CNJ ordenou devassa em varas que juiz da decisão em 16 minutos atuou

Em decisão do final de fevereiro, o Corregedor Nacional, Mauro Campbell Marques, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), determinou ao Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) uma correição em todas as varas em que Glauco Coutinho Marques, o juiz que deu uma decisão em 16 minutos, atuou nos últimos 5 anos.

“Oficie-se à Corregedoria do TJPB para que promova correição extraordinária nas varas em que o Magistrado Glauco Coutinho exerceu a função jurisdicional nos últimos 5 anos, bem como promova a apuração da denúncia constante na inicial da presente Reclamação Disciplinar, devendo apresentar relatório final de conclusão no prazo de 30 dias”, diz a decisão.

A determinação se deu dentro de uma Reclamação Disciplinar protocolada no CNJ que questionou a atuação do juiz em um processo de disputa empresarial que tramitou na comarca de Gurinhém (PB), onde Glauco é suspeito de dar decisões contra aposentados.

A reclamação, de setembro de 2024, pedia o afastamento do juiz da comarca e a abertura de um Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) para investigar a atuação do magistrado.

Para justificar sua suspeição, os denunciantes afirmaram que o juiz teria relação próxima com o advogado envolvido no caso, tanto o que atuava formalmente no processo, como um suposto advogado oculto. Haveria indícios também de que esses advogados seriam sócios ocultos de um advogado pessoal do próprio juiz e de sua esposa.

Nesse cenário, afirmarma os denunciantes, o magistrado estaria julgando processo em que o advogado da parte autora é seu próprio defensor em outras ações. Apesar disso, narra a peça, ele não se declarou suspeito.

O documento afirma, ainda, que ele cometeu infrações disciplinares durante sua atuação no processo, a exemplo de conceder uma decisão provisória atendendo aos pedidos das autoras da ação. Diz o documento que isso foi feito sem ouvir a outra parte no processo.

A liminar, segundo a reclamação, teria sido viabilizada por meio de um suposto esquema envolvendo honorários advocatícios de R$ 200 mil.

Por fim, é narrado na peça que o juiz, na decisão liminar, nomeou como gestor judicial e administrador judicial para a empresa tratada no processo. Essas nomeações teriam sido de pessoas próximas ao magistrado.

Glauco foi afastado da comarca de Gurinhém meses depois da reclamação. A decisão, no entanto, não partiu do CNJ, mas se deu após o juiz ser alvo da primeira fase da operação Retomada, em dezembro de 2024, que investiga fraudes em decisões que beneficiam um grupo investigado por descontos indevidos de aposentados e pensionistas na Paraíba.

O PAD ainda não foi aberto.

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Decisão de 16 minutos

Como mostrou a coluna, o magistrado é um dos investigados na operação Retomada e entrou na mira do Ministério Público da Paraíba após dar vários decisões em favor de associações.

O juiz é citado em documento da operação como “figura central” dos fatos investigados e contra quem recaem “as suspeitas de manipulação de atos de jurisdição”. A defesa nega qualquer ilícito.

Documento da operação obtido pela coluna mostra como um grupo de empresários, entidades, advogados e servidores atuava junto ao Judiciário para conseguir decisões favoráveis contra os interesses de aposentados.

O juiz foi responsável por uma decisão relâmpago que, por sua rapidez, chamou a atenção dos investigadores. No caso, ele levou apenas 16 minutos para decidir em um processo.

“Em alguns casos, aliás, tamanha foi a velocidade no curso do processo que, entre o protocolo inicial e o julgamento, passaram-se apenas poucos minutos, como ocorreu com o processo em que a petição inicial foi aviada às 11h10 do dia 08 de junho de 2024 (um sábado) e a sentença foi prolatada às 11h26 do mesmo dia”, diz um dos documentos da apuração.

Em fevereiro de 2025, no entanto, a Justiça anulou a decisão relâmpago. Ao analisar o mesmo processo e os mesmos documentos que Glauco, a juíza verificou que “os possíveis associados, em sua maioria, não têm vínculo algum com a comarca de Gurinhém, sequer com o Estado da Paraíba, pois residem em outros Estados da Federação.”

Defesa

A coluna procurou a defesa do juiz Glauco para falar sobre a representação no CNJ, mas não obteve uma manifestação. O espao está aberto.

Sobre a operação Retomada, que investiga os descontos contra aposentados, a defesa do juiz Glauco Marques afirmou que o juiz sempre esteve disponível para contribuir com a Justiça e nega todas as imputações feitas na representação do Ministério Público, que resultaram no afastamento do cargo de juiz.

O advogado também cita que o processo está sob sigilo, mas destaca que “não há uma única prova ou ao menos indícios que determinem qualquer ligação ou mesmo afetividade e amizade entre Glauco e os advogados das referidas associações”.

“O que se tem, na verdade, é um juiz que, em sua judicatura, homologou acordos entre a associação citada e seus próprios associados, e deferiu liminares que por vezes não foram sequer revogadas pelo Egrégio Tribunal de Justiça da Paraíba”, afirma.

De acordo com o advogado, após o cumprimento de “dezenas de cautelares, inclusive, buscas e apreensões, não se olvidou qualquer transação bancária efetivada em favor do juiz, ou mesmo conversas entre os envolvidos”.

A defesa diz ainda que, apesar das centenas possíveis ações identificadas pela investigação, pouco “mais de uma dezena destes processos” ficaram sob responsabilidade do juiz.

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