Seleção Canarinho: a Disneyworld do futebol (Roberto Caminha Filho)

Era uma vez uma seleção temida, respeitada, reverenciada. Uma seleção que botava medo até em juiz suíço. Uma seleção que produziu o maior de todos os tempos, Pelé, e a rainha eterna, Marta, que driblava adversárias até no pensamento. O Brasil já foi o país do futebol. Hoje, é o país do “quem que tá jogando mesmo?”

O ano era 1958. A seleção brasileira encantava o mundo com um futebol moleque, bonito, daqueles que fazem a bola sorrir. Garrincha corria mais que boato em cidade pequena, e Pelé, com 17 anos, já parecia ter vindo de outro planeta – talvez um onde o futebol fosse obrigatório no DNA. De lá pra cá, foram cinco Copas do Mundo, incontáveis dribles humilhantes, golaços e torcedores orgulhosos com a camisa amarela. Em 1958, a nossa seleção, com Pelé e Garrincha, teve o elegante Didi, como o melhor jogador da Copa.

No feminino, Marta surgiu como um cometa – mas daqueles que aparecem pra dizer “vocês nunca mais vão ver algo assim”. Jogava como se o futebol fosse poesia, e a bola, sua caneta. Mesmo com estrutura precária, salários que davam vontade de chorar (de raiva) e estádios vazios, Marta fez o mundo inteiro bater palma. Foi seis vezes a melhor do mundo. A CBF? Seguiu firme no papel de “tô nem aí”.

O maior alerta foi dado pelo Cruijff, o super-craque holandês, aquele da Laranja Mecânica, a única coisa boa inventada depois de 1970. O holandês foi para a Copa da África e confraternizou com todos os jogadores e dirigentes do futebol. Na hora em que o jogo do Brasil ia começar, ele despediu-se de todos e, diante da incredulidade de muitos, explicou:

-O Brasil está jogando o futebol errado que jogávamos. Eles estão tentando nos imitar e nós fizemos o futebol deles para evoluir. Esse retrocesso eu não quero ver. E o craque, já estava coberto de razões, quando foi para o hotel fazer coisas mais proveitosas.

Hoje o nosso futebol está escondido atrás de temas como racismo, estupro, altos salários de dirigentes e jogadores, todos na melhor moda.

Nos bastidores, a comédia pastelão toma forma. Dirigentes que falam mais de marketing do que de futebol, gramados que parecem campos de batata e jogadores que treinam mais dancinha de TikTok do que finalização. Gabigol, Pedro, Rafinha não perdem tempo treinando um único drible para entrar na área, pelo meio dos centrais adversários. Os cartolas repetem o famoso “projeto a longo prazo”, que dura até a próxima eliminação precoce.

Hoje, em 2025, o Brasil ocupa, empatado com o Paraguai, a gloriosa quarta colocação de seis Seleções Copeiras. Sim, você leu certo: estamos atrás de times que, até outro dia, usavam o mesmo ônibus pro time inteiro e amarravam a trave com barbante. O Equador nos ultrapassou com um sorriso maroto, o Uruguai acenou com Suárez na ponta dos pés, e até a Colômbia anda nos encarando de igual pra igual. A Argentina? Já nos chama, com muita razão, de freguês.

A seleção virou um “Desfile” infinito de tatuagens novas, cortes de cabelo estilosos e derrotas convincentes. O último título de expressão já pode pedir música no Fantástico. Enquanto isso, os dirigentes continuam fazendo palestras sobre scout, algoritmos com “gestão moderna” em churrascarias, e os jogadores falam mais inglês do que português – não porque jogam bem na Europa, mas porque vivem em reuniões com empresários.Os nossos craques são titulares em clubes na última colocação do futebol inglês. E o treinador do mês? O último foi o Dorival, um treinador simpático, honrado e sem méritos para dirigir a seleção penta campeã mundial.

A CBF virou uma espécie de Hogwarts, a escola de magia fictícia da saga HARRY POTTER, onde só os iniciados entendem o que realmente acontece. Falta transparência, sobra comissão técnica com mais gente que elenco. Cada derrota é explicada com palavras como “processo”, “reestruturação” e “DNA do futebol brasileiro”, que ninguém mais sabe o que significa, mas fica bonito na entrevista. Isso tudo, em um mundo que estuda futebol e treina muito mais que o nosso.

No meio disso tudo, a torcida já foi mais fiel. Não pela confiança, mas pela esperança teimosa de que um novo Pelé (ou Marta) surja, do nada, drible todo mundo e ainda dê entrevistas melhores do que muito dirigente. A gente ainda veste a camisa, canta o hino com emoção, e depois desliga a TV com aquela expressão de “por que eu ainda me iludo?”

No fim das contas, o futebol brasileiro virou uma tragicomédia: um elenco caríssimo, um roteiro bagunçado, e uma audiência que só fica porque já assistiu temporadas melhores. Mas quem sabe, com um pouco de vergonha na cara e muito menos dirigente metido a CEO, o Brasil volte a ser aquilo que um dia foi: o país que fazia o mundo inteiro parar pra ver o que a bola ia aprontar.

E por enquanto… seguimos entre o quarto e o sexto lugar, mas com estilo, trancinhas e dancinhas longamente ensaiadas.

Roberto Caminha Filho, economista, assiste aos jogos da seleção brasileira, até a Copa do Mundo, com a camisa da Seleção Argentina. Foi uma aposta perdida para os netos.

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