Uso prolongado de antidepressivos gera maior abstinência, diz estudo

Pessoas que utilizam antidepressivos por mais de dois anos apresentam risco significativamente maior de sintomas de abstinência ao interromper o tratamento. A conclusão foi apresentada em pesquisa conduzida por especialistas da University College London (UCL).

Segundo o estudo, publicado na Psychiatry Research em abril, usuários de longo prazo também sofrem efeitos mais intensos e prolongados da chamada “síndrome de retirada”, além de terem menor probabilidade de conseguir interromper o uso da medicação com sucesso em comparação aos que utilizaram por menos tempo.

“Confirmamos o que muitos suspeitavam: a duração do uso determina amplamente o risco de abstinência”, afirmou o autor principal da pesquisa, o psiquiatra Mark Horowitz, da UCL, em comunicado à imprensa.

Abstinência associada a antidepressivos

Há anos os psiquiatras já sabiam que interromper o uso de antidepressivos, especialmente se de forma súbita, pode gerar síndrome de retirada. Se há uma suspensão abrupta da dose, a condição pode aparecer com sintomas variados, indo desde os típicos da gripe, em um estágio leve, até um efeito rebote em casos graves, que pode intensificar a doença anteriormente tratada com a medicação.

A novidade da pesquisa da UCL é indicar que o uso prolongado, assim como a utilização de antidepressivos mais potentes, apresenta uma associação maior com a síndrome. Os dados servirão para pensar uma nova forma de diminuir esses efeitos com protocolos mais prolongados de retirada.

“Os sintomas de abstinência são comumente sentidos por pessoas que estão parando de tomar antidepressivos, então aconselhamos que as pessoas que desejam abandonar o medicamento o façam em consulta com um profissional de saúde informado”, disse a psiquiatra Joanna Moncrieff, que chefiou o estudo.

Dados revelam impacto em usuários

O levantamento envolveu 310 pessoas na Inglaterra que tentaram interromper o uso de antidepressivos prescritos enquanto recebiam atendimento em serviços de terapia do NHS. Desse total, 62% relataram que os medicamentos foram úteis em algum momento do tratamento.

Entre os participantes, 79% relataram ao menos um sintoma de abstinência. Cerca de 45% indicaram efeitos classificados como moderados ou graves. Os sintomas mais comuns incluíram tontura, dor de cabeça, vertigem, náusea e fadiga.

Mais da metade dos usuários de antidepressivos por dois anos ou mais afirmou não conseguir interromper o uso quando tentou. Esse número cai para 21% entre os que usaram os medicamentos por menos tempo, evidenciando uma diferença marcante relacionada à duração do tratamento.

Como funcionam os antidepressivos? Manual do usuário

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Gravidade e duração da “síndrome da retirada”

Os pesquisadores analisaram o impacto do tempo de uso em três aspectos: incidência, intensidade e duração dos sintomas. Eles concluíram que o tempo prolongado foi o principal fator associado às dificuldades na descontinuação dos antidepressivos.

Entre os usuários que tomaram os remédios por mais de dois anos, 64% relataram sintomas moderados ou sérios de abstinência, sendo que 25% enfrentaram efeitos classificados como graves. Apenas 7% dos que usaram antidepressivos por até seis meses relataram sintomas graves.

Além disso, 30% dos usuários de longa duração disseram ter sofrido com efeitos por mais de três meses e 12% por mais de um ano.

Redução gradual ainda carece de mais estudos

A equipe responsável também avaliou se os entrevistados interromperam o uso de forma abrupta ou gradualmente. Embora muitos tenham tentado uma redução progressiva, poucos fizeram isso por mais de quatro semanas, dificultando conclusões firmes sobre a eficácia do método.

Diante dos dados, os autores destacaram a importância de pesquisas futuras sobre o melhor protocolo de redução. “Esta é uma das razões para não usar antidepressivos por mais tempo do que o necessário, porque isso pode tornar mais difícil parar de usá-los mais tarde. Os pacientes devem seguir estritamente a recomendação médica”, afirmou Horowitz.

A taxa de resposta da pesquisa foi de 18%, o que representa uma limitação. Os pesquisadores reconhecem que pessoas com experiências mais negativas podem ter sido mais propensas a responder, embora o questionário não tenha se restringido à temática de abstinência.

Recomendações e cuidados ao interromper o uso

Entre os sintomas relatados que não envolvem aspectos emocionais estavam tontura, náuseas e vertigens. Esses sinais foram fundamentais para distinguir efeitos de abstinência de possíveis recaídas nos quadros de depressão ou ansiedade.

Os pesquisadores alertam que a decisão de iniciar ou interromper antidepressivos deve considerar não apenas o impacto imediato, mas também os desafios potenciais de longo prazo. A orientação clínica individualizada é vista como essencial para mitigar riscos futuros.

“Assim como devemos ter cuidado antes de tomar uma medicação, é importante buscar a orientação médica antes de suspender seu uso para que se adote a melhor estratégia. Interromper uma medicação é algo que leva tempo e deve respeitar um protocolo para acostumar o corpo do paciente”, conclui o psiquiatra Alexandre Valverde, de São Paulo, que não participou da pesquisa.

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