Depois de assinar contrato milionário suspeito e receber diárias irregulares, ex-diretora do IGP será homenageada na Assembleia Legislativa

A ex-diretora do Instituto-Geral de Perícias (IGP) Marguet Mittmann, que deixou o cargo após assinar contrato milionário suspeito para carteiras de identidade e receber diárias irregulares, será homenageada pela Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, nesta terça-feira (29).

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Marguet no gabinete de Nadine, que postou a foto no fim de fevereiro  | abc+



Marguet no gabinete de Nadine, que postou a foto no fim de fevereiro

Foto: Reprodução

A Medalha da 56ª Legislatura, como é chamada a honraria, foi proposta pela deputada Delegada Nadine (PSDB). Conforme o convite oficial emitido pela AL, a solenidade ocorrerá às 13 horas no Salão Júlio de Castilhos.

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Nadine anunciou a condecoração em suas redes sociais, no fim de fevereiro, em que atribuía à Marguet “um trabalho exemplar no comando do instituto”. A homenageada ainda estava à frente do IGP.

Mas uma investigação já tinha sido aberta por um controverso contrato de R$ 15,6 milhões anuais aos cofres do governo estadual, aprovado pela então diretora.

Marguet também já era cobrada no governo pela autoconcessão de diárias para compromissos oficiais inexistentes, conforme revelado pela reportagem do Grupo Sinos. Deixou a direção no dia 17 de março sob argumento de “motivos pessoais”, mas segue no IGP como perita concursada desde 2009.

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Agora a parlamentar declara, por meio da assessoria, que “a proposição da medalha por parte da deputada Delegada Nadine ocorreu ainda em dezembro de 2024 e foi aprovada pela mesa diretora. Por uma incompatibilidade de agendas, a entrega não foi no ano passado e não foi possível ocorrer em tempo hábil enquanto estava no cargo”. A honraria foi aprovada, de acordo com ata oficial da Assembleia, “em razão dos serviços prestados ao Instituto e à comunidade”.

Contrato com fornecedora após patrocínio

No dia 17 de dezembro do ano passado, Marguet assinou aditivo de contrato de R$ 1,3 milhão mensais com a empresa Valid Soluções para suposto aprimoramento no serviço de emissão de carteiras de identidade. O custo do governo passaria de R$ 16,15 para 20,15 por documento.

No mesmo dia do aditivo, a Comissão de Fiscalização do IGP elaborou um parecer que indica falta de transparência e de critérios, além da possibilidade de gastos desnecessários. O documento, ao qual a reportagem teve acesso, afirma que, na proposta da Valid, não está especificada a razão do reajuste, o acompanhamento que a empresa faria aos serviços e as novas licenças de software para os 400 postos de identificação no RS.

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O parecer ainda menciona que o Centro de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs) desenvolveu no ano passado, a pedido da própria direção do IGP, uma extensão e melhoria do sistema de identificação de indivíduos similar à contratada no aditivo. Ou seja, conforme a Comissão, o governo não precisaria arcar com as despesas.

Cinco dias antes do aditivo, a fornecedora havia patrocinado o 1 Seminário Estadual de Perícia Criminal, idealizado pela então diretora do IGP, com direito a uma noite de gala no Grêmio Náutico União, em Porto Alegre. Dentro da programação, houve a entrega de medalhas para 52 homenageados, entre eles o governador Eduardo Leite (PSDB), o vice-governador Gabriel Souza (MDB), secretários de Estado, chefes de vários órgãos e membros do Judiciário e Ministério Público, além de políticos em geral.

Diárias durante passeio particular

Marguet concedeu-se diárias de 13 a 31 de dezembro, renovadas no dia 1 de janeiro até 17 de janeiro, para trabalhar na Operação Verão, em Capão da Canoa. As irregularidades vieram à tona pelas redes sociais da própria beneficiária e de órgãos do governo.

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Ela postava atividades em Porto Alegre e até confraternizações natalinas em família na cidade de São Paulo das Missões, quase na fronteira com a Argentina, no período em que recebia gratificação para estar no litoral. As diárias somaram mais de R$ 7 mil.

Governo afirma que valores do aditivo não foram pagos

Marguet não se manifestou. Por meio de nota enviada à reportagem, o governo diz que, em relação ao aditivo contratual, não houve prejuízo aos cofres públicos. “Não foi realizado nenhum pagamento para a Valid referente ao novo valor previsto no aditamento, tendo sido a empresa prestadora do serviço notificada para, no prazo legal, apresentar defesa quanto a apontamentos realizados pela Comissão de Fiscalização.”

