5 coisas que você precisa saber antes de sair falando de impostos sobre dividendos

A proposta de taxação de dividendos voltou à pauta, com uma nova roupagem de substituição tributária. Os problemas, e os acertos, são velhos conhecidos neste debate.

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Como o carnaval, a greve da UNE contra cortes na educação e as matérias do fantástico sobre vereadores em “congressos” em cidades turísticas, a proposta de taxar dividendos também está muito bem estabelecida no nosso calendário político.

Desta vez, a proposta surge através do Ministro Fernando Haddad, a quem Lula atribuiu a ingrata tarefa de equilibrar o orçamento ao mesmo tempo em que amplia gastos.

Até o presente momento, Haddad tem sido efetivo na missão. Em princípio, propôs um inexequível “arcabouço fiscal”, que 9 entre 10 economistas ou políticos, sabiam não ser viável, mas que serviu ao propósito de dar folga para autorizar a “PEC da transição”.

Neste momento, porém, o foco de Haddad está em tirar do papel um misto de volta dos impostos sobre dividendos com taxação de grandes fortunas.

E isto é o que você precisa saber sobre essa ideia.

Por que existe este debate?

Tributação de renda é, com exceção do Brasil, a norma entre países da OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, um clubinho que reúne economias avançadas, além de outros convidados (como México e Colômbia, por exemplo).

Em média, na OCDE, os impostos sobre renda, lucros e ganhos de capital estão em 12,2%, contra 6,4% do Brasil. Na outra ponta, os impostos sobre bens de consumo, por outro lado, totalizam 18,8% do PIB no Brasil, contra 11,6% no Brasil.

Na prática, significa dizer que o Brasil privilegia fortemente os impostos que incidem nas suas compras no mercado, ou no celular, no carro e na gasolina que você compra eventualmente.

É daí, portanto, que surgem os milhares de vídeos de tiktokers e youtubers comparando preços no Brasil vs EUA, um país onde os impostos sobre consumo são relativamente baixos, mas as alíquotas sobre ganhos de capital e sobre a renda são mais elevados.

Essa distorção implica dizer que os mais pobres pagam relativamente mais impostos do que os mais ricos no Brasil. Segundo o IPEA, o Instituto de Política Econômica Aplicada, famílias com renda de até 2 Salários Mínimos pagam até 47% da sua renda em impostos, contra uma média de 21% dos mais pobres.

E porque o Brasil faz isso?

A eficiência na arrecadação é um tema tão ou mais relevante do que a alíquota em si. No Brasil, a escolha por tributar o consumo se dá por uma questão de “base contribuinte”.

Imagine o seguinte. São ao menos 94 milhões de brasileiros no mercado de trabalho. Destes, 40% estão na informalidade, o que implica dizer que não seguem a CLT, não possuem um CNPJ e não são funcionários públicos.

Isto não implica, entretanto, em dizer que não possuem renda tributável. Ao contrário, a Receita Federal estima que estes contribuintes deixam de pagar R$400 bilhões anuais em tributos como a contribuição previdenciária, ou de renda. Sim, a informalidade é por larga vantagem a maior causa da sonegação no país.

Limitar o número de contribuintes aqueles que possuem registro obrigatório, os CNPJs, faz sentido para a realidade brasileira.

Com a implementação da Substituição Tributária, onde uma refinaria passa a pagar o imposto de toda a cadeia de combustíveis, por exemplo, torna o trabalho da Receita Federal e das Receitas Estaduais, mais fácil.

Sabe aquela máxima de que no Brasil o único serviço público realmente eficiente é a Receita? Há controvérsias.

Essa lógica não é lá tão recente. No século 19, tarifas de importação eram a forma vigente de arrecadação, pois tributar no porto, que é um local físico e limitado, é mais fácil do que sair cobrando no interior. Da mesma forma, impostos sobre propriedade são alguns dos mais antigos de que se tem registro. Tributar consumo, portanto, é uma “novidade” histórica.

Quando o Brasil definiu essa não tributação de dividendos?

O primeiro imposto sobre dividendos da história brasileira surgiu em 1892, cerca de 30 anos antes do primeiro imposto sobre a renda, de 1923. Ele esteve vigente por pouco mais de um século, enfrentando o mesmo dilema apontado acima, de uma base diminuta de pagadores.

A mudança por aqui, porém, ocorreu em 1995, através da Lei nº 9.249. O motivo? Uma decisão política em função da reforma do Estado brasileiro no período.

Em suma, a Constituição Federal de 1988 visava criar um Estado de Bem-Estar social, como a implementação do SUS e a universalização do Ensino Médio, concretizados na década de 90, além de uma forte expansão de benefícios previdenciários.

Para implementar este sistema, entretanto, o país precisava na época garantir a estabilidade econômica, o que foi feito através do Plano Real, em 1994.

Nos 15 anos que antecederam o Plano Real, o país enfrentou uma inflação superior a 13 trilhões de por cento. A maior do mundo já registrada em um país sem guerra (até então).

O Plano Real por sua vez foi um conjunto de medidas que ao longo de 4 anos buscou retirar esqueletos do armário, como as dívidas estaduais, além de reformar o Estado, fazendo-o passar de empreendedor, dono de centenas de estatais, para um Estado fiscalizador, através das agências reguladoras.

