Oito anos após rebelião mais violenta da história do RN, 19 presos continuam desaparecidos


MPF, DPU e DPE cobram solução para desaparecimentos forçados ocorridos na Penitenciária de Alcaçuz em janeiro de 2017. Pelo menos 26 detentos morreram. Presos são vistos durante rebelião no presídio de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte
Nacho Doce/Reuters
Oito anos após a rebelião mais violenta do Rio Grande do Norte – que ficou conhecida como massacre de Alcaçuz – 19 presos continuam desaparecidos. Eles estariam na unidade prisional quando a rebelião eclodiu em janeiro de 2017.
O Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte (DPE/RN) entraram com uma ação civil pública contra a União e o estado do Rio Grande do Norte por omissão na apuração desses desaparecimentos.
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O g1 procurou a Procuradoria-Geral do Rio Grande do Norte para comentar sobre a ação, mas não havia recebido respostas até a atualização mais recente desta reportagem. O Ministério da Justiça e Segurança Pública também não respondeu aos questionamentos da Inter TV Cabugi.
A Secretaria de Estado da Administração Penitenciária (Seap) informou que atualmente o Estado cumpre todas as exigências quanto à segurança nos presídios.
A rebelião foi marcada por brigas de facções criminosas que resultaram em massacres e levaram, pelo menos, 26 detentos à morte.
O objetivo da ação é responsabilizar os gestores pela falta de medidas efetivas para esclarecer a situação desses presos desaparecidos e obter a reparação integral dos danos materiais e morais causados aos familiares das vítimas.
Além disso, a ação visa doção de medidas que impeçam a repetição das cenas de caos observadas há oito anos na penitenciária.
Responsabilidade
A ação aponta que o Estado do RN falhou na gestão do sistema prisional, permitindo a rebelião e não adotando providências efetivas para evitar mortes e desaparecimentos.
A União, por sua vez, conforme indicado na ação, foi negligente na fiscalização e no cumprimento de compromissos internacionais de direitos humanos, incluindo a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, à qual o Brasil aderiu em 2007.
O documento foi assinado pelo procurador da República Fernando Rocha, pelo defensor público estadual Rodrigo Gomes e pelas defensoras públicas federais Carolina Soares e Flávia Fernandes.
Medidas
Além da responsabilização dos gestores, a ação também requer que sejam adotadas medidas concretas para localizar os desaparecidos e garantir transparência na investigação. Entre as providências previstas na ação estão:
criação de um plano de contingência para crises no sistema prisional;
fortalecimento dos mecanismos de controle externo sobre as unidades prisionais;
implementação de tecnologias de monitoramento, como câmeras e drones;
fornecimento de informações contínuas às famílias das vítimas;
implementação de um banco de dados genéticos para identificação de possíveis vítimas;
e adoção de um sistema de registro eficiente de movimentação dos detentos.
Violação
A investigação do MPF teve início a partir de relatórios do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), que identificou indícios de desaparecimento de internos, além de relatos sobre a incineração e descarte de corpos em fossas sépticas.
O inquérito do MPF apontou a ausência de perícia adequada, falhas na preservação da cena do crime e contradições nos dados oficiais sobre foragidos, mortos e desaparecidos.
Para os autores da ação, a omissão do estado e da União configurou uma grave violação aos direitos fundamentais dos detentos e seus familiares.
“Não se trata apenas de um problema administrativo, mas de um cenário de desaparecimento forçado, crime reconhecido internacionalmente como uma das mais severas violações de direitos humanos”, ressalta Fernando Rocha.
A ação tramita na Justiça Federal do Rio Grande do Norte e pode resultar em condenações à União e ao Estado por danos morais e coletivos, além da imposição de medidas estruturais para evitar que situações similares voltem a ocorrer.
Relembre reportagem da época do Massacre:
Diretores do pavilhão 5 de Alcaçuz, onde 26 presos morreram, são exonerados
Massacre de Alcaçuz
O massacre de 2017 na Penitenciária Estadual de Alcaçuz foi o episódio mais sangrento do sistema prisional potiguar, terminando com pelo menos 26 presos mortos. A rebelião começou no dia 14 de janeiro daquele ano e envolveu uma disputa de dois grupos criminosos rivais.
Os corpos de 26 presos foram encontrados em condições de extrema brutalidade. Com capacidade naquela época para 620 internos, Alcaçuz tinha 1.200 presos no dia da matança.
Antes de acontecer o massacre, os pavilhões 1, 2, 3 e 4 pertenciam à Alcaçuz. Já o pavilhão 5, antes dominado por presos do Primeiro Comando da Capital, fazia parte do Presídio Rogério Coutinho Madruga, que é um anexo de Alcaçuz. Na época, apenas uma cerca de arame farpado separava as duas unidades.
Armados, presos do PCC saíram do pavilhão 5 e invadiram o pavilhão 4, onde estavam parte dos presos do Sindicato do Crime do RN, facção rival que nasceu de membros desgarrados do próprio PCC.
19/01 – Presos são vistos durante um confronto de facções na penitenciária de Alcaçuz, perto de Natal, no Rio Grande do Norte
Andressa Anholete/AFP
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