das duas mães.
“Claro que nenhum papel define o fato de eu ser mãe, o amor e a conexão que eu sinto por ela vai além de qualquer papel. Mas, desde que começamos a planejar e pensar em crescer a nossa família, sempre senti que ela é de fato minha filha, e ter isso no papel, com o meu nome também na certidão, é uma sensação incrível”, diz Tamiris Inácio.
Para o defensor público Márcio Del Fiore, a atuação da defensoria foi essencial para garantir a proteção integral da criança e assegurar a igualdade de direitos às mães, conforme previsto na Constituição Federal e nas decisões mais recentes dos tribunais superiores.
”Muitas vezes, casais homoafetivos enfrentam obstáculos burocráticos e discriminação institucional no acesso a direitos básicos, como o reconhecimento da filiação. Essa decisão reafirma o princípio de que o afeto e o compromisso mútuo são tão legítimos quanto qualquer outra forma de parentalidade. É dever do Estado acolher essas famílias e protegê-las”, diz o defensor.
Procedimento não é proibido
Inseminação caseira: veja os problemas do procedimento improvisado e perigoso
A inseminação caseira não é amparada por nenhuma legislação no Brasil. Apesar disso, a técnica não é proibida no país, explica a advogada Bruna Andrade.
Porém, o Conselho Federal de Medicina (CFM) veta a comercialização do material genético, ou seja, a cobrança pelo sêmen é proibida.
Quando o casal lésbico faz a inseminação caseira, um imbróglio é criado na hora de registrar o bebê, porque, para que a documentação seja feita com o nome das duas mães, é necessário apresentar o laudo da clínica de fertilização, segundo determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Quem opta pela inseminação caseira não tem em mãos um laudo deste tipo, por isso, é necessário recorrer à Justiça.
“É preciso entrar com processo judicial requerendo o reconhecimento da dupla maternidade. Para isso não é preciso esperar a criança nascer, podendo ser feito ainda durante a gestação”, explica Bruna Andrade.
Para a médica Tatianna Ribeiro, ginecologista especialista em reprodução humana, a inseminação caseira não é um método seguro. Um dos principais riscos envolvidos no procedimento é a contaminação.
“Não apenas pode acontecer casos de infecção, mas a contaminação por instrumentos. A manipulação do material do doador também não vai acontecer em um ambiente adequado e precisamos fazer uma triagem para identificar algumas doenças, o que não é feito quando se faz uma inseminação caseira”, diz a ginecologista.
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