Cidadania italiana: Ruptura abre crise jurídica e afeta milhares de brasileiros

A aprovação da lei que restringe o direito à cidadania italiana por descendência, nesta terça-feira (20), pela Câmara dos Deputados da Itália, depois de ter passado pelo Senado na semana passada, já está sendo considerada a maior mudança no sistema de obtenção de cidadania italiana nos últimos 90 anos. Agora, a decisão final vai parar nas mãos do Judiciário italiano, que terá a missão de dizer se a lei é ou não constitucional, de acordo com especialistas ouvidos pelo InfoMoney.

Com forte articulação dos partidos de direita, o novo texto limita a cidadania por jus sanguinis (direito de sangue) apenas a filhos e netos de italianos. A regra anterior, que não estabelecia limites de gerações, permitia que bisnetos, trinetos ou mesmo descendentes mais distantes também pleiteassem a cidadania, desde que comprovassem a linha de descendência.

“Foi uma profunda alteração na estrutura da lei da cidadania, como nunca se viu, e atinge diretamente milhares de brasileiros cujo parentesco é mais distante”, afirma Matheus Reis, fundador da assessoria io.Gringo.

Fim do direito ilimitado

Entre as principais mudanças, a nova lei prevê:

  • Limite de gerações: apenas filhos e netos de italianos poderão obter a cidadania por descendência.
  • Prazo para registro de filhos: descendentes de italianos reconhecidos como cidadãos têm até 31 de maio de 2026 para registrar seus filhos. Caso não o façam, os filhos perdem o direito.
  • Filhos nascidos após 27 de março de 2025: deverão ser registrados como cidadãos italianos até completarem um ano de idade, desde que os pais já sejam reconhecidos como cidadãos italianos.
  • Fim da via administrativa: não será mais possível obter a cidadania por meio dos procedimentos administrativos tradicionais, como os feitos por prefeituras italianas (comune). Os pedidos deverão ser feitos exclusivamente pela via judicial.
  • Validade: Todos os processos iniciados até o dia 27 de março de 2024, data em que o decreto foi publicado, permanecem válidos sob as regras antigas.

Especialistas questionam a legalidade

Para juristas e especialistas em cidadania, a nova lei fere princípios constitucionais italianos. “O projeto tem diversos vícios e pode ser considerado inconstitucional porque retira direitos adquiridos e ainda prevê efeitos retroativos, o que não é permitido pela Constituição Italiana”, afirma a advogada Luiza Costa Russo, da Gioppo & Conti, especialista em cidadania europeia.

A expectativa é que o Judiciário italiano seja acionado para avaliar a legalidade da norma. “Do ponto de vista jurídico, toda essa mudança fere claramente o Estado de Direito italiano”, reforça Renata Bueno, ex-parlamentar italiana e advogada especializada em cidadania.

Segundo ela, o trâmite da nova legislação surpreendeu até os especialistas. “A votação foi relâmpago. Era esperado que o texto passasse por comissões, mas foi direto para o plenário da Câmara, com a aprovação do mesmo conteúdo votado no Senado”, explica.

Caminhos possíveis a partir de agora

Quem já protocolou o processo de cidadania, seja na Itália ou no Brasil, não será afetado pelas novas regras. No entanto, aqueles que ainda não deram entrada no pedido deverão seguir as novas exigências.

Para quem não se enquadrar mais como filho ou neto de italiano, a única possibilidade será morar na Itália por pelo menos dois anos, com residência legal, e entrar com pedido de naturalização, um processo mais demorado, burocrático e com critérios adicionais.

“Para quem quiser solicitar o reconhecimento da cidadania italiana, agora só restará a via judicial e, nesse caso, o risco de não conseguir ficou muito maior”, disse o advogado Fábio Dias, sócio e cofundador do FDS Advogados e parceiro da consultoria Cidadania4U.

Leia Mais: Lei que restringe cidadania por sangue na Itália tem aprovação final; veja o que muda

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