Um dos pilares deste plano incluía uma paridade entre a nova moeda e o dólar.

Para sustentar isto, o governo aprovou o fim da isenção de dividendos. Seguindo a lógica dos anos 90, essa medida tornaria o Brasil um país amigável para o capital internacional, garantindo dólares para financiar investimentos por aqui.

O problema, entretanto, é que essa medida generosa não resolvia a questão crucial enfrentada em países ricos.

Porque os países ricos taxam dividendos?

A escolha destes países, que contam com boa estabilidade econômica e moedas fortes, está no dilema do acúmulo de capital.

Na prática, tributar empresas e não tributar indivíduos, significa portanto incentivar que as empresas distribuam seu lucro, o que diminui seu caixa.

Em suma: se a empresa distribui o lucro, ela fica com caixa menor para investir.

É por essa razão que países como a Dinamarca, tributa pesadamente a renda dos indivíduos, mas cobra 21% de imposto sobre lucro das empresas, contra 34% do Brasil (onde pode chegar a 45% no caso de instituições financeiras).

Tributar os dividendos, reduzindo o imposto sobre as empresas, pode portanto ser uma boa ideia do ponto de vista macroeconômico. Empresas, em teoria, alocam melhor capital do que indivíduos, mais voláteis as taxas de juros.

Visualize, por exemplo, o caso da Itaúsa. A empresa que controla o Itaú, além de outros ativos como a Aegea, de saneamento básico. A Itaúsa hoje distribui mais de 80% do seu lucro, retendo pouco capital.

Em um cenário onde dividendos são taxados, a Itaúsa teria incentivos para reter capital e alocar em setores que considera boas oportunidades, como infraestrutura. O investidor de Itaúsa, entretanto, pode investir em um fundo multimercado, que opera ações, câmbio e renda fixa. Rodando sua carteira atrás de maiores juros.

Em países ricos, essa é uma não discussão. No Brasil, porém, o risco consiste em saída de capitais. Investir no Brasil se torna menos atrativo.

Quanto arrecadaria?

A proposta do governo alega que a arrecadação poderia ser de R$50 bilhões, o suficiente para isentar o pagamento de Imposto de Renda até R$5 mil.

Trata-se de uma estimativa ousada, em especial pois pessoas com renda superior a R$600 mil, que seriam tributadas, possuem maior incentivo para buscar brechas.

Temos hoje, por exemplo, que investimentos em Renda Fixa podem ser isentos de Imposto de Renda e dividendos.

Na prática, o que podemos visualizar a seguir seria o seguinte cenário:

Um investidor que possui R$10 milhões, pode alocar em debêntures incentivadas pagando 0% de imposto de renda e dividendos, ou investir em empresas, que por sua vez gerariam lucro tributável.

Nosso sistema é, sem surpresa, repleto de furos. Mexer em um deles, implica consequências nos demais locais.

E ao contrário do que você possa estar pensando, políticos não são as pessoas mais inteligentes da sala, afinal, pessoas reagem a incentivos, e os custos e tributos de uma transação costumam moldar estes incentivos.

É mais provável, portanto, que a arrecadação passe longe dos R$50 bilhões almejados, mas que a isenção pretendida atinja este valor. Ou seja, terminaríamos tributando menos a renda.

É evidente que o contexto do país é outro em relação ao que era nos anos 90, e que a discussão é válida. O problema, entretanto, é outro.

Imposto não deve ser pensado como punição

Dentre os inúmeros problemas brasileiros, a passionalidade ao discutir políticas públicas é de longe o maior.

Há 6 anos discutimos a reforma da previdência, uma obviedade já encara por cada um dos presidentes brasileiros nos últimos 30 anos Todos eles, sem exceção, aplicaram reformas na previdência.

Na reforma de 2019, porém, tivemos um debate calcado no “fim da aposentadoria” para apontar que o Brasil adotaria uma idade mínima. Na época, dois dados se destacavam:

O Brasil era um dos 6 países do mundo sem idade mínima. E um catarinense se aposentava em média aos 56 anos, contra 64 anos da média de um maranhense. Era, e ainda é, evidente que algo está errado.

Neste debate sobre tributação, o erro crasso consiste em ignorar as consequências e acreditar que os indivíduos alvo permanecerão inertes, e ainda pior, que se trata de “justiça”.

Imposto não é, e não deve ser, uma questão de fazer justiça

O imposto deve ser sempre neutro, sem desincentivar a produção de riqueza.

Via governo, justiça social pode ser feita através do gasto, não da arrecadação, como mostram todos os países quando analisamos a variação do GINI, o índice que mede a desigualdade de renda.

Acreditar que devemos taxar os super ricos “por que sim”, não implica melhorar a vida dos mais pobres automaticamente.

E desviar o foco da discussão para a arrecadação, não irá gerar efeitos positivos para os mais pobres. É preciso encarar o gasto público e o seu efeito altamente distorcivo na distribuição de renda.

Do contrário, vamos apenas taxar os muito ricos para pagar auxílios aos ricos do judiciário.

Afinal, estamos falando de um imposto que arrecadaria no máximo 2% do atual gasto público.

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