Por que mercadinhos de condomínio estão em alta? Veja prós e contras

A comodidade de fazer compras praticamente sem sair de casa, apenas pegando um elevador, de forma rápida e prática, tem sido cada vez mais valorizada pelos brasileiros, especialmente nos grandes centros urbanos. Apontados como a nova febre do chamado varejo de proximidade, os mercadinhos de condomínio ganharam espaço nos últimos anos e estão consolidando um mercado considerado promissor e em franca expansão.

De acordo com dados divulgados pela Associação Paulista de Supermercados (Apas), esses pequenos estabelecimentos instalados dentro de prédios registraram um expressivo crescimento de 53,5% no ano passado em relação a 2023. Por outro lado, os tradicionais supermercados e hipermercados recuaram 10,1% no período, na mesma base de comparação.

Até o fim de 2024, o Brasil contava com cerca de 10 mil mercadinhos de condomínio que movimentam, aproximadamente, R$ 2 bilhões por ano. Só no estado de São Paulo, o setor supermercadista, como um todo, tem quase 27 mil estabelecimentos – dos quais 65% são de pequeno porte. Os supermercados paulistas respondem por mais de 30% do faturamento nacional e têm participação de 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Empresas como Carrefour, Hirota, Enxuto, Market4u e Honest Market Brasil vêm investindo nesse filão.


Como funciona

  • Os mercadinhos de condomínio ficam abertos 24 horas por dia, 7 dias por semana e se situam nas áreas de lazer de edifícios residenciais ou comerciais.
  • As lojas ocupam pequenos espaços, de 5 a 30 metros quadrados, e não têm nenhum funcionário. São oferecidos diversos itens, como alimentos, bebidas e produtos de limpeza. O morador paga suas compras por meio de caixas de autoatendimento ou aplicativos de celular.
  • Também chamados de minimercados autônomos ou mercados self-service, esses estabelecimentos podem ficar totalmente dentro do condomínio – sem acesso externo – ou ter suas fachadas voltadas para a rua, com possibilidade de uso por parte do público em geral.
  • Geralmente, o primeiro caso é mais comum em condomínios residenciais de médio e alto padrão e tem a vantagem de oferecer maior segurança. Já os mercadinhos voltados para a rua se concentram em edifícios comerciais ou residenciais nas chamadas “zonas mistas” – áreas que reúnem moradias, comércios e empresas.
  • A vantagem deste segundo modelo é a possibilidade de atrair mais clientes e, por tabela, atingir um faturamento maior.

“As pessoas estão comprando tempo. Temos assistido ao movimento do setor supermercadista entrando no coração dos bairros, primeiro porque não há mais tanto espaço para grandes lojas, mas também porque, sobretudo desde a pandemia, as pessoas estão valorizando mais o seu próprio tempo e buscando fazer coisas mais perto de suas casas. Isso trouxe uma nova característica logística, com o supermercado ficando mais próximo do consumidor”, afirma Caio Camargo, especialista em varejo.

“Foi criada uma ótima oportunidade para os mercados de condomínio. Até porque, principalmente nas capitais, a tendência é os bairros ficarem cada vez mais verticalizados, com mais prédios. Na verticalização, o surgimento desse tipo de negócio acaba sendo potencializado “, explica Camargo.

Regina Blessa, especialista em varejo e autora do livro “A Loja Perfeita”, também ressalta que “a importância da conveniência cresceu a partir da pandemia”. “Ainda temos um contingente significativo da população, principalmente os mais jovens, que trabalha em home office e evita sair de casa para algumas atividades. É uma facilidade adicional”, afirma.

“Não é um mercado para você fazer as compras do mês. As grandes lojas ainda são as favoritas para esse tipo de compra. Mas a conveniência é esta: a pessoa está com fome e desce para comprar um sanduíche. Acabou o café, e o consumidor não precisa ir até o mercado para comprar. Resolve ali no condomínio mesmo”, completa Regina.

Imóveis podem se valorizar

Estimativas do setor imobiliário apontam que os mercadinhos de condomínio podem levar a um acréscimo de R$ 30 mil a R$ 50 mil no preço dos imóveis. De acordo com uma pesquisa sobre tendências de moradia realizada pelo DataZap, três de cada 10 pessoas levam em consideração a presença dos minimercados para tomar a decisão de comprar ou alugar um imóvel.

Segundo o levantamento, os mercados dentro dos prédios só perdem para os “espaços pet” (para animais de estimação) e de delivery. Na ordem de preferência dos potenciais locatários e compradores, superam, por exemplo, quadras esportivas, sauna, piscina, espaço para trabalho remoto e lavanderia compartilhada.