O comunicado detalha as negociações: “O IGP esclarece que as tratativas para o aditamento contratual se iniciaram em outubro de 2024, quando foi solicitado à empresa uma proposta que contemplasse a possibilidade de emissão de carteiras de identidade nacional (CIN). No dia 19 de dezembro de 2024, a Comissão de Fiscalização do Contrato reuniu-se com a Direção-Geral do IGP a fim de discutir a proposta de melhorias tecnológicas apresentada pela Valid, sendo aprovada pela referida comissão. Após isso, a possibilidade de aditamento contratual foi aprovada pela PGE/RS e pela Cage/RS.”

A nota frisa ainda que “estamos avaliando a possibilidade de utilização de eventuais sistemas da Procergs. A direção do IGP está em tratativas junto com as equipes técnicas a fim de avaliar a viabilidade técnica de uso desses sistemas.”

Em relação às diárias, afirma que o governador Eduardo Leite (PSDB) e o secretário da Segurança Pública, Sandro Caron, também agraciados com a medalha do IGP, “não tinham conhecimento de que a então diretora do IGP estava designada para a Operação Verão em Capão da Canoa com os valores de diárias informados pela reportagem. Posteriormente, a diretora fez o estorno das diárias oferecidas do dia 22 a 27 de dezembro de 2024 e nos dias 09, 10, 11, 16 e 17 de janeiro de 2025.”

Valid também emitiu nota

“A Valid, como empresa de capital aberto, segue rigorosas práticas de compliance e anticorrupção e, por isso, repudia qualquer sugestão de conectar um aditivo de contrato – legal, validado junto ao Governo do Rio Grande do Sul e aos órgãos de controle – a um patrocínio de evento – dentro da praxe de mercado, organizado por empresa privada e avaliado segundo critérios de mercado.

Isso posto, a Valid se coloca à disposição do Governo do Estado na investigação e se coloca como uma das maiores interessadas na devida apuração e esclarecimentos da denúncia.
Patrocínios são uma praxe de mercado, uma forma de contribuir para a evolução do segmento e compartilhamento de boas práticas, inovação e novas tecnologias.

O patrocínio da Valid ao “Seminário Estadual de Perícia Criminal” foi feito oficialmente, com valores e divisão de cotas previstas no material oficial do evento para captação de patrocínio, como consta no media kit do seminário. O contrato e o pagamento foram feitos diretamente para a produtora oficial do evento – POA PRODUÇÕES LTDA. Nenhum valor foi pago para nenhum órgão público e a Valid também não foi a única marca patrocinadora do evento.

O objetivo do evento se encaixa na estratégia da Companhia de promoção de boas práticas de mercado. De acordo com o media kit: o objetivo principal do seminário é mostrar, por meio da apresentação de trabalhos em diferentes temáticas periciais, a inovação e destaque da perícia criminal gaúcha e o quanto o trabalho do IGP é integrado às demais vinculadas Secretarias de Segurança Pública (SSP), reforçando a importância da atuação coordenada das forças de segurança do Rio Grande do Sul.

Cabe afirmar que o patrocínio do evento foi decidido com base em uma avaliação técnica de marketing, a partir da relevância do tema e da audiência, com as contrapartidas previstas no media kit.

Sobre o fato de o evento ter servido bebidas alcóolicas, o material oficial do evento não menciona a confraternização e é, portanto, responsabilidade do organizador, sem nenhuma responsabilidade ou ciência de qualquer uma das marcas patrocinadoras.

A Valid tem contrato válido com o Instituto Geral de Perícias (IGP) do Rio Grande do Sul, segundo licitação legal e oficial, assinado em 22/02/2022, sob número de processo 21/1205-0000263-6. Somente após deliberações da Direção-Geral do IGP, cujo data em que ocorreram não é de conhecimento da Companhia, a Valid recebeu a solicitação do aditivo e, posteriormente, seguindo o rito legal, o documento foi validado e aprovado não só pelo órgão, mas também por seu corpo jurídico, por meio de documentação anexada ao processo administrativo. Cabe afirmar que a discussão de evolução do objeto de contrato é legal e prevista, tanto na lei de licitações nº 8.666/93, de 21/06/93, no seu artigo 65, que rege o contrato, bem como na lei geral de licitações, nº 14.133, de 1º de abril de 2021, além de ser prática de mercado, diante da evolução da tecnologia e da demanda por melhoria da prestação de serviço à população.

No caso do aditivo assinado em 27/12/2024, o documento passou pela avaliação e chancela da Procuradoria Geral do Estado, sobre todas as suas cláusulas e condições.
A Valid, como não tem contrato direto com a Companhia de Processamento de Dados do Estado (PROCERGS), desconhece quais tecnologias e estratégias comerciais são desenvolvidas pela empresa e disponibilizadas para o Estado.”

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