Traficante morto em ação na Zona Sul foi denunciado por ‘Dona Vitória’, idosa que inspirou filme com Fernanda Montenegro


William do Amaral Gomes, conhecido como Marmitão, foi morto durante operação na Ladeira dos Tabajaras, para prender os assassinos do policial civil João Pedro Marquini, de 38 anos, marido da juíza Tula Mello. Fernanda Montenegro como Vitória e Joana Zeferino da Paz em 2006, com sua câmera
Divulgação/Fábio Gusmão/Arquivo/Extra
Um dos cinco mortos na operação da Polícia Civil na Ladeira dos Tabajaras, na Zona Sul do Rio de Janeiro, na última terça-feira (15), foi denunciado pela idosa Joana Zeferino da Paz, mulher que inspirou a personagem principal do filme Dona Vitória. Na obra, Joana é interpretada por Fernanda Montenegro.
William do Amaral Gomes, conhecido como Marmitão, foi morto durante a ação para tentar prender os assassinos do policial civil João Pedro Marquini, de 38 anos, marido da juíza Tula Mello.
Na noite de 30 de março, o casal foi rendido por ladrões na Grota Funda, e Marquini foi fuzilado ao tentar reagir.
Polícia faz operação na Ladeira dos Tabajaras
Marmitão era um dos líderes do tráfico na Ladeira dos Tabajaras. Segundo apuração da TV Globo, ele é tio de outro traficante morto na operação desta terça, Vinicius Kleber Di Carlantonio Martins, mais conhecido como Cheio de Ódio.
O Tabajaras é uma favela que ocupa o morro que divide Botafogo de Copacabana, e seus acessos são por vias movimentadas desses bairros.
Além dos mortos, quatro pessoas também foram presas na operação desta terça. Uma delas, Antônio Augusto D’Angelo da Fonseca, um homem que era alvo de um dos mandados de prisão, apontado como um dos autores do latrocínio, foi encontrado no apartamento da mãe.
‘Dona Vitória’
Nos anos 2000, por meio de uma série de filmagens feitas da janela de sua casa, a aposentada alagoana Joana Zeferino da Paz deu origem à investigação que levou à prisão mais de 30 pessoas, entre traficantes e policiais militares, ligados ao tráfico na Ladeira dos Tabajaras, favela de Copacabana, na Zona Sul do Rio.
O caso foi revelado em 2005 pelo jornal Extra. Marmitão foi um dos denunciados com base nos vídeos de Dona Vitória. Joana morreu na Bahia, após 17 anos vivendo sob um anonimato forçado, por questões de segurança.
“Vitória”: o novo filme com Fernanda Montenegro conta uma história real
Em seu testemunho publicado no Extra, Fábio Gusmão, que fez a reportagem na época e seguiu acompanhando o caso, conta que Joana deixou o imóvel onde viveu por 36 anos para ingressar no Programa de Proteção à Testemunha.
Começou ali uma vida de “privações, angústia, desapego e resiliência”, conta Gusmão: “O seu desejo, há anos, era ter o reconhecimento público”, escreveu.
Gravações pela janela
Joana morava em um apartamento na Praça Vereador Rocha Leão, de fundos, que dava para a Ladeira dos Tabajaras. Pela janela, começou a ver a movimentação de traficantes em uma boca de fumo.
O Extra apurou que ela entrou com uma ação contra o estado devido à desvalorização de seu imóvel. A ideia de filmar veio para desmentir a alegação, dentro da ação judicial, de um coronel da PM, que disse que a moradora mentia sobre a existência do tráfico, que seria combatido pelo batalhão.
Joana Zeferino da Paz em 2006, com sua câmera
Fábio Gusmão/Arquivo/Extra
Joana decidiu, então, comprar uma câmera de filmar e gravar as cenas que via diariamente. Nas imagens, era possível ver traficantes armados e vendendo drogas. As fitas foram entregues à Polícia Civil, que deu início à investigação.
Além dos traficantes, foram condenados policiais militares por omissão e pelo recebimento de propinas para fazer vista grossa para o crime organizado.
A história da aposentada está nos cinemas em “Vitória”, um filme original Globoplay com produção da Conspiração, com Fernanda Montenegro no papel principal.
Em 2024, o jornalista Fábio Gusmão lançou uma nova edição do livro “Dona Vitória Joana da Paz” (Editora Planeta).
Além de contar a história da idosa que enfrentou o tráfico e a corrupção policial registrando a rotina de uma quadrilha da Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, a nova edição do livro apresentou os desdobramentos que aconteceram desde a primeira edição e após a morte da mulher que ficou conhecida como Dona Vitória.
Ela morreu com 97 anos sem revelar sua identidade por motivos de segurança.
“Desde o momento em que a gente publica a reportagem ela [Dona Joana] queria uma coisa: que todos soubessem quem era ela. E no [primeiro] livro, a gente, por óbvio, como na reportagem, não podia revelar”.
“Quando ela parte, infelizmente, a história dela, o legado e os ensinamentos merecem ter o crédito: quem era aquela mulher forte, quem era Joana Zeferino da Paz. Desde então tinha uma longa jornada que faltava contar e a gente achava que era importante contar isso numa nova edição”, disse Gusmão na época do lançamento do livro.
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