Gripe aviária: Importante agora é conter, diz Turra, ex-ministro da Agricultura

Francisco Turra foi ministro da Agricultura no primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Por mais de 12 anos, comandou também a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), onde hoje atua como presidente do conselho consultivo. Ele acompanhou de perto a construção dos controles sanitários para que o Brasil ficasse imune da influenza aviária, mas não se mostra tão surpreso com o primeiro caso da doença no país.

“A gente procurou, de todas as formas, conter a influenza aviária, que já havia praticamente ocorrido em todos os países. Aconteceu porque era quase inevitável. Diante dos acontecimentos no mundo todo, seria um milagre a gente passar incólume”, disse Turra, ao InfoMoney.

O executivo admite que os efeitos do novo vírus nas exportações de frango devem repetir a lógica de quando um foco da doença de Newcastle foi identificado no ano passado, também no Rio Grande do Sul. As vendas para o exterior foram abaladas e alguns mercados ainda não voltaram a comprar do Estado. Mas o país conseguiu se manter como maior exportador de carne de frango do mundo.

Turra diz que as empresas do setor estão agindo de forma integrada no cumprimento dos protocolos para evitar que a influenza aviária se espalhe além dos focos onde foi descoberta. Esses esforços, segundo ele, devem preservar a reputação do Brasil no mercado global.

“O importante é saber conter. Esse conceito o Brasil tem e é o que me parece mais importante”, afirma. Outro ponto que joga a favor do país, aponta ele, é a falta de mercados que possam substituí-lo nas exportações. “Não há país que tenha excedentes como o Brasil”, afirmou.

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Francisco Turra, ex-ministro da Agricultura e conselheiro da ABPA (Reprodução da internet | @francisco.turra.abpa)

Confira, a seguir, a íntegra da entrevista.

InfoMoney: O Brasil ganhou protagonismo nas exportações de carne de frango por não ter caso de influência aviária há décadas. O senhor vê riscos desse revés prejudicar esse status que o país alcançou?

Francisco Turra: Com todo o trabalho feito para conter a influência aviária, o Brasil se tornou, desde 2005, o maior exportador do mundo, com 37% de participação nas exportações mundiais. E além de tudo, é um setor extremamente profissionalizado, tem 4 milhões de empregos diretos e indiretos. É muito importante, principalmente para a pequena propriedade. O nosso sistema de integração é modelo no mundo, porque ele torna o pequeno produtor um empresário. Há até uma lei específica de integração. […] Mas, efetivamente, o Brasil já estava mais preparado com protocolos, estudos, a ciência junto, o treinamento feito num caso de ter influência aviária. Ou seja, aconteceu e imediatamente entraram em ação os protocolos da Organização Mundial da Saúde e também do próprio Ministério da Agricultura. Ou seja, descarte de ovos, abate de aves, regionalização, desinfecção, corredores sanitários, todas as medidas foram tomadas. Então isso faz com que a gente imagine que o estrago seja menor e que a gente possa superar mais essa, sem dúvida.

InfoMoney: Mas o senhor não acha que o aparecimento da doença mancha a reputação que o Brasil construiu?

Francisco Turra: Quando aconteceu a doença de Newcastle, tivemos a demonstração de que o mundo acredita no trabalho de sanidade do Brasil. Ter ou não ter [uma doença] é uma questão, às vezes, de lógica. Mas o importante é saber conter. Esse conceito o Brasil tem e é o que me parece mais importante.

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IM: No ano passado, o foco da doença de Newcastle no Rio Grande do Sul acabou impactando as exportações de frango por uns três meses. O senhor acredita que isso pode se repetir com a gripe aviária também?

FT: É um quadro que é normal. Pelos protocolos que os países importadores tem com o Brasil, há uma suspensão temporária [de importações], no mínimo, do estado onde aconteceu [o caso da doença]. No máximo, o país como um todo, como é para muitos. Mas isso é uma coisa que, na medida em que você demonstra capacidade de conter, de reagir, você vai reconquistando. Agora, sobram prejuízos mais demorados, principalmente na região onde aconteceu. A lógica foi essa, por exemplo, para o Newcastle. Até agora o Rio Grande do Sul não retomou vendas para o mercado chileno e o chinês, por exemplo. Já estávamos retomando, sendo arrumado e tivemos o infortúnio de acontecer isso que aconteceu agora.

IM: Sobre o risco de que a influenza chegue a outras localidades, o senhor acredita que os cuidados prévios que o Brasil teve serão suficientes para evitar que a doença se espalhe?

FT: Há risco de novos focos porque o caso ocorreu em uma granja de ovos férteis, que já tinha realizado vendas para alguns países e outros estados brasileiros. Isso agora está sendo rastreado e os ovos que estão lá [na granja] estão sendo descartados. É um detalhe um pouco mais sensível, porque a [contaminação] ocorreu exatamente onde jamais poderia acontecer. Se tivesse sido em um aviário simples, seria mais fácil dizer que já está contido. Dá mais trabalho, mas está sendo feito esse trabalho para ir atrás do prejuízo.

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IM: Os compradores que anunciaram a suspensão de importações do Brasil tem mercados alternativos hoje?

FT: Não há país hoje que possa substituir o Brasil porque o volume [de exportação] é muito grande. Os Estados Unidos são o maior produtor, mas quase não tem excedentes exportáveis. A União Europeia é importadora. Não há país que tenham excedentes como o Brasil. Os que têm, já estão exportando, então não conta. Isso conta a favor do Brasil.

IM: E como as empresas do setor estão lidando com a presença da gripe aviária no país? Quais ações a ABPA tem percebido por parte desses grandes players do setor de proteína?

FT: Estão todos absolutamente integrados, unidos, aceitando e cumprindo protocolos. O caso aconteceu em um lugar onde a empresa tem meios de ajudar a conter, condições para investir na contenção. E nos casos onde há dificuldade, a solidariedade das empresas, do governo, do fundo que temos forte no Rio Grande do Sul pela defesa sanitária, ajudam.

IM: As enchentes no Rio Grande do sul completaram um ano recentemente. Como a chegada da influenza aviária no estado impacta a recuperação do setor agrícola no Estado?

FT: É como se as pragas do Egito tivessem se repetido. Tivemos Covid, enchente, estiagem, tudo o que podia, inclusive a Newcastle e agora a influenza aviária. Mas parece que isso tudo também se tornou um treinamento para superação.

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