Mais um dia normal no Brasil? Por que a Bolsa opera estável após recuo no IOF

Em poucas horas, o governo federal revogou parte de um decreto que aumentou o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), anunciado nesta quinta-feira (23). As novas regras não foram, nem de perto, aprovadas pelo mercado financeiro. Porém, a partir do anúncio, já não havia mais notícias positivas: a revogação também foi mal recebida. 

“A revogação de algumas partes do decreto trouxe um certo alívio, se deixasse do jeito que estava seria pior, mas não muda o modo como o mercado interpretou a decisão”, diz Lucas Constantino, estrategista-chefe da GCB Investimentos. Ele completa dizendo que o episódio “mostra que o governo está buscando desesperadamente bater a meta fiscal via aumento da arrecadação”. 

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Com isto, o risco fiscal volta a ficar em evidência na pauta econômica. O congelamento de R$ 31,3 bilhões do orçamento de 2025, visto como positivo, ficou em segundo plano. Um dos receios do mercado está em uma guinada do governo para o aumento relevante dos gastos em 2026, ano de eleição. Contribui com esse temor a análise de que as receitas não estão sendo devidamente ajustadas, o que mostraria disposição em aumentá-las no ano que vem. 

No fim do pregão de ontem, o Ibovespa reverteu sua alta e fechou em queda de 0,44%. As perdas eram ampliadas no início da sessão de hoje, mas o pessimismo foi perdendo força e a Bolsa operava próxima à estabilidade por volta das 13h15, enquanto outros assuntos passaram a povoar o noticiário econômico, como o presidente dos Estados Unidos recomendando tarifa direta de 50% para União Europeia a partir de 1° de junho. O índice de ações brasileiro segue distante do pico alcançado no pregão de ontem.

Impacto incerto

A primeira reação do mercado “é mais especulação”, segundo Gabriel Redivo, sócio e diretor de gestão da Aware Investments. Ele defende que ainda é preciso calcular o impacto do aumento do IOF na contratação de crédito por empresas, medida que não foi revogada pelo Ministério da Fazenda. 

Os financiamentos para empresas fora do Simples Nacional terão taxa de 0,95% na contratação e 0,0082% ao dia, com teto anual de 3,95% – antes, as alíquotas eram de 0,38% na contratação, 0,0041% ao dia e teto anual de 1,88%. 

A medida “pressiona margens, retarda investimentos e fragiliza a geração de emprego, justamente o oposto do que um ciclo de corte de juros deveria estimular”, argumenta João Arthur Almeirda, CIO Suno Wealth.

O aumento da carga tributária também pode impactar a inflação com o repasse de custos aos consumidores, segundo Pedro Bresciani, sócio do Utumi Advogados. Ele ainda defende que, apesar de legalmente possível, o efeito imediato do aumento de alíquotas traz “prejuízo à segurança jurídica e previsibilidade nos investimentos”. 

Mais um dia normal no Brasil?

Um dos pontos que mais preocuparam o investidor local é a diminuição do fluxo de investimento estrangeiro com a volatilidade nas decisões do governo. Esse fluxo é essencial para o sucesso da Bolsa em 2025.

Para Redivo, porém, o investidor de fora veio para o Brasil ciente das peculiaridades do País, motivado por um contexto maior de rotação de portfólio que beneficiou a economia local. “Os players viram que o Brasil tem oportunidades de fazer negócios que antes (das tarifas de Trump) eram realizados com os Estados Unidos; o fluxo estrangeiro não é um troféu para a economia doméstica, mas uma consequência dos últimos acontecimentos na economia global”, diz o especialista. 

Na mesma linha, Constantino comenta que “por mais que (decisões como o decreto do IOF) tornem o ambiente mais problemático, afetam mais o brasileiro que o investidor estrangeiro”. 

“O mercado global olha para este episódio como mais um dos vários problemas do Brasil em relação ao controle de gastos”

— Lucas Constantino, estrategista-chefe da GCB Investimentos

O estrategista-chefe da GCB ainda argumenta que “normalmente, as pessoas esquecem rapidamente” de episódios considerados ruins, como este. “Para muitos, pode ter sido a gota d’água (para uma perda irreversível na confiança no governo), mas outros podem ter esquecido disso na semana que vem”. 

Ricos vão fugir do IOF?

Se ainda é difícil de precificar o impacto do aumento do IOF nos fundamentos das ações, os especialistas projetam que a decisão pode incentivar investimentos offshore, o que, dependendo do volume, pode impactar a Bolsa local. “Esperamos aumento na demanda por diversificação internacional diante da insegurança gerada pelas medidas”, diz Almeirda. 

Um dos itens revogados pelo governo é o que passava a cobrar o imposto em remessas de fundos de investimento para o exterior, medida que afetaria os multimercados. A equipe econômico também voltou atrás na decisão de aumentar para 3,5% a alíquota sobre remessas de pessoas físicas ao exterior destinada a investimentos. 

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Para Constantino, mesmo sem a revogação “muita gente ainda estaria tirando o capital daqui”. Isto porque o imbróglio só ajudou a aumentar a desconfiança de quem já temia por taxas que inviabilizariam investimentos offshore. 

Para o multi family office Aware, que já atendia clientes que queriam proteger o patrimônio através da internacionalização, o movimento de saída do Brasil pode ser potencializado. “Hoje, os investimentos já estão na pauta do brasileiro; creio que uma segunda onda, de começar a falar em investimentos lá fora, será impulsionada”, diz Gabriel Redivo. 

Entre as opções no exterior estão os bonds, títulos de renda fixa que podem gerar boa rentabilidade e proteção cambial, além de ações grandes empresas americanas. “Não precisa mergulhar de cabeça na internacionalização do patrimônio, o investidor pode buscar ativos seguros”, destaca o sócio da Aware. 

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