Para a instalação de um minimercado dentro do condomínio, alguns requisitos são necessários. É preciso que o edifício tenha pelo menos de 100 a 120 apartamentos e um espaço adequado em sua área comum, com boa visibilidade e pontos de energia. Cabe à assembleia de moradores aprovar (ou não) eventuais projetos apresentados por empresas do ramo.

Tanto o custo de instalação quanto a logística para a reposição dos produtos vendidos no mercado ficam a cargo das empresas, assim como o gasto com energia. Em geral, não há nenhum custo para o condomínio.

Barulho e segurança preocupam

Entre os maiores problemas relacionados aos mercadinhos de condomínio, os especialistas ouvidos pelo Metrópoles apontam preocupações com segurança e barulho excessivo. “No começo, quando esses mercados começaram a se expandir, não havia tantos relatos de roubo de mercadorias ou clientes saindo sem pagar. Hoje, já temos muitas queixas. Acredito que deve haver uma ingerência maior do próprio condomínio, para não deixar aquele espaço abandonado, largado e sem monitoramento mínimo”, alerta Caio Camargo.

“É um mercado que pode funcionar bem se trabalhar no conceito de ‘honest market’ [formato de loja de conveniência sem a presença de funcionários para receber os pagamentos], com pouca tecnologia embarcada, e que seja funcional e baseado no respeito entre empresa e moradores. Ou seja, que não haja roubo. O condomínio tem de trabalhar em cima disso, abrir sindicância, reforçar o monitoramento e a fiscalização”, completa.

Segundo Regina Blessa, outro grande risco dos minimercados que ficam 100% dentro dos prédios é sua instalação em locais inadequados. “O que incomoda é se o mercado ficar mal posicionado dentro do condomínio. Vai atrapalhar aquele apartamento que estiver mais próximo. O ideal é colocar essa loja em um local mais neutro, talvez ocupando uma parte do espaço do salão de festas, ou mesmo no terraço, no último andar”, observa. “Depende muito da planta do prédio, mas, de preferência, ele não deve ficar em um andar que tenha apartamentos. A pessoa que mora ao lado vai ouvir barulho a noite inteira, não tem jeito.”

A conta fecha?

Outro ponto de preocupação envolve o uso excessivo de tecnologia para a manutenção e o monitoramento dos mercados de condomínio, que muitas vezes acabam por inviabilizar o negócio. A conta precisa fechar.

“Quando o modelo tem muita tecnologia aplicada, com câmera de entrada e saída e aplicativo de reconhecimento facial, não costuma funcionar. O custo dessa tecnologia é muito alto diante daquilo que será rentabilizado”, explica Caio Camargo. “O cupom médio de uma compra em loja de condomínio, geralmente, não vai passar de R$ 15 ou R$ 20. É muito baixo, são compras pontuais. Com muita tecnologia e os gastos que isso acarreta, a conta não vai fechar no fim do mês.”

Segundo Camargo, muitos estabelecimentos do tipo “não têm se sustentado” justamente pela falta de planejamento financeiro. “Em geral, há uso de muita tecnologia no condomínio, mas em 2 ou 3 meses aquele espaço fica abandonado”, observa.

Outro problema é a falta de reposição dos alimentos e produtos nas prateleiras. “Há sérias dificuldades relacionadas ao abastecimento. Por exemplo: o morador adora comprar Coca-Cola gelada, mas, toda vez que desce para o mercado, não tem Coca gelada. A partir do momento em que esses modelos ganham escala, é necessário cuidar da reposição dos produtos”, afirma.

O futuro do setor

Apesar dos obstáculos, o segmento tem muita margem para continuar crescendo e pode se consolidar ainda mais nos próximos anos. “Esse mercado tem potencial de crescimento porque a tendência das grandes cidades é de se verticalizarem ainda mais. Com a verticalização e o crescimento da expansão imobiliária, há cada vez menos espaço para comércios e serviços, para grandes supermercados, por exemplo”, opina Camargo.

Regina Blessa também aposta em crescimento para os mercadinhos de condomínio, mas afasta a hipótese de que esses pequenos estabelecimentos ameacem ou mesmo substituam os supermercados tradicionais. “São modelos totalmente diferentes. Esses mercados de condomínio não incomodam em nada os grandes supermercados. Quando você vai ao supermercado, leva uma lista com 10 coisas que precisa comprar. E, na maioria das vezes, volta com uma compra muito maior, com 50 coisas diferentes”, exemplifica.

“Uma loja pequena dentro do condomínio nunca terá o ‘mix’ de produtos de um supermercado. Ela oferece itens que as pessoas podem esquecer em suas compras maiores, como refrigerante, café, pipoca, sabonete… A pessoa só vai ali para conveniência rápida. Ninguém vai deixar de ir ao supermercado e fazer sua compra da semana ou do mês.”

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